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    Análise

    Nunca as competições foram tão sofregamente seguidas

    INÁCIO ARAUJO
    CRÍTICO DA FOLHA

    10/01/2017 02h07

    O que de mais notável se pôde observar na cerimônia do Globo de Ouro é como Hollywood tornou-se antes de tudo uma entidade autopromocional. Pode-se argumentar que foi sempre assim. Em parte. Sempre houve ativos e sofisticados departamentos de relações públicas nos estúdios. Mas agora estamos em regime de plena indústria cultural. É diferente.

    Dou uma dica: quantos de nós se importavam, uma década atrás, com o Globo de Ouro? Quantos, aliás, sabiam de sua existência?

    O único boato que circulava a respeito dava conta de que ali havia uma prévia do Oscar. Mas não era o Oscar. De fato, por vezes alguns dos filmes que ganham cá ganham lá. Nem sempre.

    Desde ontem à noite, as ditas redes sociais estão agitadas. O que mudou, concretamente, nos últimos anos: o Globo de Ouro tornou-se uma entidade à parte, seguida com o mesmo desvelo que, em outros tempos, apenas o Oscar merecia.

    Os tempos novos criaram também uma indústria da ansiedade. Nos jogos de futebol, basta um time marcar um gol que o locutor logo emenda: neste instante tal time ganharia o campeonato, tal outro ia para a segunda divisão. Mas se o outro time, no jogo X, marcar um gol, aí muda tudo.

    Me parece, porém, que existe um outro fator: nesta hora de pós-verdade, em que qualquer boato conta mais que o fato, uma coisa prevalece: o resultado.

    Nunca as competições foram tão sofregamente seguidas. Sabemos que o Palmeiras é o campeão brasileiro e que, nas corridas, Usain Bolt é o mais rápido. Só um exame antidoping alteraria isso.

    O mesmo se dá com as competições cinematográficas. Todo ano, o Oscar designa "o melhor filme do ano". Não importa quem são os votantes, as circunstâncias bélicas, políticas ou sociais que envolvem a escolha. Nada.

    Importa que, de alguma forma, exista ali justiça ou injustiça. Torcemos para o filme A, mas deu o filme B. Se torcemos para o filme X e deu o filme X, vibramos: existe uma afirmação pessoal nisso tudo. Como no esporte. Em 2017, "La La Land" quebrou recordes no Globo de Ouro. Fez história, como dizem os locutores esportivos.

    Vai entrar em cartaz com publicidade total voltada para suas conquistas e recordes. Está feito o buzz, embora por aqui quase ninguém ainda tenha visto o filme. Em termos de publicidade massiva, quanto menos a crítica vale, mais vale o critério de autoridade.

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