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    'Palavras Corrompidas' é ensaio sobre ceticismo e credulidade

    VALMIR SANTOS
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    02/03/2017 02h04

    Leonardo Brant/Divulgação
    O ator Matteo Bonfitto também assina o texto e a direção de "Palavras Corrompidas" *** ****
    O ator, dramaturgo e diretor Matteo Bonfitto na peça 'Palavras Corrompidas'

    "Palavras Corrompidas", o título, escancara a crise de linguagem, mas o faz como pano de fundo para cismas do mundo contemporâneo dos quais tanto se fala, se esgrimi e se dói. O solo permite uma digressão: sua equivalência cênica ao gênero literário do ensaio.

    Tal o ato de escrever colado ao de pensar, o ator Matteo Bonfitto propõe ao espectador uma experiência de trabalho sobre si diante da opacidade e do vazio dos discursos públicos e privados.

    Na acepção do escritor francês Michel de Montaigne, precursor do ensaio, o gênero tem a ver com a capacidade de recuar das certezas e, assim, ampliar pontos de vista para firmar convicção.

    Estudioso do trabalho de ator, Bonfitto ilumina a presunção de verdade como um processo contínuo, e não um fim. O também diretor e dramaturgo cria caminhada "com" imagens, escutas e silêncios.

    No primeiro movimento, a vacuidade da quadra esportiva materializa a tensão "eu e o mundo". Nesse ponto, o jogo de reações com o público pouco acrescenta. Ao contrário da visualidade e da vastidão do espaço familiares aos amantes do esporte e aqui estranháveis.

    A inspirada luz da anunciação do filósofo Francis Bacon abre as portas à dimensão imaterial que pauta o segundo movimento. Migramos para o auditório formalizado pela plateia frontal, tendo uma ilha central povoada de alguns espectadores convidados a sorver a imaginação.

    O domínio do branco sobre objetos, móveis e tecidos traduz a página ou a tela a serem ocupadas no limiar da invenção. Margem para o mote do espetáculo: a carta fictícia que o escritor austríaco Hugo von Hofmannsthal destina a Bacon, em 1902, assinada como Lord Philip Chandos, espécie de "alter ego" que se diz abandonado pelas palavras.

    O solo atualiza o mal-estar, desentorpece a crise e raciocina sobre ceticismo e credulidade. Expõe o sofrimento interior enquanto apuração de sentidos.

    *

    PALAVRAS CORROMPIDAS
    QUANDO: SEX., ÀS 21H30, SÁB., ÀS 19H30, DOM., ÀS 18H30; ATÉ 12/3
    ONDE: SESC IPIRANGA, R. BOM PASTOR, 822, TEL. (11) 3340-2000
    QUANTO: R$ 6 A R$ 20

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