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    Documentário da A&E acompanha membros e familiares da Ku Klux Klan

    KATHRYN SHATTUCK
    DO "THE NEW YORK TIMES"

    21/12/2016 14h27

    O ambiente é acolhedor e caloroso. "Garotas, temos presentes para vocês", diz Steven Howard, entregando às suas duas filhas pequenos pacotes bem embalados que elas não demoram a rasgar. As câmeras então revelam o conteúdo: os capuzes pontudos do Ku Klux Klan.

    "Estou dando às minhas meninas o meu legado", diz Howard, enquanto as ajuda a colocar os capuzes.

    É uma introdução apavorante a "Generation KKK", um documentário de oito episódios que estreia em 10 de janeiro no canal A&E e acompanha de perto alguns membros importantes do Ku Klux Klan e suas famílias.

    A série também leva o A&E, mais conhecido por séries duradouras como "Acumuladores Compulsivos" e "Intervenção", a águas mais turvas –e politicamente complicadas– do que qualquer programa que ele tenha veiculado antes.

    Para isso, foi necessário encontrar um equilíbrio delicado entre conquistar a confiança dos membros do Klan e garantir que a série não propagasse opiniões que são abominadas pelos executivos do canal. "Certamente não queríamos que a série fosse vista como plataforma para as opiniões do Ku Klux Klan", disse Rob Sharenow, diretor geral do A&E. "A única agenda política é que nos posicionamos claramente contra o ódio".

    Divulgação
    Cena do documentário 'Generation KKK', sobre a Ku Klux Klan
    Cena do documentário 'Generation KKK', sobre a Ku Klux Klan

    "Generation KKK" começou a tomar forma 18 meses atrás –não muito antes do início de uma campanha eleitoral divisiva que firmou o Klan e outros grupos nacionalistas em sua crença de que estão combatendo o genocídio contra os brancos–, quando o documentarista Aengus James enviou equipes de filmagem ao Sul dos Estados Unidos. O objetivo era mostrar a imagem do Ku Klux Klan sem retoques, registrando como operam as suas bases.

    "As disputas que mais nos atraíram foram as disputas internas nas famílias", disse James, produtor executivo da série, cujos créditos anteriores incluem "I Am Jazz", do canal TLC, sobre a adolescente transgênero Jazz Jennings. "Tínhamos uma posição, e deixamos claro ao pessoal que esperávamos que eles vissem a luz e saíssem daquele mundo. É um ambiente incrivelmente destrutivo para qualquer pessoa, quanto mais crianças".

    A série acompanha Howard, Mago Imperial dos Cavaleiros Brancos do Norte do Mississipi; Chris Buckley, Grão Cavaleiro-Falcão dos Cavaleiros Brancos do Norte da Geórgia; e Richard Nichols, Grande Dragão dos Cavaleiros do Império Invisível no Tennessee.

    De acordo com o Southern Poverty Law Center, que pesquisa sobre as leis de combate à pobreza no sul dos Estados Unidos, o número de organizações independentes do Ku Klux Klan nos Estados Unidos (não existe organização central) cresceu de 72 a 190 entre 2014 e 2015. A Liga de Combate à Difamação estima que essas organizações tenham três mil membros, e o Southern Poverty Law Center calcula que os quadros envolvam de 5 a 8 mil pessoas. E a doutrinação dos jovens, dizem membros, é crucial para a sobrevivência do Klan.

    "Estamos todos aqui pela mesma razão: pela preservação de nossa raça e de nosso povo", diz Howard na série, expressando seu sonho de se tornar o próximo David Duke [líder do Ku Klux Klan que apoiou a campanha presidencial de Donald Trump]. "Se não lutarmos essa batalha, nossos filhos não terão futuro".

    Em seu esforço por registrar esse mundo relativamente pouco visto, os documentaristas também incorporaram os ativistas Daryle Lamont Jenkins, Arno Michaelis e Bryon Wilder, que combatem o discurso do ódio, e registraram seus esforços para convencer os membros do Klan a deixar o grupo ou pelo menos a não envolverem seus filhos nas atividades da organização.

    Isso envolveu colocar a mulher de Buckley, Melissa, em contato com Michaelis, antigo militante da supremacia branca que agora trabalha com a Serve 2 Unite, cujo objetivo é agir junto aos jovens a fim de prevenir o extremismo violento. O envolvimento de Buckley com o Klan levou sua mulher a um perigoso confronto com três mulheres negras no Wal-Mart, e ela queria reprimir a imitação por seu filho de cinco anos dos epítetos raciais proferidos pelo pai e do uso de saudações do "poder branco" antes que o menino entrasse na escola.

    "Odeio dizer que cheguei perto de deixá-lo, porque ele é meu melhor amigo, o pai dos meus filhos, e é tudo para mim", ela declarou em entrevista por telefone. "Mas a coisa chegou ao ponto de eu me questionar –se não estou segura com ele, por que estar com ele?"

    Divulgação
    Cena da série documental 'Generation KKK', da A&E
    Cena da série documental 'Generation KKK', da A&E

    Para Buckley, veterano do exército que serviu no Afeganistão e Iraque, o Klan ofereceu um grupo de irmãos semelhante ao que ele encontrou nas forças armadas e um caminho para expressar a raiva que sente por aqueles a quem culpa pela sua precariedade emocional e financeira.

    "As pessoas se envolvem em grupos de ódio porque estão sofrendo", disse Michaelis. "Eu me baseio nessa verdade ao responder com compaixão às suas agressões, e fazê-lo cria uma primeira impressão forte".

    No A&E, que ganhou um Emmy por "Born This Way", um documentários sobre jovens adultos que têm Síndrome de Down, o complicado conteúdo de "Generation KKK" levou a questionamento interno por parte dos executivos. Mas a série parecia se enquadrar bem às novas prioridades de programação do canal.

    Em novembro de 2015, o A&E transmitiu "Shining a Light: A Concert for Progress on Race in America", um show beneficente realizado cinco meses depois que Dylann Roof, ativista da supremacia branca, matou nove pessoas em uma igreja de Charleston, na Carolina do Norte.

    "Acredito, certamente, que o A&E deveria estar iluminando questões que não são observadas usualmente", disse Sharenow. "Não vou dizer que somos uma marca associada a causas. Mas acredito que exista uma mensagem de esperança e uma promessa de redenção em todos esses programas".

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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