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    Ópera 'Dom Quixote' lembra os 400 anos sem Miguel de Cervantes

    GISLAINE GUTIERRE
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    02/03/2016 12h02

    Heloisa Bortz/Divulgação
    Ensaio da ópera "Dom Quixote", de Jules Massenet, no Theatro São Pedro, em São Paulo
    Ensaio da ópera "Dom Quixote", de Jules Massenet, no Theatro São Pedro, em São Paulo

    Magro, com aproximadamente 1,90m de altura, cabelos brancos levemente desgrenhados, barba comprida e pontiaguda e bigode farto, também com pontas, o cantor americano Gregory Reinhart está a cara de Dom Quixote. É com esse visual que ele sobe ao palco do Theatro São Pedro, a partir desta quarta-feira (2), às 20h, para a temporada de seis récitas da ópera "Dom Quixote", de Jules Massenet.

    A montagem, que lembra os 400 anos sem o autor de "Dom Quixote", Miguel de Cervantes (1547-1616), colocará em cena dez dançarinos de flamenco, coro e solistas. A direção cênica é de Jorge Takla e a musical, do maestro Luiz Fernando Malheiro, que regerá a orquestra da casa em cinco noites.

    Pouco antes do ensaio geral na segunda (29), Reinhart recebeu a Folha em seu camarim no Theatro São Pedro. O baixo diz que o visual quixotesco tem atraído para si olhares curiosos. "Numa padaria aqui perto, uma moça me perguntou: 'Você é Dom Quixote?', e em seguida, 'Você é espanhol?'", conta, emendando uma gargalhada.

    Radicado na França desde 1978, Reinhart tem um repertório vasto, incluindo tanto Bellini quanto Wagner, Monteverdi, Haendel, Stravinsky e outros.

    Uma crítica publicada pela Folha em 2012 o apontou como um "Hagen inesquecível" em referência ao personagem que fez na ópera "O Crepúsculo dos Deuses", de Wagner, no Municipal de São Paulo.

    Mas Dom Quixote "é o projeto de uma vida toda". Um desejo que se fortaleceu 30 anos atrás, quando Reinhart topou com uma partitura de 1911, assinada pelo próprio Massenet (1842-1912), em uma loja de usados na França. "Eu disse: 'Isso precisa ser meu, esse papel vai ser meu um dia'", conta o baixo.

    Ficou quatro meses se preparando para o papel antes de chegar em São Paulo, já com barba cortada por ele mesmo, e impressionar Takla com seu visual. "E ele é um louco também, no sentido de artista, de poeta. Durante um mês de ensaio, ele nunca poupou a voz. Ele se entregou pra valer", diz o diretor.

    Heloisa Bortz/Divulgação
    Ensaio da ópera "Dom Quixote", de Jules Massenet, no Theatro São Pedro, em São Paulo
    Ensaio da ópera "Dom Quixote", de Jules Massenet, no Theatro São Pedro, em São Paulo

    CASTANHOLAS

    A ópera em cinco atos é resultado de uma parceria com o Theatro Municipal do Rio, onde serão realizadas cinco récitas a partir de 13 de abril. Lá, porém, haverá 45 pessoas no coro, em vez das 22 de São Paulo.

    Nos dois, a regência será de Luiz Fernando Malheiro, com a participação da mezzo-soprano Luisa Francesconi como a Bela Dulcineia e do barítono Eduardo Amin como Sancho Pança.

    Takla diz que a intenção nessa montagem foi apenas "contar a história". "A música é linda e diz tudo, então pra que inventar, fazer uma encenação pseudomoderna, dizendo que é outra coisa?", questiona. Por isso, elementos como a armadura, a lança, o cavalo Rocinante e os moinhos de vento estão em cena.

    Também como indica o libreto de Henri Cain (1857-1937), baseado na peça "Le Chevalier de La Longue Figure" de Jacques Le Lorrain (1856-1904), a montagem é ambientada na Espanha da Idade Média.

    O cenógrafo Nicolás Boni recorreu a gravuras criadas por Gustave Doré (1832-1883) para o livro de Cervantes. Elas são usadas como cenário e como estampas nos figurinos de Fábio Namatame.

    A música espanhola que permeia este "Dom Quixote" será colocada em evidência, com castanholas tocadas ao vivo por dançarinos de flamenco que exibirão as coreografias de Nuria Castejon.

    No quarto ato, ainda haverá uma ária de Dulcineia acompanhada só por guitarra flamenca.

    O maestro Luiz Fernando Malheiro diz que essa é uma ópera "sem momentos de tédio" e cheia de passagens "Intimistas" e "expressivas", em que o compositor reflete o amor em suas mais variadas formas —seja o de Dom Quixote por Dulcineia, pela natureza e pela humanidade, seja o de Sancho Pança por seu mestre.

    "Tem horas que a música nos faz entender a ação, e horas em que ela nos faz entender os sentimentos e as entrelinhas", diz Takla.

    Há diferenças entre a história do livro e da ópera. "Aqui, a Dulcinéia é linda, rica e desejada por muita gente. Ela é tudo o que Dom Quixote imagina", afirma Takla.

    A essência do cavaleiro não muda, e Reinhart o interpreta inspirado em Charles Chaplin, Lucille Ball e comediantes que "extraíam o humor mesmo de situações trágicas".

    "Dom Quixote é uma pessoa que luta pelo que acredita, que briga por sua amada, que derrota os bandidos, que tenta salvar seu país. Ele é um sonhador. E é, incessantemente, um otimista", diz o baixo.

    Para Reinhart, essa é também a mensagem do cavaleiro que permanece viva, mesmo 400 anos após a morte de seu criador.

    *

    DOM QUIXOTE
    QUANDO Quarta (2 e 9) e sexta (4 e 11), às 20h; domingo (6 e 13), às 17h. Uma hora antes de cada récita, haverá palestra gratuita com Sergio Casoy sobre a ópera
    ONDE Theatro São Pedro, r. Dr. Albuquerque Lins, 207, tel. (11) 3661-6600
    QUANTO de R$ 30 a R$ 80
    CLASSIFICAÇÃO 8 anos

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