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    Celebrado neste domingo, jazz resiste há um século e se desfaz de vertentes

    AMANDA NOGUEIRA
    DE SÃO PAULO

    30/04/2017 02h22

    Ao longo de um século desde as primeiras gravações que registraram o jazz, o gênero, celebrado ao redor do mundo neste domingo (30), data instituída pela Unesco, tomou diferentes formas.

    Apadrinhou big bands e trios, vestiu-se de bebop, freejazz, fusion e outros figurinos sonoros. Transcendeu sua origem na comunidade negra norte-americana dos anos 1920, globalizou-se com festivais e foi parar até em samples de rappers do século 21.

    Ele está em todo lugar, mas, afinal, é possível definir o jazz que escutamos hoje?

    "O gênero está mais maduro", diz Clifford Korman, pianista, compositor e professor da Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro). "Nos últimos 20 anos, a linguagem jazzística adquiriu outro tipo de concepção de tempo, ritmo e pulsação."

    "Percebi uma virada muito grande depois da década de 1980. A linguagem se tornou mais ampla, passou a incluir outros gêneros populares, como o pop e o funk, mas de uma maneira sofisticada, com uma métrica madura."

    Divulgação
    O saxofonista americano Kamasi Washington, referência do gênero na atualidade
    O saxofonista americano Kamasi Washington, referência do gênero na atualidade

    Além da assimilação de estilos diversos, Korman aponta ainda para a influência de outras culturas que não a americana, como a absorção de elementos sul-americanos, africanos e orientais.

    A observação é compartilhada pelo crítico musical e colaborador da Folha Carlos Calado, coautor da Coleção Folha Lendas do Jazz.

    Segundo Calado, tenta-se cravar, há pelo menos uma década, o termo "world jazz", que empresta a ideia da world music. "O jazz está em constante transformação", diz. "Músicos de países diferentes conseguem trocar ideias musicalmente porque o jazz virou um idioma mundial."

    O crítico cita como exemplo o saxofonista Rudresh Mahanthappa, que mescla o bebop de Charlie Parker com elementos da música indiana.

    Para Calado, ainda que músicos como o saxofonista Kamasi Washington se destaquem na cena atual com o chamado cosmic jazz, não há uma vertente dominante.

    Isso se explicaria, segundo ele, pela perda da força das gravadoras. "O mercado sempre quer colocar uma embalagem nova para poder vender, mas hoje em dia não há mais a onda do momento."

    O Jazz no Tempo

    "O jazz puro nunca parou de acontecer, mas ele está sendo usado como referência para outros gêneros", diz Dilson Laguna, músico à frente do Comité Jazz Club, de Berlim, onde participava do JazzAhead!, principal fórum europeu sobre o gênero.

    "Kendrick Lamar acabou de lançar um disco de hip-hop que pegou bases e samples do jazz", diz Laguna. Ele também cita o selo Brainfeeder, de Flying Lotus, sobrinho-neto do John Coltrane. "Já ganhou Grammy por misturar elementos de música eletrônica, de hip-hop e cooljazz."

    A definição do jazz mais como uma linguagem do que como um gênero coincide com a ideia de música universal proposta por Hermeto Pascoal. Trata-se de uma sonoridade sem rótulos, guiada por intuição e improvisação.

    "Os americanos são os reis do marketing. Jazz nada mais é do que uma palavra para dizer o que em português chamamos de improvisação", diz Hermeto. Ele reconhece que ritmos caracterizam gêneros, mas, segundo ele, seriam como idiomas da língua musical. O mago garante que convenceu até Miles Davis a chamar o jazz de universal music.

    "A música é como o vento, como as montanhas, como o céu ou as estrelas. Ninguém tem o direito de ter a música, ela é universal", diz Hermeto.

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