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    Caráter experimental de Picasso guia exposição no Tomie Ohtake em maio

    LUCAS NEVES
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM PARIS

    28/01/2016 02h15

    Divulgação
    Joueurs de ballon sur la plage_1928_Musee national Picasso-Paris_Dation Pablo Picasso_1979. Picasso (para a materia de Lucas Neves, janeiro de 2016). Foto: Divulgacao ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    "Joueurs de Ballon sur la Plage" (jogadores de balão na praia), obra de Picasso realizada 1928

    Pablo Picasso (1881-1973), bem se sabe, foi mestre no drama: da dor lancinante de "Guernica" ao arrebatamento amoroso de "O Beijo", as obras que o celebrizaram transpiram "páthos", o sentimento de piedade ou tristeza.

    A exposição que o Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, prepara para o mês de maio busca justamente ampliar os predicados associados ao artista espanhol.

    Ao assinar aquarelas em que esboça figurinos e cenários para um balé; ao criar uma máscara com dois furos e dois rasgos feitos com os dedos sobre um papel; ao conceber fotos em que sobrepõe recortes ordinários de figuras humanas e animais a texturas de renda e folhas, Picasso se mostra também um ás do minimalismo.

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    Le Baiser_Mougins_1969_Musée national Picasso-Paris_Dation Pablo Picasso%2c 1979 segunda-feira, 18 de janeiro de 2016 17:33 Legenda: Picasso (para a matéria de Lucas Neves, janeiro de 2016). Crédito: Divulgação ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    "O Beijo" (1969), óleo sobre tela de Pablo Picasso que retorna ao Brasil após exposição em 2004

    Todas estas, inéditas no Brasil, estarão na retrospectiva do artista, a maior realizada no país desde 2004, com 155 trabalhos no total –entre quadros, esculturas, desenhos, gravuras, peças de cerâmica e fotografias.

    Os estudos para "Pulcinella" (1920), produção dos célebres balés russos, mostram a atração que Picasso tinha por disfarces e fantasias, traço saliente em outras obras que estarão na mostra paulistana, como "Projeto para um Cartaz de Carnaval" e "Paul como Arlequim" (em que retrata um de seus filhos).

    RECURSOS

    O fascínio prescinde de grandes recursos, como atestam as já citadas máscaras de papel, fabricadas num austero 1943, em plena guerra.

    Já os 23 fotogramas de um bestiário picassiano que inclui peixes e cabras ilustram o afinco com que o espanhol testava derivações para suas próprias invenções (no caso, a colagem). A série, realizada entre 1954 e 1961, é uma parceria com o fotógrafo francês André Villers.

    "Picasso sempre busca esgotar a forma, mas nunca o faz de fato", diz a curadora da exposição, Emilia Philippot. "O que acontece é que, na obra dele, a forma está permanentemente em mutação. Depois dessa experimentação com a foto, ele volta ao recorte puro, mas logo o dobra e cria um novo tipo de escultura ['Cabeça de Mulher', de 1962, que virá ao Brasil]."

    A retrospectiva de Picasso no Instituto Tomie Ohtake terá, além de algumas novidades para o público brasileiro, obras e motivos bem conhecidos do cânone do espanhol.

    Ao lado de "O Beijo", que já visitara São Paulo em 2004, estarão telas como "La Danse Villageoise" (dança campestre) e "Deux Femmes Courant sur la Plage (La Course)" (duas mulheres correndo na praia ""a corrida), por exemplo.

    De outra parte, violões servem de fio condutor ao segmento dedicado ao cubismo, e banhistas exibem sua volúpia na ala que trata da fase surrealista do malaguenho.

    "O violão, como o cubismo, precisa ser decifrado e o que o produz, o som, endereça-se ao espírito mais do que à visão. No cubismo, o que vemos não corresponde ao que os olhos enxergam. Vemos com o cérebro", explica a curadora Emilia Philippot.

    Algumas das outras seções do percurso, que segue cronologia linear, irão se debruçar sobre os primeiros anos de criação do artista; o flerte já pronunciado com a geometrização das formas em "Les Demoiselles d'Avignon" (serão expostos estudos, não o quadro em si, que pertence ao MoMA, de Nova York); a curiosidade estética em relação a meios menos nobres, como fotografia e cerâmica; e a produção crepuscular de Picasso, firmemente ancorada no erotismo.

    "Ele busca a carne, a materialidade. Sempre foi assim, mas, nessa última fase, não há mais a preocupação com a decomposição e a recomposição da forma. Só interessa a essência. Disso vêm cenas subversivas de grande frescor", diz Philippot.

    MUSEU PICASSO

    Todas as obras que compõem a exposição são provenientes das coleções do Museu Picasso de Paris, que abrigam cerca de 5.000 itens que o próprio artista quis guardar (ou readquiriu, depois de colocá-las à venda).

    "São os 'Picassos do Picasso'. É visível nesse conjunto a preocupação dele em documentar a evolução do seu pensamento estético, em preservar elementos-chave –temas, gêneros– para análises e reinterpretações após a sua morte", afirma a curadora.

    Nesse sentido, as leituras que a obra do espanhol gerou no Brasil serão integradas à exposição paulistana, na sala dedicada a "Guernica", que lembrará (mais uma vez, sem a obra em si) as reações à apresentação da imensa tela no país em 1953, durante a 2ª Bienal de São Paulo.

    "Todas as camadas da história da arte estão incrustadas no trabalho de Picasso e vêm à tona incessantemente: a arte primitiva, o Renascimento, o barroco. Ele deglutiu tudo e gerou algo que transgride regras, mas permanece num campo reconhecível, não puramente conceitual. É da ordem do material, do sensível, e por isso fascina", conclui Philippot.

    Depois do Tomie Ohtake, a retrospectiva segue para o Paço Imperial, no Rio de Janeiro, onde será aberta em setembro.

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