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    Crítica

    Jón Stefánsson intercala natureza trágica com a breguice da redenção

    MARCELO MIRISOLA
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    26/11/2016 02h12

    Tudo que existe e/ou desafia o monstroceano servirá de pretexto para que os personagens de Jón Kalman Stefánsson discorram sobre o sentido ou o não sentido da vida, como se rompessem paisagens através de pequenas iluminações filosóficas.

    Trata-se de um romance repleto de correspondências. Os luares nunca serão simples luares, mas forças que desarmam e atiçam a memória; o mesmo vale para montanhas e fiordes de uma Islândia mítica e quase improvável.

    As forças da natureza obrigatoriamente refletem o destino dos homens e são utilizadas como esteio,parêntese e/ou como uma espécie de gancho –ou as três coisas ao mesmo tempo– para que Stefánsson conte sua história.

    Até que o protagonismo da natureza é contrastado por um aprendiz de marinheiro denominado "menino" Bárour,que é seu melhor amigo e leitor atento de "Paraíso Perdido",obra de John Milton.

    Os amigos embarcam num pesqueiro. Absorto pela leitura de Milton, Bárour esquece de vestir seu impermeável e sucumbe ao frio. Na sequência retornamos à terra. Inicia-se a jornada do menino em busca de um velho capitão cego que havia emprestado "Paraíso Perdido" ao amigo e que, em tese, seria o responsável por sua morte.

    "Paraíso Perdido" foi praticamente ditado por Milton, também cego. Eis a aproximação e a alegoria da queda encerradas em si mesmas.

    O problema é a subsequente redenção do menino e a carga de breguice a reboque. A mensagem é clara: a poesia que "matou" Bárour tem o potencial de "salvar" o menino. O que era afogamento e desterro transforma-se em candidez e fofura constrangedoras.

    A primeira parte é Dorival Caymmi, "Suíte dos Pescadores". A tragédia anunciada,o isolamento e a impotência humana são temas recorrentes às epopeias que tratam do afogamento e do fundo do mar como único lastro. A segunda parte –redenção do garoto– é Padre Zezinho.

    *

    PARAÍSO E INFERNO
    AUTOR Jón Kalman Stefánsson
    TRADUÇÃO João Reis
    EDITORA Companhia das Letras
    QUANTO: R$ 44,90 (200 págs.); R$ 30,90 (e-book)

    Edição impressa

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