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    ANÁLISE

    Sem exageros, maestro Kurt Masur era um mestre do contraponto

    SIDNEY MOLINA
    CRÍTICO DA FOLHA

    19/12/2015 18h20

    Hendrik Schmidt - 10.out.2014/Associated Press
    FILE - In this Oct. 10, 2014 file photo conductor Kurt Masur sits in a wheelchair as he is awarded the "Goldene Henne" media prize in Leipzig, eastern Germany. New York Philharmonic said Saturday, Dec. 19, 2015 music director emeritus Kurt Masur, from Germany, has died at 88. (Hendrik Schmidt/dpa via AP) ORG XMIT: FOS112
    Regente alemão Kurt Masur em imagem de arquivo de 2014

    Logo depois da queda do Muro de Berlim, o nome do maestro Kurt Masur —uma voz ativa e pacifista vinda da Alemanha Oriental— chegou a ser cogitado para presidir o futuro país unificado, mas ele preferiu assumir a Filarmônica de Nova York.

    Para os amigos, o regente, morto neste sábado (19), aos 88 anos, optara pelo desafio mais difícil: depois de longo período comandada por Leonard Bernstein (1918-1990), a orquestra americana não havia se acertado nem com o francês Pierre Boulez nem com o indiano Zubin Mehta. O ambiente em Nova York também não era dos melhores, mas o fato é que a autoridade musical do alemão transformou em pouco tempo o som do grupo.

    Críticos e público apontaram a evolução, e Masur se manteve como titular da orquestra entre 1991 e 2002. Em 2012, o maestro revelou que sofria de mal de Parkinson.

    A notícia de sua morte foi dada pela própria direção da Filarmônica de Nova York, que criou especialmente para ele o cargo de diretor emérito após os 12 anos na casa. Foi também titular da Filarmônica de Londres (2000-2007) e diretor artístico da Orquestra Nacional da França (2002-2008). Como convidado regeu todas as grandes orquestras.

    A proximidade com o maestro paulista Roberto Minczuk —que, ainda como trompista, havia atuado sob sua direção na Alemanha— resultou em uma relação importante com o Brasil: na primeira década do século 21, Masur regeu várias vezes a Osesp, a OSB e até mesmo a orquestra de bolsistas do Festival de Campos do Jordão.

    O segredo da arte de Masur origina-se dos 26 anos de trabalho profundo e consistente como mestre de capela da orquestra Gewandhaus de Leipzig, cargo que assumiu em 1970 (ainda na Alemanha Oriental) e que manteve até 1996 (quando já estava em NY).

    A orquestra é uma das mais antigas da Europa em atividade. Fundada em 1781, teve Mendelssohn (1809-47) como regente titular por 12 anos e foi o palco de estreias de Wagner (1813-83) e Brahms (1833-97) dirigidas pelos próprios compositores.

    Com Masur, o grupo atingiu um nível de rara minúcia, especialmente em Brahms. Sem gestuais exagerados -e sempre sem batuta, como se fosse regente de coro- o maestro foi um mestre do contraponto.

    Tratava os metais sem nenhuma histeria, compondo um som austero, como se tivesse uma fina camada de verniz a proteger as linhas sempre bem articuladas. Tudo sem efeitos: em sua música, não há nada gratuito.

    Com a Gewandhaus, ele veio a São Paulo no fim dos anos 1980, quando ainda não era a figura midiática que haveria de se tornar. Quem esteve no teatro Cultura Artística nunca vai tirar da memória o "Adagio" da "Segunda" de Brahms.

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