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    crítica

    Com tema sustentável, Museu do Amanhã é pesadelo maravilhoso

    MARCELO LEITE
    DE ENVIADO ESPECIAL AO RIO

    26/12/2015 02h15

    Ricardo Borges/Folhapress
    Detalhe de instalação do módulo Antropoceno
    Detalhe de instalação do módulo Antropoceno

    Visitar o Museu do Amanhã (MdA), no Rio de Janeiro, é entrar no ventre do Leviatã ambiental. O que era para ser um museu sobre sustentabilidade vestiu o disfarce de acervo digital sobre ciência contemporânea e se apresenta como um pesadelo maravilhoso.

    Iuri Gagarin, primeiro cosmonauta, disse que "a Terra tem um halo azul muito bonito". Essa beleza se espalha pelo museu e também nas dezenas de fotos do planeta tomadas a partir do espaço que revestem um dos três cubos na segunda estação do percurso linear do MdA, Terra.

    A sequência de cinco paradas é quase convencional: Cosmos, Terra, Antropoceno, Amanhãs e Nós. Em cada uma se abordam as perguntas tradicionais: De onde viemos? Quem somos? Onde estamos? Aonde vamos? Como queremos ir?

    Na primeira estação o visitante penetra num ovo negro e se descobre dentro de uma tela, em que bilhões de anos do Universo se transformam numa fantasia sensorial de oito minutos produzida pelo cineasta Fernando Meirelles.

    Poderia estar num Epcot Center. O globo de LED no átrio poderia estar num museu do Japão. Mas o MdA pousou no Rio, e eles podem agora ser vistos pelo povo do morro. Diversão e encantamento garantidos.

    O MdA tem conteúdo, porém, e seu epicentro fica entre o segundo e o terceiro ponto da exposição (Terra e Antropoceno). Arte, tecnologia e cenografia são aqui mobilizados para bombardear o espectador com salvas alternadas de diversidade e consternação.

    O primeiro cubo se reveste de frases lapidares –"A Terra é azul / é finita / é dinâmica / é única"– e encerra uma mesmerizante escultura em tecido de Daniel Wurtzel. Sua leveza, contudo, prenuncia o tema pesado da fragilidade e do desequilíbrio do sistema, no caso, o clima terrestre e sua perturbação.

    No cubo biológico coberto de sequências genéticas, o interior permite examinar as entranhas ecossistêmicas da baía da Guanabara. No cubo do cérebro, a pessoa se depara com um caleidoscópio de mil fotografias de paisagens humanas, amostra da riqueza da espécie.

    Na parada seguinte está o verdadeiro núcleo do percurso: Antropoceno. Aqui se abate sobre o visitante, em telas monolíticas que parecem prestes a cair em suas cabeças, uma torrente de informações e imagens sobre como a humanidade se tornou uma força geológica.

    A partir daí, a leveza retorna, mas é o caso de se perguntar se ela ainda pode ser sustentada. A intenção manifesta da quarta estação, Amanhãs, é conduzir à reflexão sobre a pluralidade de caminhos que se abrem para o planeta, entretanto algo da gravidade do desafio se esvai em instalações lúdicas e jogos.

    A quinta e última parada, Nós, é mais desconcertante, quase incompreensível de tão vaga. Uma trama de madeira envolve o único objeto físico do acervo: a churinga. Churinga? Um instrumento cerimonial de culturas aborígenes australianas que simboliza a transmissão de conhecimento através de gerações.

    Como o Brasil ainda tem quase duas centenas de povos indígenas, não seria preciso ir tão longe para encontrar algo que representasse melhor a falta de respostas concretas sobre o que fazer com o planeta.

    MUSEU DO AMANHÃ
    ONDE pça. Mauá, nº 1, Rio
    QUANDO de terça a domingo, das 10h às 18h
    QUANTO R$ 10 (grátis às terças)

    Edição impressa

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