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    Análise

    Por dois anos, Candido realizou 'brigada ligeira' na Folha

    NELSON DE SÁ
    DE SÃO PAULO

    12/05/2017 16h18

    Antonio Candido tinha apenas 24 anos ao estrear como crítico da "Folha da Manhã", nome anterior desta Folha, em 7 de janeiro de 1943, meses depois de se formar e passar a dar aulas de ciências sociais, como assistente, na Universidade de São Paulo.

    A manchete daquele dia foi o avanço das tropas inglesas no Egito, na Segunda Guerra.

    Por dois anos inteiros, sempre aos domingos, somando 96 textos, ele escreveu o rodapé "Notas de Crítica Literária", que tomava quase metade da página, geralmente a cinco, uma antes dos editoriais.

    Foi contratado como "crítico titular, um representante do jornal" para o ambiente literário, como ele descreveu depois.

    Indicado pelo amigo Lourival Gomes Machado, crítico de arte, foi antes entrevistado "longamente" por Hermínio Sacchetta, secretário de Redação e militante trotsquista histórico.

    A "Folha da Manhã", um dos cinco maiores diários no país, se destacou a partir daquele início de década por críticos como Mario de Andrade, num momento em que "O Estado de S. Paulo" passou por intervenção do Estado Novo.

    "Sacchetta deu sinal verde. Assim, me tornei aos 24 anos crítico de um jornal importante e me lancei na vida intelectual em larga escala. Assumi o compromisso de fornecer semanalmente um artigo de cinco a seis laudas tamanho ofício a dois espaços, sobre os livros da hora."

    Além do rodapé, de dar aulas e de iniciar a sua tese sobre o crítico literário Silvio Romero, Candido editava com amigos um jornal clandestino, contra a ditadura do Estado Novo: "Quando penso no que fiz nesses anos eu não acredito, sinceramente não acredito."

    Foi um crítico militante, como praticamente todos da época, na imprensa brasileira.

    Contrapunha-se a Álvaro Lins, que fazia o rodapé do maior jornal do país, o "Correio da Manhã", do Rio, e que era descrito por Carlos Drummond de Andrade como "o imperador da crítica brasileira".

    Católico, Lins seguia a corrente crítica do essencialismo, à qual Candido se opunha, divergência que enfatizou ao comemorar um ano de rodapé, em 9 de janeiro de 1944:

    "Conforme prometi no meu primeiro artigo, tenho procurado manter a atividade crítica ligada à vida do meu tempo. Contrariamente ao meu amigo Álvaro Lins, não me esforço por escrever a minha crítica numa ordem perene, comparando-a à criação. Combatendo o essencialismo do meu amigo, o que chama de essência de uma obra não passa da hipóstase [equívoco de atribuir existência concreta a uma ficção] das suas condições."

    A coluna intitulada "Um ano" foi republicada em "Textos de Intervenção" (ed. 34, 2002). Outras saíram esparsamente em diversos volumes, desde o primeiro livro de Candido, a coletânea de rodapés "Brigada Ligeira" (Martins, 1945).

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