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    Em documentário, Marina Abramovic vem ao Brasil em busca de esoterismos

    SILAS MARTÍ
    DE SÃO PAULO

    15/05/2016 02h00

    Divulgação
    Cena do filme 'Espaço Alem
    Cena do filme 'Espaço Alem'

    "Não me sinto uma diva", diz Marina Abramovic, maquiada, penteada, toda de preto. "Odeio essa coisa de avó da performance. Sacerdotisa, celebridade, isso tudo é a mesma merda. Queria ser uma guerreira, soldado da arte."

    Numa galeria em São Paulo, uma das artistas mais famosas do mundo tenta desconstruir os rótulos que grudaram nela ao longo das últimas quatro décadas, em que vem se cortando, queimando e descabelando em ações que entraram para a história, espetacularizando a dor.

    Mas agora a dor é dos outros, ou passou para debaixo da pele. Tentando entender outras dimensões da realidade, a artista sérvia viajou pelo Brasil nos últimos três anos atrás de rituais místicos, do Santo Daime ao candomblé, passando por cirurgias com ponta de faca no olho do médium João de Deus, em Goiás.

    Toda essa jornada espiritual está documentada em "Espaço Além", filme que entra em cartaz agora, um misto de reality show com cenas de meditação em cachoeiras, cavernas e vales paradisíacos.

    "Quando você controla a dor física, ela deixa de existir. Mas a emocional é pior. Se você ama e trabalha com paixão, também sofre apaixonada", diz Abramovic. "Venho de uma cultura do desespero."

    Assista

    Na alquimia do mundo da arte, no entanto, esse desespero foi virando glamour. Abramovic conta que era chamada de louca, sádica e masoquista quando fez suas primeiras performances. Depois, virou uma espécie de mito e entrou para um círculo de amizades que vai de Lady Gaga e Brad Pitt ao rapper Jay Z, num casamento rentável entre as artes visuais e Hollywood.

    Seu novo -e às vezes irritante- lado esotérico vem aflorando agora em andanças no mato como antídoto à fama que conquistou. Tanto que Marco Del Fiol, diretor do documentário, diz ser explícita no filme a ideia de
    "desconstruir" uma diva.

    "Ela tem essa aura divina, mas queria fazer uma coisa profana também", diz o cineasta. "Ela começa bem maquiada, arrumada e aos poucos vai se descabelando, termina toda enlameada."

    E pelada. Mesmo tendo desafiado plateias nua quando jovem, faz tempo que Abramovic, hoje com 70 anos e "mais feliz do que nunca", não se expõe da forma como surge no documentário, sem esconder rugas e imperfeições do corpo.

    Nesse sentido, quebrando ovos na palma das mãos ou se debatendo louca de ayhuasca no meio de um bosque, ela parece reafirmar sua crença na presença do artista, ou melhor, numa arte imaterial em que tudo não passa de uma troca de energias entre autor e público.

    "No futuro, a arte será sem objetos. Estou tentando preparar uma nova geração para isso", diz Abramovic. "É sobre espiritualidade e energia. Quero uma experiência, não um quadro na parede. Isso é vida."

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