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    Exposição no Tomie Ohtake reúne tesouros de banqueiro

    SILAS MARTÍ
    DE SÃO PAULO

    03/09/2016 11h05

    Numa sala redonda cheia de quadros de Volpi, Robert Storr diz que poderia passar o dia ali numa cadeira giratória, virando de um lado e para o outro. Mas, em vez de uma poltrona, ele mandou pôr duas esculturas de Amilcar de Castro no meio das pinturas. São peças de aço dobradas e cortadas que ecoam o jogo de volumes e cores das telas do modernista ao redor.

    "Não estou tão interessado em categorias da história da arte", diz o crítico americano. "Sei que elas existem, mas penso mais em criar diálogos visuais entre coisas que conversam ou coisas que contrastam de um jeito mais agudo. Não planejo me impressionar. Vou montando as coisas e me surpreendendo."

    Divulgação
    ‘Projeto para Construção de um Céu’, obra de Carmela Gross
    'Projeto para Construção de um Céu'’, obra de Carmela Gross

    Mais do que uma seleção de 300 obras de arte, que vão do auge do concretismo nos anos 1950 a trabalhos de jovens estrelas da arte contemporânea, a mostra que ocupa agora todas as galerias do Instituto Tomie Ohtake é um encontro de personalidades.

    De um lado, está o banqueiro José Olympio Pereira, um dos maiores colecionadores e mecenas do país, que juntou esse acervo ao longo de décadas. De outro, está Storr, professor da Universidade Yale que também já comandou a Bienal de Veneza –é dele a seleção das obras espalhadas pelas salas do centro cultural.

    Olympio Pereira e Storr já se esbarraram antes. Os dois estão no conselho da Fundação Cartier, em Paris, entre outros museus de peso no mundo. O americano também viaja ao Brasil desde os anos 1990 e trabalhou ao lado de Paulo Herkenhoff no MoMA, em Nova York, onde organizou uma série de mostras de artistas brasileiros, além de comprar obras do país para o acervo.

    "Quando visitei o ateliê do Hélio Oiticica pela primeira vez, havia dúzias desses", diz Storr, diante de um "Metaesquema", as famosas pinturas geométricas do neoconcretista. "Podia ter comprado um desses por nada na época."

    Essa atração física pelas obras parece orientar suas escolhas. E revela forte afinidade com o gosto do colecionador. Algumas salas, em especial as do térreo, onde estão as obras mais históricas, dariam inveja a qualquer museu.

    Divulgação
    ‘Autorretrato com rubens’, de Albano Afonso, agora no instituto Tomie Ohtake
    "‘Autorretrato com Rubens"’, de Albano Afonso, agora no Instituto Tomie Ohtake

    Uma delas tem Oiticica, Lygia Clark, Willys de Castro e Sergio Camargo. Outra, que Storr chama de "sala cósmica", tem Carmela Gross em diálogo com artistas mais jovens, como Daniel Steegmann-Mangrané e André Komatsu. No andar de cima, um desfile que beira a ostentação, com Tunga, Cildo Meireles, Jac Leirner, Waltercio Caldas, Ernesto Neto, José Resende e Anna Maria Maiolino.

    "Levou muito tempo para que esses nomes se tornassem tão grandes, mas essa já é uma realidade", diz Storr. "Há muito trabalho ainda a ser feito porque a elite da crítica de arte no mundo é muito mal educada, e muitas vezes só segue as modas que surgem."

    Sufocados pela crise, aliás, museus do país também seguem a moda de expor acervos particulares. Além do Tomie Ohtake, a Pinacoteca tem agora duas mostras de coleções privadas, da alemã Helga de Alvear e de Roger Wright. O MuBE vai mostrar em breve a coleção de João Figueiredo Ferraz e o Masp e já recebeu o acervo de Sylvio Perlstein.

    Tendências à parte, a vinda à tona dessas coleções acaba revelando lacunas nas coleções públicas, ajudando, mesmo que por pouco tempo, a formar olhares não acostumados com obras desse calibre, em grande parte guardadas em depósitos de mansões.

    Storr ainda acredita que esforços como esse podem mudar a forma de narrar a história da arte, apostando que a tal elite da crítica que vem agora ao país por causa da Bienal de São Paulo possa descobrir novos nomes na sua mostra.

    "Os curadores são como tubarões, precisam seguir nadando e mastigando para não atrofiar as mandíbulas", diz. "Não sou uma estrela ou guru. Sou um tubarão manso."

    OS MUITOS E O UM
    QUANDO abre neste sábado (3), às 11h; de ter. a dom., das 11h às 20h; até 23/10
    ONDE Instituto Tomie Ohtake, r. Coropés, 88, tel. 2245-1900
    QUANTO grátis

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