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    fronteiras do pensamento

    Com dados novos e método criativo, Piketty balança teoria econômica

    VINICIUS TORRES FREIRE
    COLUNISTA DA FOLHA

    30/04/2017 02h00

    Troche
    Ilustração do artista Troche
    Ilustração do artista Troche

    Em 2014, vários dos melhores economistas do mundo faziam questão de discutir "O Capital no Século 21", o improvável best-seller de Thomas Piketty.

    Um livro denso, de mais de 600 páginas de história e estatística econômicas, tornara-se a obra de não ficção mais vendida da primavera dos Estados Unidos. Aparecia em capas dos jornais.

    Piketty, apesar de laureado, é ainda jovem, à beira dos 46 anos, respeitado mesmo em centros ortodoxos da disciplina (foi professor do MIT ao 22). Por que o tumulto?

    Além de escrever trabalho rigoroso, Piketty sempre quis lançar polêmica com seu livro, que termina com a sugestão de aumento de impostos. Lançada em 2013 na França, a obra não causara rumor fora de círculos acadêmicos e políticos restritos, porém.

    Nos EUA, Piketty entrou no centro da batalha política e intelectual séria sobre desigualdade, mais quente depois da crise de 2008. A disputa fora às ruas em 2011, com o movimento "Occupy Wall Street", por exemplo, um ataque ao "1% mais rico". Desde os anos 1980, a desigualdade cresce nos EUA; os salários medianos estagnaram desde então.

    As pesquisas de Piketty tentam explicar o motivo dessa iniquidade crescente, similar em economias mais ricas, e pensá-la em longo prazo (de 100 a 200 anos). Para tanto, desenvolveu métodos de estudo sobre rendimentos do trabalho e o capital.

    Os números melhores vêm basicamente de duas fontes. Uma delas são pesquisas em que amostra de indivíduos responde a questionários a respeito de quanto ganham, como a Pnad brasileira.

    Esses levantamentos tendem a subestimar rendimentos dos muitos ricos e aqueles não derivados do trabalho. Tal deficiência pode ser sanada por dados das declarações de imposto e patrimônio. Combinar "Pnads" e "IRs" não é simples.

    De posse desses dados, Piketty mostrou a concentração crescente de renda e capital no centésimo ou no milésimo mais rico. A concentração, brutal na virada do século 19 para o 20, caíra entre a Segunda Guerra e os anos 70, para voltar a crescer, na direção daquela dos anos da "Belle Époque": a do capitalismo patrimonial, em que herdeiros vivem de rendas.

    A concentração da riqueza caíra no pós-guerra devido a guerras, inflações e aumento do poder político dos mais pobres. O enfraquecimento dessa tendência popular e uma engrenagem da economia capitalista deram cabo do período mais igualitário.

    O Capital no Século XXI
    Thomas Piketty
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    Piketty acredita ter demonstrado o fator da tendência de aumento da desigualdade de longo prazo. Quando a taxa de retorno do capital supera a taxa de crescimento da economia (do PIB), o rendimento de quem tem patrimônio produtivo (capital) tende a crescer mais rápido do que o aumento dos salários (que não supera o aumento do PIB por períodos longos). Como a propriedade do capital é muito mais concentrada que a do rendimento do trabalho, patrimônio e rendimentos tendem a se concentrar ainda mais.

    Com dados novos e método criativo, mas ortodoxo, Piketty balança a política e modelos da teoria econômica.

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