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    RÉPLICA

    Em 'Volpone', personagens são representação cômica da ganânica

    NEYDE VENEZIANO
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    09/02/2016 02h00

    Lenise Pinheiro - 23.jan.2016/Folhapress
    Sao Paulo, SP, Brasil. Data 23-01-2016. Espetaculo Volpone. Atores Gabriel Miziara (esq) e Chico Carvalho (roupa base vermelha). Teatro Mube. Foto Lenise Pinheiro/Folhapress.
    Gabriel Miziara (esq.) e Chico Carvalho durante espetáculo 'Volpone'

    Os personagens do espetáculo "Volpone" são a representação explícita e cômica da ganância. Têm, em sua maioria, nomes de bichos. O nome é, aqui, a máscara (incluindo a máscara corporal) que carrega o caráter do personagem, sem conflitos internos e sem as dúvidas tão comuns no "teatro da elite".

    Os tipos oferecem ao ator a possibilidade de uma interpretação não realista, calcada em gestos codificados de longa duração, com o distanciamento típico da comédia popular, ou seja, o desdobramento do ator que se transforma em personagem às vistas do público.

    Poderíamos fazer de outro jeito? Claro que sim. "Volpone" poderia ter sido apresentado na linguagem realista, poderia ser submisso ao formalismo francês, poderia ter sido desconstruído, poderia até ser um musical.

    Mas optamos pela "commedia dell'arte" porque, sem dúvida nenhuma, Ben Jonson, também autor de vários espetáculos do gênero mascarada, inspirou-se nela. Afinal, a cena se passa em Veneza, num tempo de peste bubônica, quando médicos andavam pelas ruas mascarados, como falsos saltimbancos, confundindo o real com o teatral.

    Portanto, esse texto permite que trabalhemos com circo, com gestos hiperbólicos, com bufonarias. Todos primos da comédia italiana.

    Mas para o crítico, emtexto publicado em 29/1 nesta "Ilustrada", esses procedimentos parecem infantis.

    Talvez pelo não aprofundamento e pela expressão física inspirada nos quadros de Callot (maior registro visual dos "comici dell'arte"). Talvez porque não haja projeção-identificação, já que não somos nada parecidos com esses seres esquisitos que se comportam de forma farsesca.

    O ponto mais grave da crítica, no entanto, é quando infere sensações e impressões do comportamento do público, saindo da seara analítica e buscando algo extrínseco ao espetáculo para desqualificá-lo. Pior, acaba por fazê-lo de forma falaciosa, sem dispor de nenhum dado concreto.

    Quando diz que a plateia se vê infantilizada, a que parcela dos espectadores o crítico se refere? Terá ele feito uma pesquisa ao final da apresentação ou possui algum tipo de procuração que lhe permite falar por eles?

    Quanto à mudez que ele também imputa à audiência, não sabemos se o resenhista esperava gritos eufóricos, mas, no dia em que conferiu o espetáculo, os aplausos fortes e duradouros suprimiram qualquer silêncio possível. Poderiam talvez desmentir sua tese, não fosse o fato de ser impossível saber o que corre em cada particular fruição da obra.

    A crítica que nos rebaixou com adjetivos pejorativos também, um dia, massacrou Arthur Azevedo, Chico Vasques, Dario Fo e Dercy Gonçalves. Estamos em ótimas companhias.

    NEYDE VENEZIANO é diretora da peça "Volpone"

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