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    Crítica

    Personificação sonora é a força de orquestra alemã

    SIDNEY MOLINA
    CRÍTICO DA FOLHA

    29/09/2016 02h22

    Richard Strauss (1864-1949) amadureceu as sutilezas na caracterização das personagens de suas óperas –um exemplo é "Elektra" (1909), programada pelo Theatro Municipal para o próximo mês– em poemas sinfônicos como "Don Quixote" (1897).

    Com regência de seu titular, Kent Nagano, a Orquestra Filarmônica de Hamburgo abriu com a obra o concerto, na Sala São Paulo, de segunda (26), parte da ótima temporada internacional Cultura Artística neste ano.

    Felix Broede/Divulgação
    Kent Nagano rege a Orquestra Filarmônica de Hamburgo na Sala São Paulo_por Felix Broede_MG_1001
    Kent Nagano, regente-titular da Orquestra Filarmônica de Hamburgo

    Na esteira do que ocorre nas óperas maduras de Richard Wagner (1813-83), Strauss concebe "motivos condutores" que, ao mesmo tempo, individualizam e acompanham as transformações de seus personagens.

    No poema sinfônico, entretanto, não há texto nem teatro; as personagens são apenas as figuras sonoras, as notas de uma sinfonia que tenta em si abarcar a literatura.

    Por isso, conhecer o célebre romance de Miguel de Cervantes (1547-1616) pode adicionar sentidos à composição que, aqui, narra apenas as aventuras de um violoncelo solista, uma viola, um bombardino, um oboé, e as inúmeras combinações instrumentais de um obsessivo motivo cromático interrompido por um salto de sexta.

    A perfeição dessas combinações, ressaltada por Gautier Capuçon no cello e por Naomi Seiler (violista da orquestra) foi o ponto alto da regência de Nagano, que já havia feito na capital paulista um concerto memorável com a Sinfônica de Montreal em 2013.

    SONORIDADE

    O fato de a Filarmônica de Hamburgo ser também uma orquestra de ópera fortalece os elos de caracterização e condução da narrativa.

    A sonoridade, por outro lado, pareceu às vezes um pouco abafada, como se faltasse brilho às cordas.

    A segunda parte foi dedicada à "Sinfonia n. 1" de Johannes Brahms (1833-1897), um ilustre nativo da cidade de Hamburgo, cinco anos mais jovem do que a própria orquestra.

    A "Primeira Sinfonia" é uma obra longa, complexa e muito conhecida.

    Nagano fez o que fazem alguns dos melhores regentes: ressaltou as linhas internas (tão trabalhadas pelo compositor), o contraponto inversível, a cor das violas na textura e, principalmente, a conexão entre motivos ao longo dos movimentos –como os ecos da introdução do início no coral do finale.

    Mas, mais uma vez, a sonoridade não chegava ao público com a espessura esperada. Seria falta de passagem de som no local? Teriam estranhado a sala?

    O fato é que a projeção sonora tem os seus segredos, e são eles que tornam a experiência de ouvir a música ao vivo –ainda hoje– única e insubstituível.

    Orquestra Filarmônica de Hamburgo

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