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    Em monólogo em cartaz em SP, atriz travesti interpreta Jesus transexual

    MARIA LUÍSA BARSANELLI
    DE SÃO PAULO

    14/10/2016 02h15

    Quando decidiu montar no Brasil "O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu", em cartaz em São Paulo, a diretora Natalia Mallo colocou um enxuto anúncio em seu Facebook: "Procura-se atriz trans". É um texto, diz ela, feito "para aquilo que está no corpo de uma atriz transgênero".

    O monólogo escrito pela inglesa Jo Clifford, 66, recria a história de Jesus como uma transexual. A dramaturga, ela mesma trans e cristã, escreveu a peça como forma de lidar com sua religião quando já deixara de ser John –decidiu mudar de sexo há dez anos.

    Não se trata de uma crítica à igreja, mas de um discurso sobre a aceitação, explicou a autora à Folha em maio, quando esteve no Brasil para encenar sua versão da peça no Festival Internacional de Teatro de Belo Horizonte.

    "Ela defende a tese de que não dá para excluir ninguém", diz Mallo. A diretora assistiu à montagem de Clifford em 2014, na Escócia. Na mesma noite, pediu à dramaturga o texto e começou a traduzi-lo no quarto do hotel.

    O anúncio de Mallo na internet em busca de uma intérprete brasileira rendeu 50 e-mails de resposta. Dali, a diretora chegou à santista Renata Carvalho, 35, atriz e ativista que se classifica como travesti. "As pessoas ficam com vergonha da palavra 'travesti' e usam 'transexual' porque acham mais aceito. Quero quebrar esse estigma em cima de 'travesti'", explica a atriz.

    Seu ativismo é visto na versão brasileira da peça, que resgata um mundo underground das ruas e da travesti que vive à margem. A tradução também brinca com os gêneros. Quando Carvalho se dirige à plateia, por exemplo, diz "todas vocês", ainda que haja homens entre os espectadores.

    Mas a temática, como ocorreu com Clifford em sua estreia em Glasgow, há sete anos, causou certo rebuliço entre alguns cristãos.

    "Evangelho" fez suas primeiras sessões no Filo - Festival Internacional de Londrina, no fim de agosto. As apresentações aconteceriam numa capela ecumênica, mas tiveram de ser transferidas após protesto de religiosos.

    "O estigma é tão grande em cima de uma travesti e de um transexual que as pessoas deduzem que o projeto é tirando sarro, quando na verdade é uma peça completamente pró-cristãos", afirma Mallo.

    A polêmica acabou por levar mais público à peça, que abrigou o dobro (200) de espectadores previstos inicialmente. Atriz e diretora contam ainda terem recebido respostas positivas de cristãos e líderes religiosos que assistiram à montagem.

    O EVANGELHO SEGUNDO JESUS, RAINHA DO CÉU
    QUANDO qui. a sáb., às 20h30; até 5/11
    ONDE Sesc Pinheiros, r. Paes Leme, 195, tel. (11) 3095-9400
    QUANTO R$ 7,50 a R$ 25
    CLASSIFICAÇÃO 18 anos

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