• Ilustrada

    Tuesday, 07-May-2024 19:22:37 -03

    Oscar

    Roteiro adaptado: Vida dos afro-americanos dominam categoria

    FRANCESCA ANGIOLILLO
    EDITORA-ADJUNTA DE CULTURA

    20/02/2017 12h02

    Retratos da vida dos norte-americanos negros – ou, em ainda mais detalhe, da vida de mulheres negras na aurora da luta pelos direitos civis, ou da de um jovem gay crescendo numa espécie de gueto tropical – predominam na categoria de roteiro adaptado.

    Por decorrência, o tema da tolerância também está nos filmes concorrentes – até mesmo no representante da ficção científica, onde o outro que ameaça pela diferença não é negro, mas vem do espaço.

    A exceção que confirma a regra é "Lion", que cumpre, ao lado de "Estrelas Além do Tempo", a indefectível cota de "histórias verídicas" nesta categoria.

    Jan Thijs/Divulgação
    This image released by Paramount Pictures shows Amy Adams in a scene from "Arrival." (Jan Thijs/Paramount Pictures via AP) ORG XMIT: NYET666
    Amy Adams é Louise Banks, que tem de desvendar um idioma alienígena no filme de Denis Villeneuve

    "A Chegada"
    O escritor americano Ted Chiang, autor do conto "História da Sua Vida", em que se baseia "A Chegada", disse à Folha que a adaptação para o filme "é um milagre". O escritor tem razão. Seu conto é interessante, mas o que o roteiro de Eric Heisserer faz é expandir possibilidades apenas sugeridas pelo texto original. Poderia ser um problema ter um roteirista especializado em filmes de terror como "A Hora do Pesadelo" (2010) a cargo de uma trama bastante intelectualizada em que os alienígenas não são seres terríveis. Mas a maneira como Heisserer injetou no roteiro questões sobre como experimentamos o tempo, apenas delineadas no conto, é delicada e comovente. Mereceria levar, mas a concorrência é braba.

    *

    Divulgação
    This image released by Paramount Pictures shows Denzel Washington, left, and Viola Davis in a scene from, "Fences." Adapting Wilson's masterpiece has taken more than 30 years. Washington, who directed the film and starred on Broadway revival of "Fences" seven years ago, made some key decisions when he was first tapped to translate the play onto celluloid. He reunited five of the main actors; Viola Davis, Stephen McKinley Henderson, Russell Hornsby and Mykelti Williamson. (David Lee/Paramount Pictures via AP) ORG XMIT: NYET204
    Denzel Washington e Viola Davis estão em 'Um Limite Entre Nós', que leva às telas a peça 'Fences'

    "Um Limite Entre Nós"
    Por que, por que este filme concorre na categoria de roteiro adaptado? Simplesmente fica difícil entender em que consistiu a adaptação. O roteiro é literalmente o texto da peça de August Wilson (1945-2005), que leva o crédito da "adaptação". O original de "Fences" (cercas) é um belo texto, que trata da vida dos negros nos EUA, tema de toda a vida de Wilson e que deu ao dramaturgo o Pulitzer e o Tony em 1987. No entanto, não é demais lembrar, filme não é só roteiro, e roteiro não é só texto. No entanto tem grandes chances na corrida, em especial neste ano, em que o Oscar decididamente abraçou a sempre viva, e recentemente mais ainda, questão racial.

    *

    Divulgação
    Estrelas além do tempo [Hidden figures, Estados Unidos, 2016], de Theodore Melfi (Fox). Gênero: drama. Elenco: Taraji P. Henson, Kirsten Dunst, Kevin Costner, Glen Powell. ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM*** Estrelas Além do Tempo
    Janelle Monáe, Taraji P. Henson e Octavia Spencer fazem o trio de calculistas de 'Estrelas Além do Tempo'

    "Estrelas Além do Tempo"
    A trama que conta os percalços e conquistas de três mulheres negras buscando seu lugar na Nasa em plena corrida espacial é o epítome do "filme de roteiro". Sua história é tão envolvente – pois é impossível não torcer para que Katherine Goble Johnson (Taraji P. Henson), Dorothy Vaughan (Octavia Spencer) e Mary Jackson (Janelle Monáe) consigam tudo que desejam e merecem – que é fácil ignorar a forma meio de telefilme. A trama é assim tão cativante porque a adaptação se permitiu liberdades com relação aos dados reais, como já explicitaram Salvador Nogueira e Marcelo Gleiser. Saber fazer condensações de épocas ou personagens para contar a história que se deseja contar é um aspecto essencial num roteiro adaptado. Com esse tema e essa esperteza, deve levar o Oscar.

    *

    Divulgação
    Lion - O filme acompanha Saroo, que se perde da família quando criança, e anos depois, usa a tecnologia para tentar encontrar sua mãe
    O ator Sunny Pawar interpreta o jovem Saroo em 'Lion: Uma Jornada Para Casa'

    "Lion - Uma Jornada para Casa"
    Esta história real feita para fazer você chorar litros é, como afirmou o crítico Ricardo Calil, o típico "filme de Oscar". Luke Davies tinha um material digno da ficção mais inacreditável à mão, mas controlou mal o ritmo da narrativa, no esforço de condensar em duas horas 25 anos da vida de Saroo, desde que se perde na Índia, aos 5, até quando, adulto, vivendo na Austrália, resolve buscar sua família original. No livro original de Saroo Brierley fica claro que ele sempre se esforçou por se lembrar de suas origens –no que foi ajudado pela mãe adotiva, que buscou fazer o menino crescer em meio a referências da cultura indiana e anotou o que ele, sempre preocupado em não se esquecer, lhe contava. Esse aspecto some de forma inexplicável no filme, no qual o desejo por procurar o lar da infância se dá por uma revelação súbita de quão privilegiado ele foi em seu descaminho. Se para o efeito kleenex essa síntese pode ser mais eficaz, para a consistência do personagem é um erro.

    *

    Divulgação
    Moonlight - Sob a luz do luar [Moonlight, Estados Unidos, 2016], de Barry Jenkins (Diamond Films). Gênero: drama. Elenco: Mahershala Ali, Naomi Harris, Janelle Monae ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Ashton Sanders vive Chiron, o personagem principal de "Moonlight", no capítulo da adolescência

    "Moonlight - Sob a Luz do Luar"
    Eis um caso raro de peça que, levada ao cinema, não resulta em teatro filmado. O roteirista é o próprio dramaturgo, o jovem Tarell Alvin McCraney, que escreveu um texto baseado em sua própria vida em meio à comunidade negra de Miami. Sabia que parecia mais um filme do que uma peça e deixou guardado o texto que conta, em três capítulos, a infância solitária, a adolescência conturbada pela descoberta da sexualidade e o início da vida adulta de Little/Chiron/Black. A ausência de maniqueísmo enche a tela com personagens que parecem gente de verdade, fazendo com que o espectador se sinta próximo da história, narrada sem grandes volteios, neste belo filme.

    -

    Veja a lista das outras categorias comentadas por profissionais, críticos e colaboradores da Folha.

    Melhor filme, por Inácio Araujo
    Melhor diretor, por Sergio Alpendre
    Melhor animação, por Sandro Macedo
    Melhor documentário, por Aline Pellegrini
    Melhor documentário de curta-metragem, por Lívia Sampaio
    Melhor roteiro original, por Francesca Angiolillo
    Melhor ator, por Guilherme Genestreti
    Melhor atriz, por Teté Ribeiro
    Melhor ator coadjuvante, por Guilherme Genestreti
    Melhor atriz coadjuvante, por Teté Ribeiro
    Melhor fotografia, por Daigo Oliva
    Melhor montagem, por Matheus Magenta
    Melhor direção de arte, por Guilherme Genestreti
    Melhor trilha sonora, por Alex Kidd
    Melhor canção original, por Giuliana Vallone
    Melhor figurino, por Pedro Diniz
    Melhor maquiagem e penteado, por Anna Virginia Balloussier

    [an error occurred while processing this directive]

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024