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    Crítica

    Longa 'Waiting for B.' cresce ao abraçar vazio da espera de fãs

    CHICO FELITTI
    DE SÃO PAULO

    02/03/2017 14h26

    Divulgação
    Fãs de Beyonce, que esperaram dois meses em acampamento ao redor do estádio do Morumbi, em cena do documentário
    Fãs de Beyonce, que esperaram dois meses em acampamento ao redor do estádio do Morumbi, em cena do documentário

    "Paris Is Burning", documentário sobre a cena dos bailes LGBT da Nova York do fim da década de 1980, deu um tapão na cara dos EUA ao compor a anatomia de um grupo invisível que vivia na maior cidade do país.

    Uma lógica similar, de jogar luz em uma cena que pode parecer desmerecedora, rege "Waiting for B.", documentário brasileiro que rola um olho curioso sobre o universo dos fãs que esperaram Beyoncé (daí o título) por 60 dias acampando ao redor do estádio do Morumbi.

    Em vez de olhar com escárnio para o grupo, o filme descobre quem são essas pessoas e como funciona a estrutura social dessa tribo que arma suas tendas e vive por dois meses à espera de um show.

    São pessoas. Têm vidas. Empregos -um é colorista do salão do cabeleireiro da ex-presidente Dilma Rousseff, por exemplo. Revezam-se nas tendas, que nunca podem ficar vazias, por mais que não haja mais de duas dúzias de gatos pingados de campana. São humanos tanto quanto eu e você.

    Às vezes até mais. Como a sósia que aceita que nunca vai conhecer sua musa: "Pra encontrar a Beyoncé, você tem que ter câncer ou alguma deficiência", diz, na sua casa de paredes sem reboco. As conversas sobre as vidas, cheias de preconceito racial e homofobia, extrapolam muito as brincadeiras que os ocupantes das barracas fazem entre si. Porque não há mais nada para fazer em oito semanas ali.

    O documentário não tem medo de abraçar esse vazio aparente, que na realidade é cheio de significado. É no marasmo que moram os momentos mais interessantes do filme. Numa cena extenuante, os brasileiros passam horas esperando os dançarinos da cantora americana aparecerem, só pela possibilidade de tirar uma foto. A angústia que se cria pode não ser um centésimo da que sentem esses fanáticos, mas é palpável.

    Um dos poucos conflitos é o da interação dos fãs com as torcidas organizadas que frequentam o estádio enquanto não chega o dia da diva pop tomar seu gramado. Há também o registro formidável de uma drag queen da periferia paulistana de nome Melina McLean confrontando um grupo de homofóbicos que a xinga.

    O documentário peca em um ponto: personagens formidáveis escorrem entre os dedos sem maior exploração, como o fã que vendeu o apartamento para acompanhar os shows brasileiros de Beyoncé, e não sabe onde vai morar depois que seu Carnaval pessoal passar. Talvez fosse o caso de estender os 71 minutos de duração -não é nada para quem esperou por dois meses.

    *

    WAITING FOR B.
    QUANDO: estreia nesta quinta (2)
    PRODUÇÃO: Brasil, 2016, 12 anos
    DIREÇÃO: Abigail Spindel e Paulo Cesar Toledo

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