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    Netflix estreia '3%', sua primeira série brasileira estimada em R$ 10 milhões

    GABRIELA SÁ PESSOA
    DE SÃO PAULO

    20/11/2016 02h00

    O futuro do Brasil, segundo a Netflix, é tenebroso. Em "3%", sua primeira série produzida no país, o que restará são apenas escombros das grandes cidades.

    Dirigida por César Charlone –de "O Banheiro do Papa" e diretor de fotografia de "Cidade de Deus"–, a primeira temporada, de oito episódios, entra no ar no mundo inteiro nesta sexta-feira (25).

    Essa história, porém, começou em 2009, quando o estudante de cinema da USP Pedro Aguilera, então com 20 anos, leu os clássicos "Admirável Mundo Novo" (1932), de Aldous Huxley, e "1984" (1949), de George Orwell.

    Aguilera quis ligar a atmosfera totalitária da literatura distópica com a angústia juvenil. A sacada foi usar os processos seletivos que ele próprio passava nessa fase da vida: vestibular, primeiro emprego etc.

    Com os colegas Dani Libardi, Daina Giannecchini, Ivan Nakamura e Jotagá Crema, criou uma piloto sobre uma terra arrasada, onde os habitantes têm uma única chance na vida de escapar para uma espécie de paraíso. E adivinhe quantos passam na seleção? 3% da população.

    A turma da USP sabe do que está falando: eles próprios foram reprovados quando submeteram "3%" em um edital do Ministério da Cultura em 2010.

    Mas ali conheceram o produtor Tiago Mello, que comprou a ideia e, cinco anos depois, emplacou a série na Netflix –não sem antes amargarem rejeições em uma série de canais pagos (97% deles?).

    Foi nesse momento que a Netflix, com intenção de produzir no Brasil, se deparou com a versão amadora de "3%", que fazia certo sucesso no YouTube.

    Segundo Erik Barmack (vice-presidente de conteúdo original internacional da Netflix), a empresa sabia que os brasileiros gostavam de ficção científica e fantasia.

    "O que não significava que íamos encomendar algo desse gênero. Mas quando essa história chegou até nós, essas informações nos deram o conforto de que seria a decisão certa", afirmou em março, em uma conferência para o mercado audiovisual no Rio de Janeiro.

    Os criadores não podem falar em valores. A Folha apurou que o orçamento da série está na casa dos R$ 10 milhões, valor compatível com a realidade do audiovisual nacional.

    Comparando, estima-se que a Netflix gaste 20 vezes mais em uma temporada da inglesa "The Crown".

    MERITOCRACIA

    Ao desenvolver o roteiro, os criadores não esperavam estrear em um momento de crise. Ver na tela um Brasil apocalíptico, arrasado por alguma tragédia (não explicada no roteiro) e onde o discurso da meritocracia anula as regras num vale-tudo entre os competidores, pode até soar como niilismo.

    Para o diretor Charlone, porém, é o contrário: "Todas essas distopias têm um fundo semelhante: o futuro é uma merda, mas a promessa do que virá é maravilhosa".

    A história apresenta a seleção na qual 3% serão vitoriosos ao mesmo tempo em que abre um flanco revolucionário, que se fortalece no 104º ano do "processo".

    Um grupo tenta infiltrar um jovem na seleção para aniquilar a estrutura totalitária. O mistério sobre quem é esse agente é uma das principais tramas do primeiro episódio.

    Entre os competidores, o principal nome é o de Bianca Comparato, atriz escalada antes mesmo do diretor. Ela faz a valente e maltrapilha Michele, forte concorrente a deixar o Continente (o país arrasado) e migrar para o Mar Alto (ilha tecnológica, onde nada falta).

    Do lado dos controladores, destaca-se Ezequiel (João Miguel), claramente inspirado no Grande Irmão de Orwell, aparecendo em telas gigantes e vociferando regras.

    Cenários paulistanos podem ser identificados (veja quadro nesta página), mas o trunfo do seriado, nas palavras do produtor, é seu diálogo com um sentimento universal de desesperança.

    "Há uma insatisfação geral no mundo", afirma o produtor Tiago Mello. "Ao mesmo tempo, a série trata de um tema bem brasileiro, a desigualdade."

    Num mundo como o nosso atual, que até parece apocalíptico, diz ele, ficções como "3%" provocam uma espécie de catarse: "Elas nascem num campo simbólico para fazer toda essa violência e injustiça se chocarem na tela".

    NA TV
    3%
    QUANDO primeira temporada completa a partir de sexta (25), na Netflix

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