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    CRÍTICA

    Com poética versátil, Anne Carson transita entre mundos e línguas

    JORGE HENRIQUE BASTOS
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    04/03/2017 02h00

    Jeff Brown /Divulgação
    Retrato de Anne Carson
    A escritora canadense Anne Carson

    A maneira lacônica que escolheu para se apresentar nos seus livros —"Anne Carson nasceu no Canadá, ganha a vida ensinando grego antigo"—, mostra apenas a ponta do iceberg a revelar algo dessa autora nascida em Toronto, em 1950, que é a rainha e senhora da poesia anglo-saxônica da atualidade.

    O impacto que a sua obra suscita já arrebatou a admiração de figuras como Northrop Frye, Susan Sontag, George Steiner e Harold Bloom.

    É desse último crítico uma das análises mais exaltadas da escritora canadense. No livro "Wallace Stevens - The Poems of Our Climate" (sem tradução no Brasil), em que estuda diversos poetas, Bloom diz categoricamente: "Como sou vinte anos mais velho do que ela, me entristece pensar que deixarei este mundo sem levar comigo toda a obra de uma vida desta poeta singular".

    O elogio explícito não era para menos.

    Professora em várias universidades dos Estados Unidos, como Princeton e Michigan, tradutora da poeta grega Safo, ela entope as salas por onde passa dando conferências ou fazendo leituras meio performáticas, conquista audiências e agora se acerca dos leitores brasileiros.

    Sua obra poética versátil, transita entre mundos e línguas, contrabalanceia a tradição helênica e a modernidade. A espessura vanguardista do seu discurso está cromada na armadura sólida da formação clássica que atravessa sua poesia de modo intermitente.

    Carson forja uma artilharia poética composta pelo amálgama de atributos como a prosa poética, o timbre fragmentário, a coloquialidade reflexiva, textos operísticos, a tendência ensaística —fundindo em seus versos uma expressividade camaleônica. Ela parece urdir a rede de um gênero inclassificável que resulta numa poesia de intensa marca conceitual.

    É o caso de "O Método Albertine", cuja justaposição de registros nos conduz pela obra de Marcel Proust, nesse caso, a partir da personagem do segundo volume de "Em Busca do Tempo Perdido", descobrindo caminhos pelos meandros da obra máxima do escritor francês. Conforme diz a tradutora, Vilma Arêas, trata-se de um livro sobre "a paixão por outro livro".

    Estruturado em duas partes, a primeira reúne uma série de reflexões sobre Albertine, personagem que o narrador aprisiona no volume "A Prisioneira"; a segunda desenvolve um conjunto de apêndices explicativos.

    Num deles, o "Apêndice 15 (a) sobre adjetivos", resume a "Recherche", capítulo a capítulo, através de adjetivos precisos. Noutro, propõe a aproximação inesperada entre Hitchcock (o filme "Um corpo que cai") e Proust, e o problema da memória e do tempo.

    Detentora de inúmeros prêmios, traduzida em vários idiomas, Anne Carson chega ao país com esse primeiro livro que abre a porta para uma das obras mais estimulantes de língua inglesa.

    JORGE HENRIQUE BASTOS, jornalista, crítico e tradutor, organizou "Poesia Brasileira Contemporânea - dos Modernistas à Atualidade" (Antígona)

    O MÉTODO ALBERTINE
    AUTORA Anne Carson
    TRADUÇÃO Vilma Arêas e Fernando Guimarães
    QUANTO R$ 20, mais frete (48 págs.; vendas somente no site www.edicoesjabuticaba.com.br

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