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    Em peça, catalã desconstrói beleza de jovens e questiona a origem do mal

    MARIA LUÍSA BARSANELLI
    ENVIADA ESPECIAL A SANTOS

    16/09/2016 02h15

    Angélica Liddell está habituada a polêmicas. Em 2014, sua performance "Eu Não Sou Bonita" foi interrompida por ativistas na MITsp - Mostra Internacional de Teatro de São Paulo, pelo uso de um cavalo em cena. Na Itália, recebeu protestos de católicos por seu "Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios", em que questiona preceitos da religião.

    "Meu objetivo não é o escândalo, mas alterar a sensibilidade do público até levá-lo à emoção", diz à Folha a atriz, dramaturga e diretora catalã, 50, um dos expoentes do teatro espanhol hoje.

    É também no caminho de provocar o espectador que Liddell conduz "O que Farei Eu com Esta Espada? (Aproximação à Lei e ao Problema da Beleza)". Após sessões no festival Mirada, em Santos, a peça terá duas apresentações em São Paulo a partir deste sábado (17).

    O espetáculo parte de dois casos de violência: o do japonês Issei Sagawa, que em 1981 esquartejou a namorada e disse tê-lo feito por amor; e o ataque terrorista a Paris em 13 de novembro de 2015.

    Em quatro horas e meia de peça (com dois intervalos), Liddell questiona a origem do mal –nascido de uma "necessidade brutal de amor", segundo ela. E o faz transformando a violência real no que chama "violência estética".

    "Como civis, devemos resistir à barbárie, mas em nós há uma violência natural e que só podemos acessar por meio da poesia", diz a diretora. "Só o sublime pode nos colocar em contato com essa angústia diante do indescritível."

    Em cena, Liddell é responsável pelos momentos mais verborrágicos: debate o prazer, a repressão, o ódio, o fanatismo, conta sua experiência em estar em Paris durante os ataques terroristas, cita Nietzsche, fala de misticismo.

    Ela alterna suas divagações com instantes performáticos. Cria imagens que sugerem referências a gravuras japonesas e ao Renascimento italiano. Mescla em cena atores nipônicos, que emulam rituais orientais, e oito jovens loiras de beleza clássica, desnudas durante quase todo o espetáculo.

    Liddell concentra nessas jovens seu questionamento sobre o tal "problema da beleza". "Existe uma espécie de ditadura estética, ou melhor, antiestética", afirma. "O materialismo estrangulou a alma, a necessidade de beleza que acompanha o homem desde tempos imemoriais."

    Para tanto, a diretora desconstrói a beleza das atrizes. Elas, que adentram o palco como figuras alvas de um quadro renascentista, em determinada cena começam a se contorcer, a se descabelar. Como num ritual grotesco, esfregam peças de polvo por seus corpos e usam a carne do animal ora como flagelo, ora como instrumento erótico, simulando masturbações.

    Cria-se ali um paralelo entre beleza, erotismo e morte. "É a tríade que sustenta a transgressão", explica Liddell.

    A jornalista MARIA LUÍSA BARSANELLI viajou a convite do festival Mirada

    O QUE FAREI EU COM ESTA ESPADA?
    QUANDO sáb. (17) e dom. (18), às 18h
    ONDE Sesc Pinheiros, r. Paes Leme, 195, tel. (11) 3095-9400
    QUANTO R$ 12 a R$ 40
    CLASSIFICAÇÃO 18 anos

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