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    Livro de Amyr Klink revela que medo de trote levou navegador às águas

    NAIEF HADDAD
    DE SÃO PAULO

    26/11/2016 02h29

    Um episódio insólito definiu o rumo que levaria Amyr Klink a se tornar o navegador de maior notoriedade no país e autor de best-sellers.

    Ao passar no vestibular para economia na USP, Klink teimou que não seria vítima do trote, em que teria o desgranhado cabelo raspado.

    Para evitá-lo, chegava com sua moto às 4h da manhã na universidade e pulava uma janela para entrar na FEA (Faculdade de Economia e Administração), escapando assim do corredor polonês formado pelos veteranos.

    Marina Klink/Divulgação
    A construção do Paratii 2, que começou em 1994 e terminou em 2001 ***EXCLUSIVO ILUSTRADA NAO USAR*** ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    A construção do Paratii 2, que começou em 1994 e terminou em 2001

    Em algumas dessas manhãs, ele podia observar, na raia da USP, os treinos de remo, esporte pelo qual se encantou, como conta no recém-lançado "Não Há Tempo a Perder", livro que resulta de depoimento à jornalista Isa Pessoa.

    O técnico de remo respondeu com ceticismo: "Quer remar? Vai correr". Klink teria que gastar muita sola do tênis pelas ruas da Cidade Universitária para entrar no time.

    E foi assim por um, dois, cinco meses ao longo de 1974. Acabou aceito na equipe, da qual guarda amigos até hoje.

    Uma década depois, em 1984, atravessaria o Atlântico em um pequeno barco, sozinho, remando oito horas por dia. Até então, ninguém havia conseguido a proeza.

    A viagem entre Namíbia e Brasil foi registrada em "Cem Dias entre o Céu e o Mar", sua estreia literária de enorme sucesso editorial.

    Divulgação
    Amyr Klink na travessia de cem dias do oceano Atlântico, entre África e Brasil, em 1984 (Arquivo pessoal) ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Amyr Klink na travessia de cem dias do oceano Atlântico, entre África e Brasil, em 1984

    OUTRA ONDA

    Desde então, foram seis livros, incluindo este. Os anteriores eram, sobretudo, relatos de navegações –Klink já foi mais de 40 vezes à Antártica. Agora, esse paulistano de 61 anos viaja por outras águas. Conta, por exemplo, preparativos de travessias.

    "As pessoas ficam fascinadas com as viagens, mas desconhecem que, por trás de cada sucesso, há um caminhão de desastres", diz Klink à Folha.

    Mesmo um planejamento minucioso não está imune aos tais "desastres".

    Ao longo de anos, Klink montou o "dossiê amarelo", um plano detalhado sobre a navegação pelo Atlântico. No entanto, a viagem quase deixou de acontecer devido à resistência do governo sul-africano –antes de chegar à Namíbia, ele teve que passar pela Cidade do Cabo.

    Devido ao fracasso de três tentativas anteriores de cruzar o Atlântico Sul a partir da África, os burocratas do país estavam determinados a não liberá-lo.

    Só cederam depois que Klink assinou uma "declaração em que eu recusava qualquer tipo de socorro, isentando as autoridades sul-africanas de toda responsabilidade em caso de desastre".

    Klink também discorre sobre o exercício da liderança, citando expoentes da navegação que lhe serviram de inspiração, e discute as amarras que travam o desenvolvimento brasileiro. Comenta ainda a vida em família, com sinceridade incomum.

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    Amyr Klink com o pai Jamil, um dos personagens do livro ***EXCLUSIVO ILUSTRADA NAO USAR*** ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Amyr Klink com o pai Jamil, um dos personagens do livro

    O PAI

    Depois de se formar em economia e trabalhar em um banco, Klink se mudou para Paraty a fim de colocar em ordem as terras que o seu pai, Jamil, havia comprado ali muitos anos antes. Passou cinco anos negociando pendências fiscais com a prefeitura da cidade, e seu pai tinha concordado em assinar o documento que regularizaria a situação. Na última hora, contudo, o pai desistiu.

    "Sem entender como ele podia voltar atrás depois de tanto tempo, furioso, transtornado, para não bater nele eu bati na porta. E a porta está quebrada até hoje. No choque, o vidro entrou na minha mão, arrancou um fio de pele e deixou a mão do outro lado", conta Klink no livro.

    Era tamanha a quantidade de sangue que Jamil desmaiou. O pai, que já morreu, e o filho jamais conversaram sobre esse episódio.

    Foram diversas cirurgias para retomar o movimento da mão direita, mas não foi possível reaver a sensibilidade dos dedos, uma limitação que nunca o impediu de navegar.

    Ao ser questionado durante a entrevista sobre a grande viagem ainda sonha fazer, Klink se entusiasma.

    Não Há Tempo A Perder
    Amyr Klink
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    "Nossa, tem várias, várias!", responde o navegador. "Quero muito voltar a viajar pela Amazônia em um barquinho local. E faria isso de maneira quase invisível".

    *

    NÃO HÁ TEMPO A PERDER
    AUTORES Amyr Klink em depoimento a Isa Pessoa
    EDITORA Foz/Tordesilhas
    QUANTO R$ 39,90 (216 págs.)
    LANÇAMENTO 10/12, com exposição de fotos, no MIS, av. Europa, 158, tel. (11) 2117-4777

    Edição impressa

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