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    Bem ou mal, mostra de Tiradentes exibe futuro do cinema nacional

    SÉRGIO ALPENDRE
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    01/02/2016 02h23

    Leo Lara/Universo Produção
    Cena do filme "Animal Politico", do cineasta pernambucano Tião (Tiao) Foto: Leo Lara/Universo Producao. ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    A vaca Cerveja, protagonista do filme 'Animal Político', do cineasta pernambucano Bruno Bezerra, o Tião

    A Mostra de Tiradentes, em sua 19ª edição, confirma-se como o principal local de investigação de caminhos possíveis, e muitas vezes perigosos, para o cinema brasileiro.

    O evento promove um encontro de gerações. Nos três primeiros dias tivemos a homenagem a Andrea Tonacci (e a exibição de dois longas e um curta de sua autoria) e os decepcionantes novos longas de Walter Lima Jr. ("Através da Sombra") e Ruy Guerra ("Quase Memória").

    Vimos também "Ralé", novo longa de Helena Ignez, e "Garoto", mais uma obra marcante de Júlio Bressane.

    Contudo, a maior parte dos 35 longas exibidos na cidade histórica mineira, divididos em diversas mostras, são de diretores à procura de um lugar na história do cinema.

    A principal mostra do evento é a competitiva Aurora, composta de sete longas dirigidos por diretores que não passaram do terceiro longa. Representa, de certo modo, o futuro do cinema nacional, para o bem e para o mal.

    Futuro que pode ser também de veteranos. "Índios Zoró: Antes, Agora e Depois?" é o terceiro longa de Luiz Paulino dos Santos, 83, roteirista (e inicialmente também diretor) de "Barravento", longa de estreia de Glauber Rocha. Seu novo filme abriu a Mostra Aurora de maneira positiva.

    "Aracati", de Julia De Simone e Aline Portugal, percorre a rota do vento, no Vale do Jaguaribe, no Ceará. É um exercício de contemplação nem sempre bem realizado, mas de momentos fortes.

    "Taego Ãwa", de Marcela e Henrique Borela, retoma a questão indígena de maneira muito feliz.

    Ao investigar as reivindicações da tribo Ãwa, e a desconfiança em relação aos brancos, o longa, o melhor entre os inéditos (embora não tenha sido premiado), promove uma mistura instigante entre o registro observacional atual e o material de arquivo.

    A especulação imobiliária é o alvo de "Banco Imobiliário", de Miguel Antunes Ramos. Aqui há um problema ético: ao usar corretores como protagonistas, o filme inevitavelmente os trai.

    Já "Filme de Aborto" é uma provocação ingênua dirigida por Lincoln Péricles. A dissociação entre som e imagem e a experiência com a duração são os elementos que norteiam seu cinema. Um dia pode render, mas por enquanto ficamos na ousadia vazia.

    O impacto fácil vem com "Animal Político", longa do pernambucano Tião, que fez barulho em Tiradentes. O filme mostra os dilemas de uma vaca. Ouvimos sua voz interna, a voz de um homem. Ao tomar contato com o livro da ABNT, associação que rege as normas dos trabalhos acadêmicos, a vaca se torna bípede.

    É bem ruim, mas está sendo tratado como obra de gênio. Ganha o filme, perde o cinema. Ao menos o longa também não foi premiado.

    Em outro nível está "Jovens Infelizes ou um Homem que Grita Não é um Urso que Dança", de Thiago B. Mendonça.

    É uma provocação inteligente, embora irregular como quase todos os filmes episódicos. Fala de jovens revolucionários, perdidos entre slogans e orgias. O filme de Mendonça foi o grande vencedor do júri da crítica e, consequentemente, da 19ª Mostra de Tiradentes.

    Dos curtas, o melhor é "Eclipse Solar", de Rodrigo de Oliveira, que utiliza uma encenação rigorosa para narrar o drama de uma mulher que vendeu a alma ao diabo.

    Mas o júri da crítica deu bola fora e preferiu premiar o fraco "Noite Escura de São Nunca", de Samuel Lobo.

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