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    réplica

    Folha não captou ironia política de peça sobre Guerrilha do Araguaia

    GABRIELA CARNEIRO DA CUNHA
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    27/01/2016 02h48

    Lenise Pinheiro/Folhapress
    Sao Paulo, SP, Brasil. Data 13-01-2016. Espetaculo Guerrilheiras ou Para a Terra nao ha desaparecidos. Atrizes Carolina Virguez (esq) e Sara Antunes (roupa branca. Sesc Belenzinho. Foto Lenise Pinheiro/Folhapress
    As atrizes Carolina Virguez (esq.) e Sara Antunes durante cena de 'Guerrilheiras', no Sesc Belenzinho

    O que cabe ao artista fazer quando não reconhece a ligação entre o discurso do outro e sua obra? Quando dizemos "não reconhece" não significa estar em desacordo com argumentações às nossas opções estéticas ou dramatúrgicas. Significa que não nos sentimos vistos pelo interlocutor.

    Entendemos que essa é uma discussão mais ampla, mas, como aqui não haveria espaço, vamos nos limitar a apontar os erros do texto [crítica à peça "Guerrilheiras ou para a Terra Não Há Desaparecidos", publicada em 22 de janeiro nesta "Ilustrada".

    O texto começa dizendo que "são atrizes, em sua maioria jovens, resultando em atuação bastante desigual". As atrizes em sua maioria têm mais de 40 anos, com mais de 20 no ofício teatral.

    Depois são apontados supostos anacronismos usando o exemplo do Tocantins, "estado criado em 1989". É importante compreender que a peça não se passa nos anos 1970, e sim hoje. Não é um trabalho historicista, mas de conversa com as vozes -que ainda ecoam- dessas mulheres desaparecidas e que são inspiração para os que estão vivos.

    Nesta mesma cena, falamos sobre o massacre de Eldorado dos Carajás e outros conflitos acontecidos depois da Guerrilha do Araguaia. Justamente para atravessar a localização histórica e propor uma reflexão que explode esse tipo de encapsulamento e liga aquela violência a tantas outras que se seguiram.

    No final do texto, é dito: "'Guerrilheiras' abre com uma performance em primeira pessoa da argentina Carolina Virguez, de presença forte, mas que já anuncia o que vem pela frente, ao defender o "liberalismo econômico".
    É importante esclarecer que Carolina Virgüez não é argentina, e sim colombiana, e que atribuir uma suposta pactuação do trabalho com valores neoliberais é não compreender a gênese do projeto e a ironia de uma cena que fala da confusão política e simbólica dos tempos atuais.

    Ainda é concluído que a peça "trai a memória" das guerrilheiras ao usar a palavra liberdade em vez de revolução ou socialismo. Quanto a isso, deixamos que a guerrilheira Lucia Maria de Souza fale por si mesma: "Guerrilheira não tem nome, eu luto pela liberdade".

    GABRIELA CARNEIRO DA CUNHA é atriz e idealizadora da peça "Guerrilheiras ou para a Terra Não Há Desaparecidos" e fala em nome do elenco do espetáculo.

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