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    Neil Young faz o melhor show e vira a zebra do festival Desert Trip

    THALES DE MENEZES
    DE ENVIADO ESPECIAL A INDIO (EUA)

    11/10/2016 02h10

    Usando o jargão futebolístico, deu zebra no primeiro fim de semana do megafestival Desert Trip, que reúne lendas do rock para shows em uma superestrutura montada na cidadezinha de Indio, na Califórnia (EUA). Na verdade, deu zebra e deu porco.

    A zebra foi o cantor canadense Neil Young, 70. Na teoria, ele é o menos badalado entre os artistas escalados. Não tem os mesmos números de vendagem de discos ou de popularidade que exibem seus colegas de evento –Bob Dylan, Rolling Stones, Paul McCartney, The Who e Roger Waters, do Pink Floyd.

    Mas, no sábado (8), abrindo a noite para McCartney, ele fez o show mais empolgante de todos. Não é uma questão de avaliação pessoal do repórter, mas a constatação da reação incrível da plateia. Com voz poderosa, Young iniciou sua apresentação com baladas e, aos poucos, migrou para os cortes mais acelerados.

    Mario Anzuoni/Reuters
    Paul McCartney chamou Neil Young ao palco e acabou ofuscado no Desert Trip, no sábado
    Paul McCartney chamou Neil Young ao palco e acabou ofuscado no Desert Trip, no sábado

    A força de sua poesia bateu firme na plateia. Durante a balada "Harvest Moon", as pessoas choravam sem o menor constrangimento. Esses mesmos senhores maduros, alguns minutos depois, enlouqueceriam com o peso da parte final do show, em que Young se exibiu como o tremendo guitarrista que é.

    Na última, "Rockin' in the Free World", levantar das cadeiras não foi suficiente para o público. Muitos subiram em cima delas para pular e berrar, diante de seguranças que não tiveram o que fazer a não ser deixar o rock rolar.

    Não acabou ali o protagonismo do cantor canadense na noite de sábado. Paul McCartney fez seu habitual show de sucessos, agradando em cheio a plateia de 70 mil pessoas, lotação total no Empire Polo Club. Mas teve seu momento mais descontraído no palco quando chamou Young para um dueto.

    Os dois emendaram as músicas "A Day in the Life", dos Beatles, com "Give Peace a Chance", de John Lennon. Depois, mais uma dos Beatles, "Why Don't We Do It in the Road?".

    Foi uma noite muito mais surpreendente do que a anterior, na qual Bob Dylan e Rolling Stones se deram bem, mas com níveis muito diferentes de satisfação do público.

    O cantor fanhoso foi mais aplaudido pelo que representa na história do rock do que pelo que mostrou no palco. Sua voz rouca está realmente bizarra. Parece que ele comeu cascalho com caco de vidro no café da manhã.

    Mas Dylan acertou ao privilegiar clássicos autorais, deixando de mostrar as versões para músicas de Frank Sinatra que pontuam sua turnê atual.

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    Desérticas

    Grande Jimi - Morto há 46 anos, o guitarrista Jimi Hendrix esteve "presente" nos três dias do festival. Mick Jagger, Paul McCartney e Pete Townshend contaram histórias sobre ele

    Hillary 84% - Se depender dos roqueiros, Donald Trump já era. Mesmo antes do show de Roger Waters, pesquisa no Desert Trip apontou Hillary Clinton com 84% das intenções de voto

    NY vende tudo - Depois do show de Neil Young, as lojinhas amanheceram no domingo sem nenhum item dele. Camisetas, bonés, jaquetas, tudo esgotado. Já dos outros participantes, ainda tinha de tudo

    Superfã - Paul McCartney praticamente tietou os colegas. Ele assistiu a todos os shows do festival, do começo ao fim. Inclusive o de Neil Young, que terminou uma hora antes do dele começar

    Pódio - Pela ordem, as três músicas que mais empolgaram a plateia foram "Rockin' in the Free World" (Neil Young), "Pigs" (Roger Waters) e "(I Can't Get No) Satisfaction" (Rolling Stones)

    Amarelão - Eddie Vedder, do Pearl Jam, foi convidado a participar dos shows por Neil Young, Paul McCartney e Pete Townshend. Em entrevista a uma rádio local, ele disse que não teve coragem

    Nunca mais? - Os organizadores insistem em tratar o Desert Trip como um evento único na vida. E negam boatos de negociações para trazer Bruce Springsteen e Paul Simon a uma próxima edição, em 2017

    Público - Com 70 mil ingressos diários esgotados, o festival chegou a 210 mil entradas no fim de semana, mas só 130 mil pessoas diferentes estiveram lá, porque 40 mil delas vieram todos os dias

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    COME TOGETHER

    Já os Stones desempenharam mais uma vez o maior espetáculo da Terra roqueira, conhecido dos brasileiros depois de sua turnê pelo país no início do ano.

    A maior surpresa no repertório foi a banda ter feito um cover dos Beatles. A escolhida foi "Come Together", de 1969. Muita gente não entendeu, mas todo mundo amou.

    No domingo (9), duas instituições do rock inglês deram as caras. Foi pura nostalgia o show de Roger Daltrey, 72, e Pete Townshend, 71, a metade ainda viva do grupo The Who.

    Entre canções das óperas-rock "Tommy" e "Quadrophenia" e singles de sucesso dos anos 1960, a banda fez um show alucinante.

    As canções são tão boas que fica fácil esquecer ou perdoar o fato de que o Who não produz nada relevante desde pelo menos 1982, envolvido agora apenas em turnês para lembrar seus clássicos. O show é uma paulada, mas é apenas nostalgia.

    Foi na apresentação de encerramento do primeiro fim de semana que o porco finalmente voou.

    Roger Waters faz atualmente uma turnê em que se dedica a retomar músicas de sua antiga banda, o monstro sagrado Pink Floyd. Como em todas as grandes produções que leva para a estrada, a alta tecnologia impera.

    Ele toca com sua banda de jovens músicos no palco, mas a atenção fica toda para os telões, com incríveis animações, efeitos visuais e imagens psicodélicas.

    O show foi um tanto irregular, com grandes sucessos tocando o coração das pessoas, enquanto algumas canções se alongaram demais, meio arrastadas.

    Passadas duas horas de um show de quase três, veio a canção extremamente agressiva contra o fascismo, "Pigs", do álbum "Animals" (1977).

    Os telões foram dominados então por imagens grotescas do Donald Trump, candidato republicano na corrida presidencial americana e desafeto declarado de Waters.

    O público enlouqueceu, mais ainda quando um enorme balão plástico no formato de um porco, com o rosto de Trump desenhado um dos lados, flutuou por cima da plateia. Quando chegou bem próximo ao palco, os telões exibiram, em letras colossais, a frase "Trump is a pig" (Trump é um porco).

    Os fãs ficaram então entregues ao grupo final de músicas. Emblematicamente, um festival que celebra a história do rock, terminou a noite com uma das mais belas canções que o gênero produziu: "Comfortably Numb", do álbum "The Wall", de 1979.

    Os mesmos roqueiros setentões repetem seus shows no próximo fim de semana, entre os dias 14 e 16, seguindo a escalação diária da primeira semana.

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