Contrariando as expectativas, o filme "Pequeno Segredo", dirigido por David Schurmann, desbancou "Aquarius", de Kleber Mendonça Filho, e irá representar o Brasil no Oscar.
O anúncio foi feito na tarde desta segunda (12), na Cinemateca, em São Paulo.
O produtor gaúcho Beto Rodrigues, membro da comissão instituída pelo Ministério da Cultura, foi quem anunciou o escolhido. Segundo ele, o comitê avaliou dois critérios para eleger "Pequeno Segredo": qualidade técnica e artística, e adequação ao "pensamento da Academia".
O representante brasileiro agora vai disputar por uma das cinco vagas na categoria com longas de outros países. A Alemanha, por exemplo, indicou a comédia "Toni Erdmann", de Maren Ade, que foi elogiadíssima em Cannes. Já "Julieta", de Pedro Almodóvar, foi escolhido como o representante da Espanha.
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Mariana Goulart e Júlia Lemmertz em cena de 'O Pequeno Segredo' |
A Academia divulgará os cinco escolhidos na categoria no dia 24 de janeiro de 2017. A cerimônia está marcada para 26 de fevereiro.
Inspirado na irmã adotiva do cineasta, Kat Schurmann, portadora do vírus HIV e morta em 2006, "Pequeno Segredo" narra história de uma órfã e três mulheres que compartilham um segredo que entrelaça as tramas isoladas em torno do destino da garota.
O filme, que conta com Julia Lemmertz e Maria Flor no elenco, disputou a vaga com outros 15 títulos, incluindo "Aquarius", de Kleber Mendonça Filho, que era apontado como o favorito.
Era esperado que Alfredo Bertini, secretário do Audiovisual, fizesse o anúncio, mas tanto ele e quanto o cineasta Bruno Barreto, presidente da comissão, deixaram a Cinemateca um pouco antes.
POLÊMICA
A derrota de "Aquarius" para "Pequeno Segredo" agora deve reforçar as críticas que já existem no meio cinematográfico de que o filme de Kleber está sofrendo retaliações do governo Temer. Isso porque o longa estreou em Cannes, em maio, sob um ruidoso ato anti-impeachment encampado pela equipe do filme.
A própria composição do comitê que escolheu o representante brasileiro nasceu sob polêmica, conforme antecipado pela Folha. Instituída pelo Ministério da Cultura, a comissão teve entre seus nove membros o crítico Marcos Petrucelli, que já usou seus perfis em redes sociais para depreciar o protesto feito por Kleber em Cannes.
Conforme aumentou a controvérsia, dois integrantes do comitê –o diretor Guilherme Fiúza Zenha e a atriz Ingra Lyberato– deixaram o posto e foram substituídos pelos cineastas Bruno Barreto e Carla Camurati. E três diretores desistiram de inscrever seus filmes em apoio ao longa de Kleber: Aly Muritiba ("Para Minha Amada Morta"), Anna Muylaert ("Mãe Só Há Uma") e Gabriel Mascaro ("Boi Neon").
Petrucelli disse que sua contrariedade se limita às posições políticas do diretor e que isso não iria afetar seu julgamento na comissão. Outros membros também negaram partidarização.
À Folha Petrucelli disse que "Aquarius" foi muito discutido na reunião, mas ele lembrou que o perfil dos membros da Academia tende a ser "mais velho, mais conservador".
Alfredo Bertini, que chancelou os nomes da comissão, disse que a polêmica é infundada e que o processo de escolha de Petrucelli seguiu os trâmites normais e teve "transparência absoluta".
REPERCUSSÃO
Parte do meio cinematográfico não reagiu bem ao anúncio de que "Pequeno Segredo" destronou "Aquarius".
"Foi um ataque a todo mundo que trabalha com cinema", diz a diretora Anna Muylaert à Folha. "O perfil de filmes que a Academia escolhe é o dos que têm impacto mundial: sucesso no país de origem e lá fora. 'Aquarius' teve isso."
A produtora Vania Catani concorda. "A gente ainda não conhece 'Pequeno Segredo', que pode até ser genial, mas ninguém ainda viu", diz ela, que já teve um de seus filmes ("O Palhaço") indicado para representar o Brasil no Oscar, em 2011, e que também já foi integrante do comitê, no ano seguinte.
"Quando estive na comissão, vi o quanto a trajetória de um filme influencia na decisão. Não ter trajetória é algo que desfavorece."