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    CRÍTICA

    Beleza de 'O Mestre e o Divino' está em encontro multiétnico

    SÉRGIO ALPENDRE
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    22/11/2016 02h18

    "O Mestre e o Divino", de Tiago Campos, mostra o encontro entre o velho missionário alemão Adalbert Heide, que filmou rituais dos índios xavantes desde os anos 1960, e Divino Tserewahú, jovem xavante que se tornou cineasta e também registra imagens de seu povo desde os anos 1990.

    É um encontro multiétnico, mas também um encontro de imagens e, portanto, de olhares. O olhar eurocêntrico, inicialmente interessado no exotismo e em práticas distantes de sua cultura, e o olhar indígena, interno, igualmente parcial porque envolvido demais com os próprios costumes.

    A beleza do filme se dá nesses encontros, nos quais percebemos as diferenças que os unem e separam ao mesmo tempo: de vivência, de modos, de postura com relação à vida e ao trabalho.

    Divulgação
    O cineasta xavante Divino Tserewahú em cena do filme
    O cineasta xavante Divino Tserewahú em cena do filme

    Em dado momento, Adalbert fala que queria muito vir ao Brasil porque aqui é um país grande e com muitos índios para serem convertidos. Como assim? Convertidos por que, em que, por quem?

    Não é possível perceber até que ponto o filme trata de maneira crítica essa frase do missionário alemão, ou se ela está inserida dentro de um contexto que atenua seu significado. Fala-se em evangelização dos índios, segundo decisão do Vaticano, algo que Adalbert parece seguir sem questionar.

    A frase, contudo, entrega uma ideia um tanto perniciosa de que há a necessidade de conversão, que só não depõe contra Adalbert porque vemos o tempo todo sua boa índole em respeito aos índios –o que comporta, porém, algumas queixas (quando ele reclama que a nova geração não quer fazer nada).

    Como entrega o título, o filme não demoniza Adalbert. Vemos uma das sessões que ele faz para os índios, em que ele mostra "Winnetou" (1963), faroeste alemão que narra a forte amizade entre um branco e um índio, traduzindo simultaneamente todas as falas, numa demonstração de generosidade.

    PONTO DE VISTA

    Mas até por ser uma produção do Vídeo nas Aldeias, com produção de Vincent Carelli (que recentemente concluiu, como diretor, o belo "Martírio"), percebemos que o ponto de vista preferencial do filme é o do índio, e o alemão é o outro.

    E o outro, nesse caso, faz um esforço tremendo para se tornar, ele também, um índio. O esforço é tamanho que ele é chamado de xavante pelos próprios xavantes, pois estes entendem que a conversão, no final, foi dele.

    Ao mostrar olhares distintos que se aproximam, o filme fortalece as ideias de inclusão e representatividade, tão valiosas no mundo atual. Mas o faz sem abandonar parâmetros cinematográficos, que tendem a ser esquecidos em muitas produções tidas como inclusivas.

    O MESTRE E O DIVINO
    DIREÇÃO Tiago Campos
    PRODUÇÃO Brasil, 2013, livre
    QUANDO em cartaz

    Edição impressa

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