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    Dori Caymmi musica peça de Mário Lago censurada pela ditadura militar

    LUIZ FERNANDO VIANNA
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    25/05/2016 02h42

    A peça "Foru 4 Tiradente na Conjuração Baiana", sobre a revolta de 1798, foi escrita por Mário Lago na década de 1970, censurada pela ditadura e até hoje não encenada.

    Parece algo envelhecido, mas quem diz isso a Dori Caymmi, 72, que musicou versos da peça, pode receber como resposta a estrofe inicial da canção "Três Joaquins" com sabor de atualidade:

    "Nós somos sacaninhas/ E aqui estamos na historinha para delação/ Seja lá qual for o lado/ Vendemos por bom trocado uma informação".

    Zo Guimarães - 21.mar.2014/Folhapress
    rIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL, 21-03-2014, 17H: Retrato de Dori Caymmi, violonista e filho de Dorival Caymmi, que esta lancando o CD "Setenta Anos", aluso data que completou em 2013. Ele musicou 13 poemas de seu parceiro principal, Paulo Csar Pinheiro. Foto em sua casa, em Copacabana. (Foto: Zo Guimaraes/Folhapress/ILUSTRADA(zo com acento circunflexo no o)**EXCLUSIVO FOLHA**
    Dori Caymmi, que musicou versos de peça de Mário Lago

    Ou receber uma resposta formal: "É uma peça histórica. Se chegam a pensar que envelheceu é porque nossa memória é muito ruim. Eu ignorava a Conjuração Baiana. Não se ensinava nas escolas."

    Dori bancou a produção do CD "Foru 4 Tiradente na Conjuração Baiana" e decidiu lançá-lo logo, para alguém se animar a encenar o texto.

    Participam do disco Joyce Moreno, Mônica Salmaso, Sergio Santos, Renato Braz, o português Roberto Leão e outros.

    São 14 músicas que contam o movimento liderado por Luiz Gonzaga das Virgens, João de Deus, Lucas Dantas e Manuel Faustino dos Santos Lira. Eles queriam a independência do Brasil e, como ocorrera na Inconfidência Mineira, foram massacrados pela Coroa portuguesa: acabaram na forca e seus corpos, esquartejados.

    Militante comunista, Mário Lago (1911-2002) escolheu o tema histórico para tratar, na verdade, de algo mais atual: a luta contra a ditadura militar.

    É uma abordagem familiar para Dori, que fez a direção musical dos espetáculos "Arena Conta Zumbi" (1965) e "Calabar" (1973) –além de "Opinião" (1964), o primeiro libelo teatral contra o regime.

    "Aceitei o convite dos filhos do Mário Lago porque é uma boa peça e, sobretudo, em homenagem a ele, um grande brasileiro", afirma o artista, cujo pai, Dorival Caymmi, era amigo de Lago e admirador de suas letras.

    TRADIÇÃO BRASILEIRA

    Dori utilizou referências melódicas da tradição brasileira, sobretudo nordestina. Algo inevitável para um compositor e arranjador que, mesmo tendo trabalhado boa parte dos últimos 23 anos em Los Angeles, sempre investe contra a presença maciça da música pop por aqui.

    "Tenho um grave defeito: eu gosto do Brasil", diz. "Há artistas pop que eu admiro, mas a minha formação é brasileira e vou morrer com ela: Ary Barroso, Pixinguinha, Braguinha... Muitos novos artistas são mais ligados à cultura do exterior. Tenho isso até na minha família, com Alice [Caymmi, sua sobrinha]. Mas sou otimista, vejo uma garotada que está apaixonada pela música brasileira."

    Num show que ele fez em fevereiro com Joyce Moreno, em Nova York, uma americana disse que resolveu vê-lo após ouvir de Caetano Veloso, numa palestra, que Dori era o único de sua geração que nunca tinha mudado de caminho.

    "Fiquei até emocionado, porque, embora a gente já tenha tido divergências, Caetano é um dos brasileiros de que mais gosto. E eu sou mesmo brasileiro até o talo", resume.

    FORU 4 TIRADENTE NA CONJURAÇÃO BAIANA
    ARTISTA Dori Caymmi
    GRAVADORA Acari
    QUANTO R$ 30

    LUIZ FERNANDO VIANNA é autor de "Aldir Blanc - Resposta ao Tempo" (Casa da Palavra).

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