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    crítica

    Frieza de investidores é retratada em livro que inspirou filme

    ALEXANDRE VERSIGNASSI
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    27/02/2016 02h42

    Eis o maior erro de quem não conhece o mercado financeiro: achar que ninguém gosta de crise. Não falta gente que adora, porque os momentos de baixa são tão bons para fazer dinheiro quanto os de alta. Às vezes, são melhores.

    Michael Lewis, autor que já trabalhou em Wall Street, sabe bem disso. E quando fez um livro sobre o maior apocalipse financeiro desta geração, o "crash" de 2008, decidiu contar a história justamente do ponto de vista de quem ganhou muito dinheiro com a quebradeira.

    Ele foi atrás de quem ficou bilionário com o colapso dos títulos imobiliários nos EUA. Achou uma dúzia desses sujeitos e escreveu "A Jogada do Século". O livro virou best-seller, e o filme baseado nele ("A Grande Aposta") concorre agora ao Oscar.

    assista ao trailer

    No Brasil, o livro e o filme saíram com títulos diferentes. Lá fora, não: ambos os produtos são chamados de "The Big Short", título simples com uma ideia complexa, pois faz referência ao mecanismo financeiro que o pessoal usa para ganhar na baixa: o "short sale" ("venda a descoberto", em português).

    "Vender a descoberto" é o seguinte: eu tenho umas ações e acredito que o preço delas vai subir. Você não tem ação nenhuma e acha que elas vão cair. Vamos dizer, então, que cada ação esteja a R$ 5 hoje. Você me faz uma proposta: "Vou te vender 1 milhão de ações. Mas você é amigo meu, então te vendo por R$ 4. Pode confiar. Beleza?".

    E você só me pede uma condição: que essa venda aconteça daqui a três meses. Como eu acredito que as ações vão ter subido lá na frente, aceito o acordo de olho fechado. Negocião: vou comprar por R$ 4 uma coisa que hoje vale R$ 5, e que vai estar valendo uns R$ 10 lá na frente.

    O tempo passa e, no terceiro mês, a ação derreteu. Está valendo R$ 1. E eu fiz a besteira de assinar com você um contrato me comprometendo a comprar 1 milhão de ações a R$ 4. Agora, abraço. Rodei.

    Não esqueça: você não tinha ação nenhuma quando me propôs a venda, e continua não tendo.

    O que você faz, então? Pega dinheiro emprestado no banco e compra 1 milhão de ações a R$ 1, que é o preço delas agora. Então me vende imediatamente a R$ 4, como manda o nosso contrato. E sai da operação R$ 3 milhões mais rico, sem nunca ter investido R$ 1. Foi uma "venda a descoberto": você me vendeu algo que não tinha, por um preço que eu achava vantajoso quando assinei o contrato. Grande jogada.

    Esse exemplo não é uma simplificação exagerada. Isso acontece todos os dias no mercado financeiro. O colapso das empresas do Eike Batista, por exemplo, transformou muito investidor pequeno em milionário. As desabadas recentes da Petrobras e da Vale também –choveu venda a descoberto das duas.

    A Jogada do Século
    Michael Lewis
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    Lá atrás, na crise de 2008, alguns especuladores de sangue frio fizeram esse movimento não com ações, mas com títulos hipotecários. Só que não importa, dá exatamente na mesma. E é o que Michel Lewis conta em seu "A Jogada do Século".

    ALEXANDRE VERSIGNASSI é autor de "Crash - Uma Breve História da Economia" (LeYa)

    A JOGADA DO SÉCULO
    AUTOR: Michael Lewis
    TRADUÇÃO: Adriana Ceschin Rieche
    EDITORA: Best Business
    QUANTO: R$ 45 (322 págs.)

    Edição impressa

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