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    Nomeado ao pular hierarquia, curador dá novo fôlego ao museu Whitney

    DO "NEW YORK TIMES", EM NOVA YORK

    03/05/2016 17h08

    Menos de 48 horas antes da abertura da mostra do museu Whitney sobre retratos, Scott Rothkopf estava pedindo a um assistente para girar "45 graus para a esquerda" um busto pendente de arame de Calder.

    Pode parecer surpreendente que um curador-chefe se preocupe com minúcias desse tipo, mas a atenção intensa para os detalhes é uma das qualidades que projetou Rothkopf, levando-o de editor de uma revista de artes aos altos escalões de uma das maiores instituições culturais dos Estados Unidos —com apenas 38 anos de idade.

    Houve reações de espanto quando Rothkopf foi nomeado para o cargo, em maio passado, dado que ele não tinha ascendido pela hierarquia de curadores. O Whitney, onde ele chegou como curador em 2009, foi seu primeiro trabalho em um museu (descontando sua passagem pela instituição como estagiário, no verão de 1998).

    E ele tomou o lugar da muito apreciada Donna de Salvo, que foi curadora-chefe durante anos e hoje é a vice-diretora de iniciativas internacionais do Whitney.

    Nicole Bengiveno - 24.abr.2016/The New York Times
    Scott Rothkopf, curador-chefe do museu Whitney, durante abertura da exposição 'Human Interest'
    Scott Rothkopf, curador-chefe do museu Whitney, durante abertura da exposição 'Human Interest'

    Mas, em seu primeiro ano no cargo, Rothkopf já está começando a causar impacto, em grande parte por promover artistas emergentes e moldar o futuro do museu. Ele promoveu três jovens assistentes de curador e contratou um quarto. Promoveu Dana Miller -com quem dividiu a curadoria da mostra atual "Human Interest: Portraits From the Whitney's Collection" —a diretora da coleção e ajudou a atrair Christopher Y. Lew, do MoMA PS1, fazendo dele e de Mia Locks os curadores da próxima Bienal do Whitney.

    "Ele realmente revigorou o programa contemporâneo", comentou o diretor do museu, Adam D. Weinberg. "O que Rothkopf está fazendo é reconhecer e elevar os talentos jovens e as pessoas que trabalham bem. Para um museu dedicado à arte contemporânea, é importante não ter apenas curadores com mais de 60 anos."

    Rothkopf possui uma presença jovem que é acentuada por sua altura compacta, cadência dinâmica e personalidade gregária. Em entrevista dada em sua sala de trabalho com vista para o rio Hudson, ele disse que uma de suas primeiras metas foi dinamizar a tradição do Whitney de apostar em artistas emergentes. "As conexões entre bienais não eram tão fortes quanto eu queria que fossem", ele disse.

    Com essa finalidade em vista, ele encorajou a inclusão de Lucy Dodd, um talento em ascensão, numa série rotatória recente no quinto andar, um plano aberto. E deve anunciar que o Whitney vai receber uma instalação ao ar livre de Virginia Overton na forma de um moinho de vento —uma encomenda importante para uma artista pouco conhecida.

    "Precisamos manter contato com esse espírito experimental, cheio de vida", falou Rothkopf. "O fato de parecermos um museu mais adulto não quer dizer que sejamos avessos a riscos."

    No novo edifício do Whitney no centro da cidade, Rothkopf ajuda a comandar um questionamento do significado de ser um museu de arte americana: até que ponto a instituição deve incluir artistas de outros países que fizeram trabalhos significativos nos Estados Unidos? Até onde a coleção deve refletir as outras Américas geográficas?

    "Acho que você vai ver uma grande ampliação em termos dos tipos de artistas que incluímos na programação", disse o curador-chefe.

    A exposição de retratos aberta na semana passada, descrita pelo crítico do "NYT" Holland Cotter como "imediatamente atraente", exemplifica esse enfoque integrado, com trabalhos de artistas afro-americanos, mulheres e mais jovens, lado a lado com nomes consolidados.

    A exposição estuda os retratos através do prisma das mídias sociais, ao mesmo tempo em que se inspira na tradição figurativa do Whitney. Parece ser esse o dom especial de Scott Rothkopf: saber atrair espectadores com mostras que eles veem como relevantes e acessíveis (e, em alguns casos, esdrúxulas), ao mesmo tempo em que fundamenta as exposições com lastro intelectual.

    "Será algo que vai agradar às plateias mais amplas, mas também há muita erudição por baixo da superfície", comentou Weinberg. "Pode haver uma ideia cronológica ou temática maior, mas também há surpresas. Rothkopf entende que uma exposição também conta uma história."

    Weinberg evitou responder se estaria ou não preparando Rothkopf para ser seu sucessor: "Acho que Scott será um grande diretor de museu algum dia, quer seja do Whitney ou de outro lugar."

    Está claro que Rothkopf tem grandes ambições. Em um evento recente de gala no Whitney, bastou vê-lo em ação em uma sala cheia de diretores do conselho para notar sua habilidade em tratar com doadores. Mas muitos dizem que ele, que também é vice-diretor de programas, avançou tanto em tão pouco tempo em grande medida graças ao seu trabalho árduo. "Human Interest" é a décima exposição em sete anos que ele comanda como curador único ou em colaboração com outros.

    Quatro dessas exposições envolveram retrospectivas de artistas destacados: Jeff Koons, Wade Guyton, Glenn Ligon e Mary Heilman, cada um dos quais comentou sua atenção às minúcias, desde a divulgação até o catálogo.

    "Foi como uma cirurgia cerebral sem anestesia", disse Ligon. "Nunca tive alguém que refletiu cuidadosamente sobre cada elemento de uma exposição, como ele fez."

    Ligon disse que Rothkopf sugeriu que eles fossem pessoalmente ver cada obra que queriam emprestar para incluir na mostra. "Se uma mostra é um tipo de poema, cada palavra é importante", falou Ligon. "E não dá para escolher essas obras a partir de transparências. É preciso ir vê-las."

    Fã do trabalho de Jeff Koons há 20 anos, Rothkopf organizou a retrospectiva de 2014, a última mostra realizada no edifício Breuer, e usou o catálogo para apresentar "um argumento complexo, embora um tanto defensivo, para explicar o modo como Koons expõe declaradamente os mecanismos de dinheiro e publicidade em sua arte —essencialmente fazendo duas coisas ao mesmo tempo", escreveu Roberta Smith no "NYT", numa crítica balanceada da mostra.

    Koon comentou que Rothkopf "propunha ideias muito novas", como a de concentrar a série "Banality" de Koons, feita de figurinhas kitsch, sobre um grande pedestal.

    Quanto à ideia de que ela teria se sentido injustamente suplantada pela ascensão de Rothkopf, De Salvo comentou: "Nunca encarei a coisa desse modo. Estou cuidando de algumas iniciativas muito importantes para a exposição. Fico realmente contente por ele estar aqui, fazendo o que está fazendo."

    Na nova hierarquia do Whitney, Rothkopf, antes subordinado a Miller, hoje é seu chefe.

    A situação poderia ter ficado incômoda, mas Miller disse que ela e Rothkopf continuam amigos. "Ele tem um espírito caloroso, generoso", ela disse. "Imediatamente tomou iniciativas para empoderar profissionais mais jovens do departamento, lhes deu orçamentos para viajar, os convidou a reuniões e vernissages. Não há dúvida de que está tentando ser o mais inclusivo possível."

    Tradução CLARA ALLAIN

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