As ruas de Osuna foram cobertas, em 2013, por uma espessa camada de neve, um fenômeno incomum para a região. Foi a pior tempestade em décadas. Suficientemente dramático para que alguém pudesse sussurrar, soturno: "O inverno está chegando..."

Um ano depois, os moradores desse pequeno vilarejo no sul da Espanha receberam a notícia: a quinta temporada da aclamada série "Game of Thrones", exibida pelo canal pago HBO e cujo mote é "o inverno está chegando", seria filmada ali.

Passado o furor das gravações, a prefeitura tenta incrementar o turismo. Ações semelhantes estão sendo tomadas ao redor do país, em outros cenários ligados à série sobre as disputas sangrentas pelo trono dos Sete Reinos.

Há um projeto para criar, inclusive, uma rota turística em 12 localidades tocadas por essa franquia milionária. Osuna inaugurou há um mês uma exposição permanente em seu museu municipal, abrindo duas salas dedicadas a personagens como Tyrion Lannister e Daenerys Targaryen.

"Precisamos ser capazes de gerenciar a atenção que as pessoas têm dado a Osuna", diz à Folha a prefeita Rosario Andújar, que tem liderado os esforços. O turismo já cresceu 60% desde as filmagens, mas há espaço para mais avanços.

Andújar recebe a reportagem em seu escritório. Ali, fala dos 17 dias em que a cidade -de 18 mil habitantes- mobilizou-se para receber a produção do seriado. A prefeitura ofereceu uma série de benefícios, como não cobrar pelo uso dos espaços públicos.

	Jon Nazca/Reuters
	Figurantes em filmagem da 5ª temporada de "Game of Thrones'" dentro da praça de touros de Osuna

Para estar a par dos acontecimentos, Andújar passou a assistir ao programa, que até então desconhecia. "Há uma mensagem relacionada ao poder, o que é um atrativo adicional", afirma. Ela está em seu terceiro mandato ali.

Andújar foi também escolhida para presidir a associação de 12 cidades que querem formar uma rota de turismo pelos cenários das filmagens de "Game of Thrones", junto a Sevilha, Tudela e Córdoba.

Mas os esforços em capitalizar em cima da série foram liderados por um funcionário público que a prefeita apelida de "o nerd": Jesus Cansino, diretor da televisão municipal e, mais importante, fã da série de livros e de televisão.

"Passei de 'nerd' a 'especialista'", brinca. "É preciso entender o que os fãs querem para que vejam que estamos fazendo as coisas com respeito."

BADULAQUES
A exposição do museu, da qual Cansino é curador, inclui diversos artefatos relacionados à série. Não há nada que tenha sido utilizado nas gravações, porque tais itens foram levados de volta pela equipe, mas Osuna comprou todo tipo de badulaque que se encontra na internet.

Há roupas, armas, miniaturas, ilustrações e moedas. Também há uma série de itens confeccionados por artesãos locais, como o boneco de um morto-vivo em tamanho real. A prefeitura investiu cerca de R$ 40 mil. A entrada ao museu custa R$ 8.

O passo seguinte será dado em direção à praça de touros. Touradas são celebradas ali há um século, mas a área vai ficar conhecida como cenário de uma das batalhas mais importantes da série.

Ali, a personagem Khaleesi foi cercada por inimigos e salva por seu dragão, no final da quinta temporada. Cansino mostra os locais em que cada cena foi rodada, descrevendo-as como se fossem reais.

"O diretor gritava 'dragão!' e as pessoas se viravam para ver", conta. O monstro, é claro, não estava ali. O fogo de seu hálito foi produzido por um lança-chamas gigante. A cena em que Khaleesi monta a fera foi simulada com uma espécie de touro mecânico.

A prefeitura quer instalar ali um dragão -de mentira, é claro- e permitir que visitantes se fantasiem como os personagens para reviver a cena. Também se pensa em produzir um vídeo simulando, com óculos 3D, o voo de um dragão acima de Osuna.

Tudo de acordo com o lema escolhido para essa cidade desde as filmagens da série: Osuna, terra de dragões.

SONHO

Quando assistiu às últimas cenas da quinta temporada de "Game of Thrones", José María Cansino, 29, realizou um de seus sonhos: ver-se dentro desse universo. Ele foi um dos 600 figurantes contratados em Osuna, e um dos 40 em cenas de ação.

Depois de uma seleção com 80 mil interessados, ele passou por treinamento diário. "Nos ensinaram a lutar e a morrer", conta. "Quando soube que iam filmar em Osuna, não acreditei. No povoado onde me criei, tão tranquilo!", diz.

À época desempregado, José María recebeu cerca de R$ 240 por cada dia de preparação e gravação. "Nunca tinha feito nada relacionado a atuação", diz. Ele afirma que a barreira entre extras e protagonistas era quebrada entre as cenas. Há no museu de Osuna diversas fotografias registrando a interação.

Uma vez lançado o episódio em que aparece, José María assistiu cena a cena, procurando a si mesmo. Encontrou-se em oito sequências, e se vangloria: "Estou ao lado da Khaleesi".