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    Análise

    Afastamento de Caetano e outros artistas enfraqueceu ocupações

    MAURÍCIO MEIRELES
    DE SÃO PAULO

    25/07/2016 12h27

    Ricardo Borges/Folhapress
    O músico Caetano Veloso canta em ato contra o fim do MinC, no Palácio Gustavo Capanema, no centro do Rio, nesta sexta-feira
    Caetano Veloso cantando em ato contra o fim do MinC, no Palácio Gustavo Capanema, no centro do Rio, em maio

    A festa, ao contrário do que pode imaginar o senso comum, não é um ambiente alienado onde se diluem os conflitos da sociedade. A ocupação do Gustavo Capanema, hoje no itinerário de blocos de carnaval e festas do Rio, é a prova disso.

    A imagem fundamental desse contexto é um retrato do show de Caetano Veloso no local, feito por Daniel Marenco. Com um cocar, o artista aparece de costas contra a luz de um refletor —como o índio que, diz a canção, descerá de uma estrela colorida e brilhante.

    A imagem tem um ar messiânico, e o apoio de Caetano parecia apontar o sucesso da ocupação.

    O show foi o ápice da manifestação, mas a foto não mostra o conflito que já se desenvolvia no seio do movimento. Houve quem achasse estranho Caetano, apesar de fazer silêncio para o público bradar frases de protesto, não ter engrossado ele próprio o coro do "Fora Temer".

    Com a volta do MinC (Ministério da Cultura) e a nomeação de Marcelo Calero, uma figura próxima de certa esquerda ligada às artes no Rio, o conflito tornou-se inconciliável. E enfraqueceu politicamente a ocupação.

    De um lado, ficou a turma do "diálogo", uma esquerda que defende a negociação com o governo interino, por achar necessário conquistar um espaço de cada vez. Do outro, a turma do tudo ou nada: não deve haver, segundo eles, conversa com um governo "ilegítimo".

    Na primeira, estão Caetano, a empresária Paula Lavigne e os artistas do Procure Saber —um grupo que fortalecia politicamente a ocupação, mas que se afastou dela.

    Logo que assumiu o MinC, Calero prometeu que não faria pedido de reintegração de posse dos espaços ocupados. O que mudou de lá para cá? Naquele momento, as ocupações eram mais fortes. Mas o grupo do diálogo, que teve suas demandas —mais modestas, é verdade— atendidas, mostrou-se mais forte do que os ativistas.

    O Gustavo Capanema era o epicentro dos protestos pelo Brasil. Ao nomear Marcelo Calero, Michel Temer causou constrangimento em setores influentes da classe artística carioca, amiga do escolhido pelo presidente interino.

    À época, parecia provável que tais setores rompessem com o novo ministro, mas aconteceu o contrário. O xadrez de Temer mostrou-se bem-sucedido.

    Quatro dias depois do show, o ministro da Cultura participou de uma reunião na casa de Paula Lavigne. E o índio não apareceria mais no Gustavo Capanema.

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