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    Obra reúne humor ácido de Belmonte nos 70 anos da morte do cartunista

    DIOGO BERCITO
    DE MADRI

    19/04/2017 02h00

    Belmonte era incômodo o suficiente para, em 1945, ser criticado por Joseph Goebbels. Segundo a imprensa de então, o chefe de propaganda nazista se referiu ao paulistano em uma transmissão de rádio: "Certamente foi pago pelos aliados ingleses e americanos".

    O cartunista havia publicado ao menos 450 ilustrações ridicularizando Adolf Hitler e os nazistas. Ele desenhava na "Folha da Noite" e na "Folha da Manhã", mais tarde unidas num único título, a Folha.

    Décadas depois, porém, seu traço está bastante apagado. Há escasso material de referência sobre sua influência no humor gráfico brasileiro –um espaço que deve ser preenchido com a publicação de "Belmonte" pela Três Estrelas, selo editorial do Grupo Folha.

    O lançamento coincide com os 70 anos de sua morte, ocorrida em 19 de abril de 1947.

    "É inconcebível que Belmonte seja esquecido pela memória da cidade", diz o pesquisador e organizador da obra, Gonçalo Junior, que a considera uma "justiça histórica".

    Divulgação
    O personagem Juca Pato, de Belmonte
    Juca Pato, personagem mais famoso de Belmonte

    A investigação sobre Belmonte começou em 2010, quando conheceu o acervo de Loris Foggiatto, ex-funcionário da gráfica da Folha, que havia morrido aos 96 anos.

    "Ele guardou no porão da casa dele todos os exemplares que imprimiu. Era como se fosse um museu e ia ser jogado fora", diz. Por nove meses, o pesquisador selecionou todas as menções ao cartunista.

    METRÓPOLE

    Primeiro grande cartunista da metrópole, Belmonte amarra, em sua trajetória, a ascensão da imprensa paulistana no início do século 20, na crescente industrialização.

    Ele começou a desenhar para a Folha em 1921. O nome de seu principal personagem, Juca Pato, logo espalhou-se pela cidade: batizou café, bar, cigarro, farda escolar, água sanitária e cavalo de corrida.

    "O personagem era uma entidade, uma espécie de porta-voz da indignação paulistana", diz Gonçalo. A caneta também era afiada contra o presidente Getúlio Vargas (1882-1954).

    Sua acidez teve raro paralelo nas décadas seguintes, como é o caso de Henfil (1944-88) na ditadura militar (1964-85).

    "Era aquele tipo de cara que fazia um cartum sem filtro nenhum, da maneira mais provocativa", diz o pesquisador.

    Em um dos cartuns, Belmonte desenhou o Senado e o Congresso como dois viciados com uma seringa rotulada como "vadiação".

    Nas primeiras décadas do século, o humor gráfico tinha outra importância, antes da popularização dos boletins de rádio e da TV. Ilustrações de Belmonte às vezes ocupavam metade da capa da Folha.

    "Ele fez a diferença na cobertura da Segunda Guerra", diz Gonçalo. "Agências de notícias mandavam informações a todos os jornais, mas a Folha tinha o Belmonte."

    O artista colaborou ainda com as principais revistas de humor da época, como "O Malho" e "Fon-Fon!". E foi um dos primeiros a desenhar personagens de Monteiro Lobato.

    Belmonte afastou-se do jornal após a guerra, sem divulgar o motivo. Mas, como relata Gonçalo, o diário logo percebeu que a marca estava atrelada à do cartunista.

    Em 31 de outubro de 1945, o jornal publicou: "O povo aplaude a volta de Belmonte. Com o festejado caricaturista reapareceu Juca Pato, o cidadão mais popular de São Paulo".

    Belmonte
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    Dois anos depois, vítima de tuberculose, Belmonte morreu. Foi homenageado, à época, com a publicação da última ilustração: Dom Quixote e Sancho Pança ao pôr do sol.

    BELMONTE

    AUTOR Gonçalo Junior (org.)

    EDITORA Três Estrelas

    QUANTO R$ 54,90 (160 págs.)

    Edição impressa

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