• Ilustrada

    Saturday, 04-May-2024 07:51:11 -03

    Mexicano Jorge Volpi une realidade e ficção em narrativa sobre a crise

    SYLVIA COLOMBO
    DE SÃO PAULO

    03/05/2016 02h25

    Quando o escritor mexicano Jorge Volpi, 47, teve a ideia de fazer o romance "Memorial da Fraude", o México ainda sentia o impacto da crise financeira global de 2008.

    Quando o livro saiu na Espanha, era a vez deste país estar se debatendo com a recessão. Finalmente, a obra chega ao Brasil, justo quando, por aqui, também se atravessa uma séria crise econômica.

    "É uma casualidade triste que a publicação em português coincida com esse momento grave que vive o Brasil. Mas, como a reflexão que o livro propõe é sobre o que causa uma crise econômica e como isso impacta na política, me parece que a discussão é atual", diz Volpi à Folha.

    Ulf Andersen/Getty Images
    AIX EN PROVENCE, FRANCE - OCTOBER 16. Mexican writer Jorge Volpi poses during a portrait session held on October 16, 2011 in Aix en Provence, France. (Photo by Ulf Andersen/Getty Images) ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    O autor mexicano Jorge Volpi, de "Memorial da Fraude"

    O romance conta uma história que mescla realidade e ficção. Nela, um narrador, cujo nome é J.Volpi (em referência ao próprio autor), revela estar por trás de uma grande fraude. Ao mesmo tempo, investiga a vida do pai, que havia sido funcionário do Departamento do Tesouro durante a Segunda Guerra Mundial.

    "A busca do filho pelo pai é um tema universal e mítico, mas ganha especial contorno na literatura mexicana, por conta da obra de Juan Rulfo (1917-1986)", diz Volpi, referindo-se a "Pedro Páramo" (1955), romance em que um filho viaja para buscar o pai num vilarejo-fantasma no interior do México.

    Para compor seu livro, Volpi, que é especialista em literatura, professor em Princeton e outras universidades nos EUA, mergulhou no mundo dos bancos e dos mercados.

    "Sempre gostei de escrever sobre coisas de que não sei nada no princípio. É um desafio enorme, pois me obriga a aprender e entender as coisas desde o começo", explica.

    Volpi, hoje um dos principais escritores mexicanos, ganhou projeção internacional a partir dos anos 1990, quando participou do movimento crack. Na época, um grupo de jovens autores respondia ao chamado realismo mágico latino-americano e pedia que a literatura da região se dedicasse a outros assuntos que não apenas as questões sociais do continente.

    Com os colegas, Volpi passou a propor uma série de novos temas, entre eles a história europeia e a ciência.

    PESSOAL

    Algo de experiência pessoal, porém, existe em "Memorial da Fraude", pois Volpi diz ter tirado inspiração para a trama das crises que viveu quando criança e adolescente, no México.

    "A mais grave foi a dos anos 1980. Senti na pele porque minha família, então de classe média em situação confortável, passou a viver com muitas restrições", explica.

    Diferentemente de outros livros e filmes que retratam a crise de 2008, porém, Volpi preferiu ilustrar não as consequências, e sim as origens.

    "Me interessava investigar quem são os causadores tradicionais e invisíveis dessas situações que levam milhões à pobreza, que são os fraudadores, os especuladores, os de sempre", resume.

    Entre as consequências políticas mais visíveis hoje, Volpi identifica a atual confusão na Espanha –que, após quatro meses de uma eleição, teve de convocar uma outra porque os principais partidos não chegaram a um acordo, requisitado pela lei, sobre a formação do novo governo.

    "A crise econômica levou a uma crise de representatividade. Os espanhóis deixaram de acreditar nos partidos tradicionais, e o quadro se agravou a esse ponto", resume.

    Crise de representatividade que também aponta no México, ao comentar fato ocorrido recentemente. Um grupo de peritos e especialistas independentes lançou um informe rebatendo várias afirmações e teses do governo mexicano com relação ao ocorrido com os 43 estudantes desaparecidos em Ayotzinapa, no Estado de Guerrero, em 2014.

    Memorial da Fraude
    Jorge Volpi
    l
    Comprar

    "O caso desses meninos é um ponto de inflexão em nossa história recente. Apesar de a guerra ao narcotráfico já ter causado tantas vítimas (os números oficiais registram mais de 80 mil pessoas), a desaparição deles marcou o fim da crença dos mexicanos em sua Justiça e seus governantes."

    MEMORIAL DA FRAUDE
    AUTOR Jorge Volpi
    LANÇAMENTO Alfaguara
    TRADUÇÃO Maria Alzira Brum
    PREÇO: R$ 64,90 (432 págs.)

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024