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    Cangaço é ponto de partida para peça que se desdobra em histórias de guerra

    GUSTAVO FIORATTI
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    22/01/2016 02h20

    Quando se anunciava que o bando de Lampião (1898-1938) ia passar pela região da Chapada Diamantina, seus moradores pegavam a carne seca e a farinha de mandioca que tinham à mão, colocavam tudo numa tigela, abandonavam as casas e passavam dias no meio do mato, esperando.

    Nascida para os lados de lá, na cidade de Piritiba, a diretora Maria Thaís, professora do departamento de artes cênicas da USP, cresceu ouvindo histórias como essa.

    Seu mais recente espetáculo, "Cabras - Cabeças que Voam, Cabeças que Rolam", que estreia nesta sexta (22), retorna ao tema, embora sem se ater exclusivamente a ele.

    Maria Thaís conta que, sobre o cangaço, é difícil distinguir o que é história do que é mito, razão pela qual abriu as fronteiras. Sua peça estende-se para situações de conflito e de guerra também em culturas vizinhas, incluindo canções populares colombianas, espanholas e mexicanas.

    Lenise Pinheiro/Folhapress
    Sao Paulo, SP, Brasil. Data 19-01-2016. Espetaculo CABRAS â€" cabeças que voam, cabeças que rolam. Atores Flavia Teixeira (esq) e Gustavo Xella. Centro Cultural SP, anexo Adoniran Barbosa. Foto Lenise Pinheiro/Folhapress
    Flávia Teixeira e Gustavo Xella durante cena de 'Cabras - Cabeças que Voam, Cabeças que Rolam'

    O texto, assinado por Luís Alberto de Abreu, se desdobra em 20 histórias divididas em quatro módulos com seus respectivos subtemas: entram em jogo as brigas sangrentas entre famílias; o sufocamento cultural de índios e negros; a tradução das guerras nas festividades e nas manifestações da cultura popular; e as transições entre períodos de paz e de guerra.

    A progressão dessa rede de narrativas conjuga sonoridades, dança e a concepção espacial de Márcio Medina.

    O cenário é desenhado com vistas para um trabalho que aproxima o artista do perfil dos artesãos. O piso é preenchido por uma cortiça processada, enrijecida como pedregulho: o atrito nos pés dos intérpretes provoca sons que remetem à aridez do sertão.

    MULTIPLICIDADE

    A multiplicidade de histórias também contamina a maneira como Maria Thaís pensa a ação, povoando o espaço cênico com uma dinâmica estranha, de personagens que são também narradores e que pulam de intérprete para intérprete. "Cabras", aliás, é narrada também por animais, armas e objetos.

    Não é um trabalho fácil, a própria diretora assume. "Mas as dificuldades criam impacto no espectador", defende. "Quando eu era adolescente, li 'Grande Sertão: Veredas' [de Guimarães Rosa] e achei muito difícil. Até que eu fiz uma descoberta: era mais fácil ler em voz alta. A fruição estética, às vezes, exige da plateia uma atitude criativa."

    Nesse bando de almas permanece, para a diretora, a intenção de retornar aos significados da guerra que recusam os do "modelo capitalista", ou os "de um sistema que sobrevive de exterminar outros povos e culturas".

    CABRAS – CABEÇAS QUE VOAM, CABEÇAS QUE ROLAM
    QUANDO sex. e sáb., às 21h, e dom., às 20h
    ONDE Centro Cultural São Paulo, r. Vergueiro, 1.000, tel. (11) 3397-4002
    QUANTO R$ 20 (em 29/1: R$ 3)
    CLASSIFICAÇÃO 12 anos

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