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    Herencia age por vingança, diz defesa do maestro John Neschling

    GUSTAVO FIORATTI
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    21/03/2016 02h00

    Adriano Vizoni/Folhapress
    O maestro John Neschling

    "Ressentimento e desejo de diminuir a pena" teriam motivado José Luiz Herencia, ex-diretor geral do Theatro Municipal, a envolver o maestro John Neschling em investigação do Ministério Público sobre irregularidades nas finanças do teatro. O argumento pertence à defesa do diretor artístico da casa, citado em delação premiada de Herencia, ainda não homologada na Justiça.

    "São mentiras", diz o advogado de Neschling, Eduardo Carnelós. "O maestro levou ao prefeito [Fernando Haddad] a denúncia de que havia malversação na gestão do teatro, e as acusações são motivadas por vingança", completa.

    Herencia confessou fazer parte de esquema que, diz o MP, teria causado prejuízo de até R$ 20 milhões à casa. Ele é investigado por superfaturamento e lavagem de dinheiro e teve imóveis e bens bloqueados pela Justiça em janeiro.

    Além do depoimento de Herência, foram anexados ao inquérito criminal documentos que mostram pagamentos do Instituto Brasileiro de Gestão Cultural -que administrava o teatro até intervenção da prefeitura em fevereiro- ao agente argentino Valentin Proczynski, representante do grupo catalão La Fura Dels Baus. O grupo se apresentaria no teatro em 2015 com o espetáculo "Alma Brasileira", que acabou não sendo realizado.

    Conforme adiantou o jornal "O Estado de S. Paulo", uma parcela de 130 mil euros foi paga para a produtora de Proczynski em março de 2015, mas o contrato da peça só foi assinado três meses depois.

    Foi Neschling quem defendeu o projeto, que não estava previsto na programação de 2015 do teatro. Proczynski é, atualmente, um dos representantes do maestro no exterior. Além de "Alma Brasileira", ele emplacou na programação do municipal a realização de Trilogia Romana (2014), com vídeos do Fura Dels Baus, e duas peças desta temporada, "Lady Macbeth" e, de novo com o Fura, "El Amor Brujo".

    Segundo a defesa de Neschling, o projeto de "Alma Brasileira" foi levado ao Ministério da Cultura em 2014. Em novembro daquele ano, mesmo após anúncio de que financiaria o projeto, o patrocínio foi cancelado pelo órgão federal.

    Neschling passou a defender seu financiamento pelo município, mas "a prefeitura não conseguiu obter patrocínio junto à iniciativa privada", diz o advogado do maestro. Carnelós afirma que

    Neschling tem conhecimento de um pagamento do projeto a Proczynski. O promotor Arthur Lemos, responsável pela investigação, diz que há mais parcelas, mas não especifica quantas seriam.

    Questionada sobre a transferência financeira feita pelo IBGC antes de o contrato ser assinado por Proczynski, a defesa do maestro diz que "não cabia a Neschling decidir sobre o pagamento, mas ele próprio confirma que, se consultado, opinou favoravelmente, pois o contrato atrasou por razões burocráticas". Proczynski já estava trabalhando no projeto quando o pagamento foi efetivado, segundo o maestro.

    A Folha questionou se o dinheiro será devolvido. "Neschling ainda espera que o projeto se torne realidade, acredita em sua importância", responde Carnelós.

    Ex-diretor diz que denunciou projeto

    José Luiz Herencia afirmou à Folha que os desentendimentos entre ele e Neschling começaram quando ele pediu detalhes do projeto "Alma Brasileira", "repetidamente sonegados por Proczynski e pelo maestro", diz.

    Herencia contesta a versão de que a primeira denúncia sobre irregularidades no teatro teria sido feita pelo maestro. "Partiu de mim a solicitação para que o Ministério da Cultura não desse andamento ao convênio para a realização do projeto com a empresa Old and New Montecarlo [de Proczynski], em razão dos riscos decorrentes de sua obscuridade orçamentária".

    Para Herencia, a alegação de que teria agido por "vingança" na delação que fez ao Ministério Público é um "clichê da defesa" de Neschling.

    O advogado de Neschling nega o alerta de Herencia. Segundo ele, o desentendimento teve origem nas insistentes cobranças do maestro para que Herencia e William Nacked, diretor do IBGC, explicassem o "rombo" no orçamento que obrigava o cancelamento de espetáculos programados.

    Na sexta-feira (18), após vazamento de parte do conteúdo da delação de Herencia, o Minc (Ministério da Cultura) soltou nota sobre as investigações em curso no MP.
    Assinado pelo ministro Juca Ferreira, secretário municipal de cultura quando Herencia e Neschling assumiram a fundação, em 2014, o texto diz que o Ministério "via o projeto 'Alma Brasileira' (...) como importante para a divulgação da obra de Villa-Lobos e havia decidido apoiá-lo por meio de convênio com a Fundação".

    Ainda segundo o Minc,"os realizadores se negaram a detalhar gastos no valor de R$ 3.299.980 (...) para pagamento da empresa Old and New Montecarlo". "Nós, do MinC, nos recusamos a firmar o convênio".

    Segundo Juca, o impasse "só foi resolvido quando a própria Fundação Theatro Municipal, já sob a gestão de Paulo Dallari, atual diretor-geral do Municipal e que está no comando da sua intervenção, desistiu oficialmente do convênio".

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