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    CRÍTICA

    'Ovono' sabe usar recursos multimídia, mas trama é confusa

    VALMIR SANTOS
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    06/01/2017 02h10

    Leekyung Kim/Divulgação
    Gustavo Vaz em cena da peca 'Ovono', da Kompanhia do Centro da Terra
    Gustavo Vaz em cena da peca 'Ovono', da Kompanhia do Centro da Terra

    Usar recursos multimídia sem perder a aura artesanal do teatro é uma das virtudes que a Kompanhia do Centro da Terra cultiva há 27 anos.

    Para dar asas ao gênero pouco praticado em palcos brasileiros –contraste às aptidões da literatura e do cinema–, o autor e diretor Ricardo Karman concebe em equipe um engenhoso sistema de informações visuais e sonoras sincrônico à presença dos atores.

    Personagens virtuais interagem com os "de carne e osso" em fusões e superposições de linguagens da arte e da ciência. Os efeitos dessa plataforma audiovisual impactam a narrativa que critica o caráter regressivo por trás dos dogmas desenvolvimentistas e tecnológicos. Mas não bastam para sustentar o espetáculo.

    "Ovono" não demonstra a mesma clareza no manejo do texto. A trama é confusa. Aparta a sofisticação técnica da capacidade de enredar. A tela inflável e transparente que ocupa quase todo o palco e sobre ela incidem animações resulta a paradoxal metáfora da bolha dramatúrgica.

    A involução humana como sintoma do progresso a qualquer custo é inspirada numa sequência do filme "Uma Odisseia no Espaço", de Stanley Kubrick. A síntese entre o primata e o astronauta é maximizada no roteiro teatral. O osso lançado pelo macaco ultrapassa a órbita da terra, vaga por milhões de anos, torna-se gigante e está prestes a cair.

    Quem tem a missão de impedir o apocalipse é o personagem-título, supercomputador cuja capacidade de percepção humana leva o cientista que o criou a questionar se a máquina pode ter alma.

    Razão e fé infundem variações em torno de democracia, teocracia, messianismo, filosofia, inteligência artificial, justiça, empreiteiras, uma "presidenta", um ministro de guerra, Adão e Eva, etc.

    Apesar das sensações impregnadas, a experiência não se concretiza. O apetite pelas ideias turva a viagem. Talvez as imagens digam mais sobre a distopia do que o discurso sobre ela.

    OVONO
    QUANDO: SÁB. E SEG., ÀS 20H; DOM., ÀS 19H; ATÉ 30/1
    ONDE: CCBB, R. ÁLVARES PENTEADO, 112, TEL. (11) 3113-3651
    QUANTO: R$ 20; 16 ANOS

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