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    CRÍTICA

    Autora de 'Ladainha', Bruna Beber comprova maturidade rítmica

    JÚLIA DE CARVALHO HANSEN
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    01/07/2017 02h00

    Elisa Mendes/Divulgação
    Escritora Bruna Beber, autora do livro de poemas 'Ladainha
    A escritora Bruna Beber, autora do livro de poemas 'Ladainha'

    LADAINHA (ótimo)
    AUTORA Bruna Beber
    EDITORA Record
    QUANTO R$ 32,90 (96 págs.)

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    Certamente os poemas de "Ladainha" mantêm dos livros anteriores de Bruna Beber o humor de uma poesia risonha na observação das coisas e as levadas rítmicas de seu ouvido agudo. É aquele lugar que os críticos adoram apontar numa determinada obra: um ponto de viragem, seus poemas estão tão maduros quanto um fruto doce.

    Como uma criança que atravessa o mundo sem pisar nas linhas do chão, a poesia de Beber se escreve num intervalo entre o jogo do imaginário e a observação do real:

    "Ver a gema de um ovo estourar / pela primeira vez e se admirar / com o mar dourado partindo / pra cima do arroz e da farofa" (poema 89).

    Consciente de que imaginário e real não são as únicas fronteiras que dividem o visível do invisível, "Ladainha" canta o crescer de outro território, o do mistério que sempre há de pintar por aí.

    Neste novo livro de Bruna Beber o gozo e o riso tornaram-se questões do espírito: não há um sujeito rindo de alguma coisa, mas o universo está o tempo todo rindo de si mesmo, e nós nos esbaldamos com ele também.

    Se o riso é uma forma de manter aceso o espírito, o ritmo é o meio de acesso ao encantamento e faz observar as coisas com tal generosidade que a respiração acompanha.

    Ladainha
    Bruna Beber
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    Consoantes são tambores, as vogais formam silvos e assim o som continua sendo o código que fecha e abre os sentidos. Os ritmos em "Ladainha" revelam e escondem coisas como um canto ritual faz.

    Porém, seus poemas dizem que não é nada demais a magia, ela não é um grande gesto de atravessamento pra outro lugar, pois o mágico está no trivial e o axé em cada coisa que existe. Uma ladainha pode ser um blá-blá-blá, como pode ser o canto de elevação, uma purificação que mostra a comunhão das coisas.

    No limite, "Ladainha" nos diz que o coloquial e o enigma são uma mesma coisa e os herméticos números primos que dão título a cada um dos poemas parecem enfatizar isso. Peixes que dão lições de vida enquanto os observamos. Maçãs cujos esqueletos são tratados com o mesmo respeito com que se trata o veneno. O extraordinário é tão simples –nos diz Bruna Beber.

    JÚLIA DE CARVALHO HANSEN é poeta, autora de "Seiva Veneno ou Fruto" (Chão da Feira, 2016)

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