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    Polarização política leva canais pagos de notícia a ameaçarem TV aberta

    NELSON DE SÁ
    DE SÃO PAULO

    10/07/2016 02h00

    Diego Padgurschi - 12.abr.2016/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL - 12-04-2016: "BASTIDORES DO IMPEACHMENT": Eduardo Cunha apos dar entrevista no Salao Verde da Camara dos Deputados.. (Diego Padgurschi /Folhapress - (PODER) ***EXCLUSIVO*** --------- FOTO 02 -------
    O deputado afastado Eduardo Cunha, após entrevista no Salão Verde da Câmara

    A audiência média dos canais de notícia nos Estados Unidos saltou 8% de 2014 para 2015, segundo o instituto Nielsen. Foi o primeiro crescimento em três anos.

    É o "efeito Trump", como acabou apelidado —referência ao interesse causado pela campanha controversa do bilionário republicano Donald Trump, ex-apresentador de reality show, desde junho do ano passado.

    O fenômeno prosseguiu neste ano, com a Fox News, o canal líder, marcando novo recorde para a cobertura das prévias republicanas em 15 de março. Foram 5 milhões de espectadores, seguidos pelos 4,3 milhões da CNN, também em forte alta. Ambos deixando para trás uma das três grandes redes abertas do país, a ABC, com 3,1 milhões.

    No Brasil, o fenômeno chegou com atraso, mas chegou. Segundo o instituto alemão GfK, a audiência média dos canais de notícia no país saltou 20,6% do primeiro para o segundo trimestre deste ano.

    Novamente, é efeito da polarização política, no caso, culminando na abertura do processo contra a presidente Dilma Rousseff pela Câmara dos Deputados, na votação de 17 de abril.

    Naquele dia, segundo o Ibope, a GloboNews, o canal líder, foi o mais visto de toda a TV paga no país, fato que se repetiria no dia 11 de maio, quando da aceitação do processo pelo Senado.

    POLARIZAÇÃO

    Para o analista Ken Doctor, ligado ao Nieman Journalism Lab, da Universidade Harvard, o crescimento nos EUA "se deve diretamente à incendiária campanha de Trump e sua produção incessante de 'sound bites'", declarações de grande repercussão, algumas "ultrajantes".

    "As estações de cabo, aqui, são como cães perseguindo um carro", acrescenta. "Elas não resistem ao barulho de qualquer pedaço de notícia. Depois transformam pequenas coisas em médias e médias em grandes, no esforço para segurar o espectador."

    Doctor e outros no país identificam a mudança não só em Trump, mas na decisão paralela da CNN, sob nova direção, de apostar tudo em política e "martelar três histórias por dia". Com isso, o canal passou e tem hoje o dobro da audiência da MSNBC.

    O próprio Trump explicou, já em setembro passado, num evento público: "Na televisão, a fórmula é simples. Se você consegue boa audiência —e estas não são boas, são monstruosas— você não sai mais do ar, mesmo que não tenha o que dizer".

    No Brasil, analistas como Flávio Ferrari, diretor-geral do GfK, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, que comandou a Globo, e Antônio Athayde, que chefiou a Globosat e a Net, também explicam o crescimento dos canais pela radicalização política.

    "A gente está vivendo um momento intenso de polarização", afirma Ferrari, citando o noticiário político, mas ressalvando ser parte de um conjunto de fatores, da crise econômica ao clima mais frio e à "megatendência global" de maior busca por conhecimento e informação.

    Para Boni, as crises políticas, não só no Brasil e nos EUA, mas mundo afora, "potencializam uma tendência já existente" no próprio setor. "Eu sempre advoguei o jornalismo como saída para a televisão", diz. "O futuro é a programação ao vivo."

    Além de coberturas jornalísticas, menciona esportes e outros eventos. "O resto ficará para o espectador ver na hora que quiser, em streaming", acrescenta, citando seriados e novelas, mas prevendo sobrevida de dez anos para ambos na TV.

    Segundo Athayde, a atenção maior dedicada agora ao noticiário é "um bom sinal" para o país, "de uma sociedade mais preocupada com o que está acontecendo, mais ligada ao que se faz na política, e de canais explorando isso muito bem".

    Diz lamentar apenas que o fenômeno se restrinja por enquanto à GloboNews, sem chegar à BandNews, por exemplo, que fechou o semestre como 38º canal no país, segundo o Ibope. "É muito ruim, precisava ter uma visão alternativa."

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