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    Três fotojornalistas contornam declínio do modelo da Magnum

    LEÃO SERVA
    DE COLUNISTA DA FOLHA, EM LONDRES

    22/06/2017 02h45

    Uma sombra ronda a Magnum: desde que foi criada por Robert Capa e amigos, há 70 anos, a agência dependeu sempre de empresas de mídia. Mas a revolução tecnológica dos meios de comunicação nas últimas décadas exauriu as companhias que garantiam seu sustento. E a onipresença de câmeras e fotógrafos tirou valor das imagens que ela produz. Sua cadeia de valor está em xeque.

    A Magnum e seus sócios passam por uma intensa discussão sobre seus rumos. Durante as comemorações dos 70 anos, a agência tem realizado debates mensais no centro cultural Barbican, em Londres, em que discute relacionados ao futuro da fotografia.

    Em uma palestra, em 25 de abril, dois fotógrafos (Thomas Dworzak e Jérome Sessini) descreveram o trabalho ante a crise da cadeia tradicional fotógrafo-agência-mídia. Em junho, o tema foi o papel do arquivo fotográfico nos novos tempos (tudo que seus fotógrafos produziram desde 1947 está no arquivo da empresa, uma das fontes de receita).

    Outra sócia da agência, Susan Meiselas, participou de eventos relacionados ao lançamento de dois livros, quando também falou sobre os novos caminhos de sua profissão. No dia 17/7, o escritor Geoff Dyer falará dos fotógrafos como contadores de história.

    O alemão Thomas Dworzak, sócio da Magnum desde 2004, cobriu conflitos no Cáucaso (Geórgia e Chechênia) e no Afeganistão, entre outras coberturas famosas. Nos últimos anos, navega por redes sociais atrás de uma forma diferente de registrar fatos.

    Diante de uma notícia de grande destaque, busca perfis e hashtags do Instagram que de alguma forma reflitam a notícia, seja a eleição do Papa Francisco, a abertura dos jogos olímpicos de Sochi, na Rússia, ou o atentado terrorista na Maratona de Boston.

    Seus ensaios mostram como as pessoas se relacionam com as notícias, o que viraliza, como brincam ou levam a sério. O resultado do trabalho são livros, dos quais faz poucas cópias, como objetos únicos. Em tempo de proliferação de imagens, um dos mais badalados fotógrafos dedica grande tempo a ser curador de fotos do Instagram.

    O francês Jérome Sessini está na Magnum desde 2012. Cobriu conflitos na Ucrânia, na Síria e eleições na França. Mas desde que foi para a Ucrânia em 2014 (ficou quatro dias, fotografou conflitos de rua e foi embora), decidiu voltar e passar longas temporadas no interior do país, cobrindo a vida cotidiana de uma comunidade que não está em guerra.

    Seu trabalho é quase antropológico, os dramas retratados não são tiros ou bombas, mas a vida comum de pessoas. Em oposição a preceitos jornalísticos, o que ele cobre é a não-notícia. Quando o conflito na Ucrânia esfriou e todos os outros fotógrafos foram embora, ele começou seu ensaio. Qual o destino do trabalho? Livro ou exposições.

    Um das maiores nomes do fotojornalismo, Susan Meiselas é sócia da Magnum desde 1976. Ela se consagrou com imagens da Revolução Sandinista na Nicarágua (1979). Se você lembra de uma foto da época, é bem possível que seja dela. Os dois livros que lançou em Londres são representativos dos novos tempos.

    Uma nova edição do clássico "Nicarágua", com fotos da Revolução Sandinista, acrescenta nova dimensão às páginas: hiperlinks dão acesso a informações multimídia, com realidade aumentada, multiplicando conteúdos e ampliando a experiência do livro.

    Outra obra, "A Room of Their Own" (um quarto para chamar de seu), é ensaio semelhante à proposta de Sessini.

    O trabalho é fruto de longa convivência da fotógrafa com mulheres que foram vítimas de violência doméstica e buscaram um abrigo público na cidade de Sandwell (217 km de Londres), região com alto índice de ocorrências do tipo.

    Ela passou vários meses no abrigo de 2014 a 2016 e produziu um volume em que não mostra rostos das mulheres e expõe quase nenhuma ação. É uma obra fortíssima, de cunho pós-jornalístico.

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