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    Mostra de Harun Farocki revela a política por trás dos videogames

    SILAS MARTÍ
    DE SÃO PAULO

    15/03/2016 02h02

    Reprodução
    Cena de vídeo do artista alemão Harun Farocki, que está em exposição no Paço das Artes ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Cena de vídeo do artista alemão Harun Farocki, em exposição no Paço das Artes

    Quando começou a fazer seus mais de cem filmes, o artista alemão Harun Farocki lutava contra uma sensação de inutilidade. Ele dizia que todas as imagens do mundo já haviam sido filmadas. Não cabia registrar mais nada, e por isso suas obras seriam compilações de tudo o que existe.

    Farocki, morto aos 70, há dois anos, e agora alvo de uma retrospectiva no Paço das Artes, usou como base de seus primeiros trabalhos imagens do noticiário de televisão, em especial conflitos e revoluções, da queda da ditadura na Romênia à Guerra do Golfo.

    Mais tarde, o artista que se tornou um dos pilares da videoarte no cenário mundial desviou o foco de seu trabalho para o que entendeu como nova forma de construção da realidade —os videogames.

    Na mostra do Paço, estão suas investigações minuciosas das estratégias por trás da construção dos mundos paralelos dos jogos para crianças até as narrativas mais sangrentas de ação. São trabalhos marcados pela reflexão sobre como algoritmos e códigos a princípio inocentes conseguem arquitetar tramas de violência brutal.

    "Ele vai focando nos games para resgatar a história da arte", diz Jane de Almeida, que organiza a mostra. "A pergunta que ele faz é: se a imagem do computador chega tão perto da realidade, ela não acabaria libertando o cinema para outras funções, da mesma forma que a fotografia libertou a pintura de seu realismo?".

    De fato, Farocki, descrito como um artesão da imagem, reconhece que a animação se tornou mais poderosa do que a reprodução fotográfica. Nessas obras, aliás, ele está mesmo preocupado com cada pixel na tela, truques de luz e sombra e como os movimentos dos games se tornaram coreografias hiper-realistas controladas pelo jogador em tempo real, quase extensões do corpo de verdade.

    Mas sua análise de paletas de cor, efeitos luminosos e afins às vezes resvala para um segundo plano diante de imagens de cabeças explodindo e sangue virtual tingindo casas e ruas de vermelho vivo.

    Nesse sentido, sua obra assume uma dimensão política à flor da pele, em sintonia com a obra de cineastas como Jean-Luc Godard, um mestre em criar planos de beleza avassaladora mesmo que calcados no mal-estar da vida burguesa e sua violência intrínseca.

    Em Farocki, a política parece estar na forma como ele joga luz sobre todas as possíveis rotas de perversão ao longo da construção de uma imagem.

    Num de seus trabalhos mais célebres, também no Paço, o artista aparece diante de uma ilha de edição enquanto comenta seu próprio trabalho. "Ele vai mostrando como se faz uma ficção, o que é uma metáfora", diz Almeida. "Tem a ver com a fragilidade da tecnologia e com como a imagem se relaciona com sua decodificação."

    HARUN FAROCKI
    QUANDO de qua. a sex., 10h às 19h; sáb. e dom., 11h às 18h; até 27/3
    ONDE Paço das Artes, av. da Universidade, 1, tel. (11) 3814-3842
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