A programação de TV desta semana traz "Repulsa ao Sexo", clássico do polonês Roman Polanski, e "Pontes dos Espiões", produção recente de Steven Spielberg.
Há também Eddie Redmayne no papel pelo qual levou um Oscar em "A Teoria de Tudo", o expoente brasileiro "Cidade de Deus" e o faroeste "Era Uma Vez no Oeste", clássico de Sergio Leone.
Leia abaixo quais são os destaques desta semana, selecionados pelo crítico da Folha Inácio Araujo:
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SEGUNDA (29)
Até "Foxcatcher - Uma História que Chocou o Mundo" (2014, HBO Plus, 17h25, 14 anos), Steve Carell era um ator de tipos cômicos, especialidade em que se deu sempre muito bem, diga-se.
"Foxcatcher" revelou uma face bem diferente de seu talento. Ali ele faz o bilionário John du Pont, que decide abrigar sob suas asas a equipe americana de luta olímpica.
Ele contrata os irmãos Mark e David Schultz, que se veem em estranha circunstância: promovidos de uma hora para outra a merecedores de altos salários. O que Du Pont lhes pede em troca, no entanto, não é pouco: submissão absoluta.
A paixão de Du Pont pelas lutas vem, sobretudo, do fato de ser esse o lugar onde despeja seus desajustes. Dessa personalidade complexa, Carell dará conta com brilho, num filme, diga-se, bem bom.
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TERÇA (30)
Uma pergunta sobre "Christine, o Carro Assassino" (1983, 12 anos, TCM, 2h): seria o carro, afinal, tão assassino assim?
É verdade que Christine, com seu nome de mulher, parece alimentar um ciúme absoluto em relação a seu jovem dono, Arnie.
Em contrapartida, Arnie parece disposto a esquecer o mundo, ou ao menos a colocá-lo em segundo plano: graças a Christine, afinal, ele consegue sair com garotas do outro mundo etc. e tal.
Será justo então perguntar até que ponto Christine não é investido pela personalidade de seu jovem proprietário? E não seria este o real senhor de seus atos?
Filme de horror que talvez seja um dos primeiros indícios da agonia da era automobilística, "Christine" nos conduz a um pesadelo cor-de-rosa, a cor do carro, pelas mãos muito hábeis de John Carpenter.
Mais cedo, outro clássico: "Era Uma Vez no Oeste" (1968, 14 anos, TC Cult, 22h), um grande Sergio Leone.
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QUARTA (31)
Será que hoje em dia um filme como "Repulsa ao Sexo" (1965, 18 anos, TC Cult, 20h) ainda tem apelo? Não pelo fato de ser um branco e preto, mas por certa repulsa (vale usar a palavra) que o tempo parece demonstrar por qualquer filme que apresente um problema.
E, vamos convir, os de Roman Polanski costumam ser complicados. Ali Catherine Deneuve faz uma jovem que vivencia a sexualidade como terror. O que Polanski revelará por meio dos angustiantes delírios que a invadem quando se vê sozinha em casa -por conta de uma viagem da irmã.
Não que a sexualidade tenha deixado de ser um problema, apenas ele se manifesta de outras formas.
Verdade que a dra. Ryan Stone, se os tem, não demonstra. Seu papel em "Gravidade" (2013, 12 anos, HBO2, 18h30), o belo filme de Alfonso Cuarón, é, antes de tudo, sobreviver. Ela precisa enfrentar as muitas adversidades de uma missão abortada para voltar à Terra.
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QUINTA (1º)
Uma tarde mística, com "Aparecida, o Milagre" (2010, livre, Canal Brasil, 13h30), em que um homem sem fé desde que, na infância, o pai morreu (durante a construção da Basílica de N.S. Aparecida), se depara, na idade adulta, com outra adversidade.
A saber: seu filho sofre um acidente de moto e fica à morte. Questão: consentirá N.S. Aparecida no milagre de salvar o jovem?
Bem, a resposta está no título deste esforço do catolicismo para se recompor, ainda que canhestramente, da atual supremacia dos neopentecostais no território dos milagres. Eles alimentam a fé.
Quanto ao mais não houve milagre: Nossa Senhora não evitou que sua basílica e seu filme fossem os monstrengos (arquitetônico ou cinematográfico) que são.
Já "Nosso Lar" (2010, 10 anos, TC Touch, 15h55) é o filme que enterrou o efêmero ciclo espírita do nosso cinema. Em parte por mostrar muito mal o mundo do além. Em parte por mostrá-lo bem aborrecido.
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SEXTA (2)
Estranho momento, o de "Cidade de Deus" (2002, 16 anos, Paramount, 14h45): o país estava saturado de um tipo de política e se preparava para eleger Lula presidente, pendendo, portanto, para políticas sociais.
Ao mesmo tempo, o filme anuncia o surgimento de uma nova sensibilidade. Rompe-se, a rigor com o cinema novo e com a ideia de que o banditismo é, antes de tudo, uma questão de política.
Ainda não estamos na era de "Tropa de Elite", mas a caminho: o jovem bandido é perverso por natureza, assim como o rapaz que aspira à função de repórter fotográfico é pessoa de boa índole.
O sucesso do filme deve-se, em parte, é inegável, a uma espécie de saturação de um olhar -esse olhar sempre benevolente com o banditismo. Ele nos diz que estávamos cheios disso. Os espectadores que fizeram o sucesso desse tipo de olhar pendiam, na esfera política, para outro lado. Nem sempre somos fáceis de entender.
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SÁBADO (3)
A primeira ideia que vem à cabeça quando se pensa em um filme sobre Stephen Hawking é que ali se falará do gênio e da doença que aos poucos lhe paralisou os músculos do corpo. Imediatamente, nos preparamos para o pior melô possível.
A boa notícia é que "A Teoria de Tudo" (2014, 10 anos, TC Touch, 0h10) consegue falar de Hawking, de sua doença e de sua genialidade sem apelar para o piegas. O físico atravessa as provações da doença sem lamúrias.
Não que isso faça um grande filme, mas evita as armadilhas tão ao alcance desse gênero. É um mérito inegável. Ok, mas o melhor vem de Eddie Redmayne, que encarou o desafio de representar a progressiva dificuldade além de ser um ótimo ator encarou o desafio do papel e saiu-se com brilho: ganhou o Oscar.
Não foi surpresa: qualquer anomalia sempre leva o Oscar de ator.
Ainda hoje, "Ponte dos Espiões" (2015, 12 anos, TC Premium, 22h): a ele voltaremos.
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DOMINGO (4)
Há um bom tempo que Steven Spielberg parecia ter se transformado num burocrata da mise-en-scène. Sempre hábil, claro, mas nem por isso menos evasivo. Capaz de fazer sucessos, ganhar Oscars, divertir ou mostrar-se grave.
Um homem do espetáculo, sempre. Mas nem sempre no melhor sentido.
Digamos, então, que em "Ponte dos Espiões" (2015, 12 anos, TC Pipoca, 20h) reencontramos o vigor clássico de certo Spielberg, que com brio reconstitui um episódio-chave da Guerra Fria e, mais, seu espírito e atmosfera.
No exato momento em que sobe o Muro de Berlim deve se processar a delicada troca entre um estoico espião da URSS apanhado pelos americanos (já há tempos, diga-se) e um americano capturado pelos russos.
Spielberg sabe reencontrar a densidade por vezes tétrica do episódio. Não abandona o espírito do espetáculo, mas também não o barateia: belo filme, enfim, para fechar um domingo.