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    Livro que inspirou 'O Quarto de Jack' não explora vítima, afirma autora

    MARIA CLARA MOREIRA
    DE SÃO PAULO

    18/02/2016 02h24

    "Mãe, tenho cinco anos", sussurra o menino (Jacob Tremblay) no começo do filme "O Quarto de Jack". É seu aniversário, e ele passou todos os outros em cativeiro ao lado da mãe, Joy (Brie Larson), sequestrada há sete.

    Tudo o que Jack conhece é um quarto de 37 m² e seus objetos: pia, guarda-roupa, abajur, únicos e insubstituíveis em seu mundo limitado. Na TV, assiste ao que a mãe ensina serem "outros planetas".

    Não por acaso, a trama lembra a do austríaco Josef Fritzl, que por 24 anos aprisionou e estuprou a filha Elizabeth, com quem teve sete filhos.

    A tragédia inspirou "Quarto" (ed. Verus, R$ 47,90, 350 págs.), sétimo livro da então pouco conhecida autora irlandesa Emma Donoghue, 46. Base do filme, ele foi alvo de acusações acaloradas de sensacionalismo antes mesmo de sua publicação, em 2009.

    "As pessoas acreditavam que o livro exploraria a vítima real ou um crime semelhante, mas não é sobre isso", explica Donoghue à Folha.

    Na obra, ela subverte a lógica das tramas de sequestro. O drama do cativeiro é pano de fundo para o estudo do vínculo entre Jack e Joy.

    "Eu me recusei a incluir a perspectiva do sequestrador. Estruturalmente, é como se a trama resistisse a seguir suas regras, mantendo-o a uma distância segura", argumenta.

    Lógica parecida segue Joy. Ela é estuprada diariamente, mas resguarda o filho ao escondê-lo no guarda-roupa.

    "Ela é muito forte. Apesar de ter enfrentado muita dor, Jack não fica ciente disso até a metade da história", diz a irlandesa. "Eu quis apresentar a maternidade em termos existencialistas. Em vez de um papel normativo das mulheres, uma escolha e tarefa heroica."

    SORTE DE PRINCIPIANTE

    "Eu amo seu livro, entendo como ele funciona e acredito ter a habilidade e a sensibilidade para lhe fazer jus em um filme", escreveu o também irlandês Lenny Abrahamson em carta a Emma Donoghue, datada de fevereiro de 2011.

    Quarto
    Emma Donoghue
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    O texto de cinco páginas detalha a paixão do então diretor iniciante por "Quarto", com análises sobre o desenvolvimento dos personagens e como queria abordá-los. As ideias agradaram a autora, que, antes da publicação do livro, já fizera da trama uma versão em roteiro para cinema.

    Como parte da parceria, Abrahamson garantiu a Donoghue envolvimento na produção do filme. "Eu visitava o set duas vezes por semana durante as gravações. Fiquei muito feliz com o elenco, sobretudo com Brie Larson", diz.

    Sua empreitada no cinema já começou superlativa: "O Quarto de Jack", seu primeiro longa, rendeu-lhe indicação ao Oscar de roteiro adaptado.

    "Tinha poucas esperanças de ser indicada", afirma. "Então fiquei atordoada quando o filme recebeu quatro indicações" –"O Quarto" também concorre por melhor filme, direção e atriz (Brie Larson).

    Ela investe na carreira de roteirista e adapta outro livro seu para as telas, "Frog Music", ainda inédito no Brasil. Na sequência, pretende levar ao cinema obras de outros autores –mas não revela quais.

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