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    Cão é o mundo, diz Marcelo Rezende, apresentador do 'Cidade Alerta'

    GABRIELA SÁ PESSOA
    DE SÃO PAULO

    02/05/2016 02h23 - Atualizado às 00h08 Erramos: esse conteúdo foi alterado

    Jorge Araujo/Folhapress
    SAO PAULO SP Brasil 29 04 2016.Marcelo Resende, jornalista apresentador do Cidade Alerta da TV Record durante apresentação do prograrma nesta sexta feira ILUSTRADA Jorge Araujo Folhapress 703 ORG XMIT: XX
    Marcelo Resende, apresentador do policial 'Cidade Alerta', da Record, durante transmissão do programa

    Quando narra mais uma de suas histórias romanescas, Marcelo Rezende tem por hábito concluir seus raciocínios com o bordão "e aí, resumo", sintetizando tudo o que falou antes. E aí, resumo: para ele, cão é o mundo, não os programas policiais como o seu "Cidade Alerta" (Record).

    As quatro horas diárias em frente às câmeras obrigam o apresentador a usar meias de compressão por baixo das calças –aos 64, fica mais difícil aguentar o tranco, explica ele– e garantem o segundo lugar na audiência.

    Quando rodou a vinheta de abertura do "Cidade" na última terça-feira (26), às 16h30, a emissora registrava 4 pontos na Grande São Paulo (cada ponto equivale a 197,8 mil espectadores). Terminou às 20h30 com 16 pontos.

    Com o mesmo traquejo com que conta como largou o colégio aos 17, em 1968, para ser hippie e vender artesanato, ele narra uma espécie de prólogo de uma reportagem sobre uma tragédia familiar em que o genro assassinou a sogra.

    Por vezes se inflama, mas diz que jamais exagera. Um desses momentos ocorreu em 23 de junho de 2015, quando "o mesmo Marcelo Rezende que denunciou a violência policial na Favela Naval, como ele próprio ressalta, teria incitado a selvageria ao bradar frases como "atira, meu filho, é bandido" enquanto narrava uma perseguição policial.

    Jorge Araujo/Folhapress
    SAO PAULO SP Brasil 29 04 2016.Marcelo Resende, jornalista apresentador do Cidade Alerta da TV Record durante apresentação do prograrma nesta sexta feira ILUSTRADA Jorge Araujo Folhapress 703 ORG XMIT: XX
    Marcelo Resende, apresentador do policial 'Cidade Alerta', da Record, durante transmissão do programa

    As imagens foram transmitidas pelo helicóptero do "Cidade Alerta", que Rezende acompanha em um dos quatro televisores instalados no estúdio, posicionados entre as três câmeras que o captam.

    Além do sobrevoo do helicóptero e do próprio programa, ele assiste ao que está no ar na Globo e na Band e usa a concorrência como critério para manobrar em busca da audiência: diminui a duração de uma matéria, chama o helicóptero ou inverte a ordem dos videoteipes. E aí, resumo: acaba editando o "Cidade" enquanto o apresenta, ao vivo.

    DENÚNCIA

    O caso de junho de 2015 foi denunciado pelo Ministério Público Federal à Justiça em janeiro. O órgão considera que o programa fez apologia da violência e desrespeitou a presunção de inocência. Exige retratação da Record no mesmo horário, por dois dias.

    "Todo mundo fala em liberdade de expressão. Tenho a minha opinião e não vou deixar de dar. Não tinha como evitar, era ao vivo." Questionado se ele gostaria que seus netos, ainda crianças, assistissem a um policial disparar à queima roupa, ele diz que "os pais mudariam de canal".

    Raciocínio semelhante ao do procurador Pedro Antonio de Oliveira Machado, que o denuncia: há um impasse entre liberdade de expressão e abuso. "O cidadão tem o controle, e o controle remoto está na mão dele. É só trocar de canal. Mas, nesse caso, acredito que houve um abuso excepcional, atinge valores muito caros da sociedade."

    Violações não são casos isolados no "Cidade Alerta" e em programas similares, segundo um estudo da ANDI Comunicação e Direitos e do coletivo Intervozes: foram 358 em março de 2015. O coletivo analisou 28 atrações policiais em todo o país durante um mês e contabilizou 4.500 infrações, como exposição indevida de pessoas ou violação do direito ao silêncio –nesse quesito, o "Cidade Alerta" também lidera.

    Há também críticas de dentro da polícia de que o programa, ao narrar de maneira alarmista casos de roubo e latrocínio (deste último, na última terça, foram dois), reforça a sensação de insegurança (no intervalo, ele anuncia a empresa de segurança Car System).

    Rezende rejeita a interpretação de que faça sensacionalismo ou exiba o "mundo cão". "Mostro a realidade. A vida é assim fora dos Jardins, de Ipanema." E diz perceber certa injustiça em relação a seu trabalho. Muitas vezes defende posições progressistas, como o direito ao aborto.

    Hoje, a maioria das pautas do "Cidade" denuncia casos de violência contra a mulher –e metade da audiência é feminina. Um agressor que estava desaparecido, cuja foto foi exibida na terça, reapareceu preso no programa de quinta (28). E aí, resumo: o mundo é mesmo cão, e na TV parece pior.

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