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    Peça cria ficção a partir de relatórios da Comissão Nacional da Verdade

    MARIA LUÍSA BARSANELLI
    DE SÃO PAULO

    05/03/2017 02h15

    Renato Mangolin/Divulgação
    Cena da peça 'O Corpo que o Rio Levou', da LABTD - Laboratório de Técnica Dramática
    Cena da peça 'O Corpo que o Rio Levou', da LABTD - Laboratório de Técnica Dramática

    Em meados de 2014, quando já se percebia uma polarização política no país e surgiam grupos que reivindicavam uma nova intervenção militar no Brasil, a companhia LABTD - Laboratório de Técnica Dramática se voltou a pesquisas sobre a ditadura brasileira.

    Mergulhou em leituras dos relatórios da Comissão Nacional da Verdade e retirou dali o material documental que compõe "O Corpo que o Rio Levou", peça que o grupo estreia neste fim de semana.

    Uma história em especial guiou a narrativa: a de um tesoureiro da Caixa Federal que facilitou a entrada de guerrilheiros numa ação em um banco no Distrito Federal em 1971. Mais tarde foi chamado a depor (ainda que não tivesse informações), depois torturado e morto. A versão contada à sua mulher foi a de que sofrera um acidente de trânsito.

    A dramaturgia de Ave Terrena criou uma ficção a partir dos documentos reais. Se passa num futuro próximo (2020) e conta a história de Elza, atriz em início de carreira preocupada em conseguir um papel em "Ofélica Latina", versão de "Hamlet" encenada por um diretor americano.

    Ao mesmo tempo, o marido da atriz é convocado a prestar depoimento e, sem que ela saiba, é morto. Enquanto ensaia "Ofélica", Elza segue em busca do cônjuge.

    "A ditadura militar não foi um fenômeno isolado, essas repressões acontecem de tempos e tempos", afirma o diretor Diego Moschkovich. "Quando a gente escolhe colocar a peça no futuro é para dizer há uma chaga aberta no nosso passado, de não ter investigado os crimes. E que esses movimentos [conservadores] agora parecem querer voltar mais uma vez."

    Ave usa em "Corpo" a chamada dramaturgia muralista, conceito criado por Oswald de Andrade e inspirado em pintores mexicanos. A ideia é explorar vários pontos de vista, criar um painel sobre uma mesma realidade.

    Assim, há a história de Elza, a tortura do marido (narrada, ironicamente, como locutores em uma partida de futebol) e "Ofélica", que ganhou um texto próprio, escrito por Ave, inspirado nas obras que Augusto Boal fazia entre o fim dos anos 1960 e o início dos 70, como "As Aventuras de Tio Patinhas".

    A peça dentro da peça, um retrato do Brasil dirigido por um norte-americano, é também uma visão crítica sobre nossa indústria cultural, diz o diretor.

    *

    O CORPO QUE O RIO LEVOU
    QUANDO sex. e sáb., às 21h; dom., às 20h; até 9/4
    ONDE Centro Cultural SP, r. Vergueiro, 1.000, tel. (11) 3397-4002
    QUANTO R$ 20 (dia 10/3: R$ 3)
    CLASSIFICAÇÃO 14 anos

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