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    Conhecido por peças sem ensaios, iraniano traz montagens ao Brasil

    MARIA LUÍSA BARSANELLI
    ENVIADA ESPECIAL A CURITIBA

    07/04/2017 02h25

    Lenise Pinheiro/Folhapress
    Debora Bloch (ao centro) apresenta 'Blank' em Curitiba, com Ana Paula Wanheinburg e Matheus Ruggeri
    Debora Bloch (ao centro) apresenta 'Blank' em Curitiba, com Ana Paula Wanheinburg e Matheus Ruggeri

    Não há ensaios nos trabalhos do iraniano Nassim Soleimanpour. É uma forma de manter o "frescor" de suas peças, diz o diretor e dramaturgo. "A vida é a essência do frescor. E na vida não há ensaios. Não há por que viver se temos de ensaiar a vida", explica ele à Folha, por e-mail.

    Em seus espetáculos, os atores só têm contato com o texto quando já estão no palco, diante da plateia. Assim, nenhum intérprete pode fazer a peça mais de uma vez.

    "É uma pena que eu não possa repetir esse texto. No primeiro terço da peça, eu estava entendendo ela, depois eu estava curtindo", comentou Eduardo Moscovis após atuar na primeira sessão de "Blank" do Festival de Teatro de Curitiba, na sexta (30/3).

    "Acho que a graça é essa. Ele [Soleimanpour] coloca a gente num novo lugar de escuta, no mesmo lugar da plateia", seguiu o ator.

    Depois de Moscovis, vieram Debora Bloch e Caio Blat. Nesta sexta (7), será a vez de Camila Pitanga e, na sequência, Julia Lemmertz e Gregorio Duvivier. A partir de terça (11), o Sesc Vila Mariana, em São Paulo, recebe uma mostra do iraniano.

    CLAUSURA

    "Blank" (2015) é uma sequência de "Coelho Branco, Coelho Vermelho", escrita pelo dramaturgo em 2011, quando ele foi proibido de sair do seu país por se recusar a fazer o serviço militar obrigatório. Decidiu criar uma peça que pudesse circular o mundo sem sua presença e que também replicasse a sua condição de clausura –foi montada no Brasil há quatro anos.

    Em "Coelho", um ator sobe ao palco com suas próprias roupas e com poucos elementos de cena, como uma cadeira e uma escada, providenciados pela produção. Dois dias antes, recebeu algumas instruções: além de não ter lido o texto (ou nada sobre ele), deve seguir à risca o que lê no palco; se disser algo que não está escrito ali, deve deixar claro à plateia.

    Abre o envelope com a dramaturgia só após estar em cena e ali encontra uma sequência de tarefas a cumprir. Os espectadores são encorajados a deixarem celulares ligados, tirarem fotos e mandarem e-mails ao dramaturgo.

    "Blank" nasceu desse contato. Soleimanpour recebeu não só relatos das experiências do público no teatro mas também histórias de vida que lhe chamaram a atenção.

    "Eu havia dividido minha história pessoal com o mundo todo [em "Coelho"] e, como resposta, as pessoas decidiram dividir comigo suas histórias, que me encantaram muito. Por isso achei que deveria criar uma 'máquina de histórias', que nos convide a construir novas tramas todas as noites no teatro", conta o dramaturgo que, hoje, aos 35, vive e trabalha em Berlim.

    O espetáculo segue a mesma técnica do anterior, mas, em vez de tarefas, o ator precisa preencher com ajuda da plateia uma série de lacunas –o "blank" do título.

    Não se trata de um improviso, pois há um texto a seguir. É uma surpresa, diz a atriz Debora Bloch. "A gente vai descobrindo com o público. É uma coisa muito diferente de tudo o que eu já fiz."

    PARADIGMA

    Soleimanpour continua suas experimentações. Em "Blind Hamlet", criou um jogo com a plateia e eliminou os atores de cena. Para o próximo trabalho, "Nassim", o iraniano estará no palco com um novo ator a cada noite.

    "Vou ensaiar a peça com um diretor, como em qualquer espetáculo convencional, enquanto o outro ator não sabe nada, como nas minhas peças anteriores", conta. "Sempre gostei de quebrar o paradigma. E, para isso, é preciso lembrar que todo paradigma que foi quebrado se torna um novo paradigma se você não o quebrar de novo."

    Soleimanpour não fala, em suas peças, sobre o regime iraniano. "Tendo nascido num momento político conturbado de meu país, logo aprendi que obras-primas com frequência lidam com algo além da política efêmera."

    Mas, na mostra no Sesc Vila Mariana, intitulada "Cortina Fechada: Territórios da Arte", o autor participa de um debate sobre censura com os diretores Alexandre Dal Farra e Fernando Kinas.

    "Após trabalhar em vários mercados de teatro no mundo, aprendi que a censura existe em diferentes formas. É o que pretendo discutir."

    A programação em São Paulo conta ainda com oficinas, performances e apresentações de "Coelho Branco, Coelho Vermelho" e "Blank"–sob o título "Em Branco".

    A jornalista viajou a convite do Festival de Teatro de Curitiba.

    *

    SOLEIMANPOUR NO BRASIL

    Em Curitiba
    BLANK
    QUANDO: sex. (7), às 21h, com Camila Pitanga; sáb. (8), às 21h, com Julia Lemmertz; dom. (9), às 19h, com Gregorio Duvivier
    ONDE: Teatro Bom Jesus, r. 24 de Maio, 135, tel. (41) 2105-4034
    QUANTO: R$ 70; 16 anos

    Em São Paulo
    Sesc Vila Mariana, r. Pelotas, 141, tel. (11) 5080-3000; mais informações em www.sescsp.org.br

    COELHO BRANCO, COELHO VERMELHO
    QUANDO: ter. e qui., às 20h30;
    de 11 a 27/4
    QUANTO: R$ 6 a R$ 20; 16 anos

    EM BRANCO
    QUANDO: ter. e qui., às 20h30; de 2/5 a 1º/6
    QUANTO: R$ 6 a R$ 20; 16 anos

    DEBATE SOBRE CENSURA
    QUANDO: qua. (12/4), às 19h30
    QUANTO: grátis; 16 anos

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