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    Filósofo Albert Camus escreveu sobre o samba após visita ao Brasil em 1949

    FERNANDO TADEU MORAES
    DE SÃO PAULO

    17/04/2017 02h20

    A inusitada associação de Albert Camus com o samba vai além do projeto dos músicos Rodrigo Campos, Juçara Marçal e Gui Amabis.

    Visitando o Brasil em 1949, como uma espécie de embaixador cultural da França, o filósofo e escritor teve contato direto com o ritmo -e escreveu sobre isso.

    As impressões estão registradas no livro "Diário de Viagem", em que Camus narra o dia a dia de sua passagem pela América do Norte, em 1946, e pela América do Sul, três anos depois.

    No Brasil, onde passou cerca de dois meses, o francês narra o seu encontro com Dorival Caymmi –grafado no livro como Kaïmi– no Rio.

    Divulgação
    O escritor franco-argelino Albert Camus
    O escritor franco-argelino Albert Camus

    "Depois do jantar, Kaïmi, um negro que compõe e escreve todos os sambas que o país canta, vem cantar com o seu violão. São as canções mais tristes e mais comoventes. O mar e o amor, a saudade da Bahia. Pouco a pouco, todos cantam e vê-se um negro, um deputado, um professor da Faculdade e um tabelião cantarem esses sambas em coro, com uma graça muito natural. Totalmente seduzido".

    Em outro momento, contudo, o filósofo francês se mostra menos entusiasmado com o ritmo símbolo do Brasil. "Noitada decepcionante", anota Camus a propósito de uma gafieira carioca onde foi levado pelo escritor e ativista do movimento negro Abdias do Nascimento.

    Lá, ele se surpreende com a lentidão da dança e aventa uma explicação, "penso no clima". Arrisca alguns passos com uma mulata, sem muito sucesso, porém. "Danço um samba mole, bato os flancos para despertar em mim apetites, e me dou conta, de repente, de que me entedio. Táxi. E volto para casa."

    A julgar por uma trecho de 7 de agosto, entretanto, não há dúvida de que Camus compreendeu algo da potência expressiva do samba com relação à alma brasileira.

    "País em que as estações se confundem umas com as outras; onde a vegetação inextrincável torna-se disforme; onde os sangues misturam-se a tal ponto que a alma perdeu seus limites. (...) é o país da indiferença e da exaltação. Não adianta o arranha-céu, ele ainda não conseguiu vencer o espírito da floresta, a imensidão, a melancolia. São os sambas, os verdadeiros, que exprimem melhor o que quero dizer".

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