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    Crítica

    Susanne Kennedy expõe sintomas subcutâneos do indivíduo

    VALMIR SANTOS
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    17/03/2017 02h10

    JU/Ostkreuz/Divulgacao
     Cena da peca Por que o Sr R Enlouqueceu?, da Munchner Kammerspiele, direcao de Susanne Kennedy, que estara na MITsp - Mostra Internacional de Teatro de Sao Paulo 2017 FOTO: JU/Ostkreuz/Divulgacao ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Cena da peca 'Por que o Sr. R. Enlouqueceu?'

    "Uma fronte sem rugas denota insensibilidade", escreve Bertolt Brecht no poema "Aos que Vierem Depois de Nós", tradução de Manoel Bandeira. Compatriota do dramaturgo e teórico alemão, a diretora Susanne Kennedy compõe tal imagem à risca e alarga os horizontes do efeito de distanciamento que Brecht preconiza com vistas ao espectador crítico.

    A hipérbole da máscara de silicone aderida ao rosto dos atores prova o quanto o artifício –instrumental às artes da cena– pode expor os sintomas subcutâneos do indivíduo e seu tempo.

    A neutralidade gestual é inversa ao modo de agir em "Por que o Sr. R. Enlouqueceu", adaptação do filme homônimo de Rainer Werner Fassbinder. O roteiro de 1970 indica o quanto as relações interpessoais exasperam ainda mais quase meio século depois. A fetichização do status social é o que move e mata.

    Temos a família disfuncional e a sociedade não menos. À falta do toque entre o desenhista técnico, sua mulher e filho soma o alheamento dos parentes, vizinhos, colegas de trabalho, médico e professora que se queixa do menino preferir o canto à matemática.

    A operacionalidade técnica não repele sentimentos. O espetáculo é entrecortado pela cena em que R. vai à loja de disco para recordar a canção que o emocionou no início do namoro, quando dançava de rosto coladinho.

    O resgate em conta-gotas afeta. Um alívio algo irônico para o público dependente da deixa linear, estimulado ao abrigo das razões formais aplicadas aos contrassensos narrados.

    Uma das potências da obra trazida pela MITsp é a dramaturgia expandida à arquitetura. Sob luz excepcional, a caixa cênica emoldura plano único transfigurado a cada ato ou vinheta descerrado ou encerrado por uma tela. As presenças e ambientes são animados pela paisagem sonora.

    Ao final, a libertação do gesto humano mostra as mulheres e homens de cabelos brancos da Münchner Kammerspiele encorajados a experimentar outras naturezas do palco.

    POR QUE O SR. R. ENLOUQUECEU?
    QUANDO: hoje (17), às 21h
    ONDE: Sesc Pinheiros, R. Paes Leme, 195, tel. (11) 3095-9400
    QUANTO: R$ 20 (esgotado), 14 anos

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