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    CRÍTICA

    Safra de livros preenche lacunas do nazismo, tema ainda na moda

    RICARDO BONALUME NETO
    DE SÃO PAULO

    19/07/2017 02h05

    Em 2015, o final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) completou 70 anos. Datas redondas aparentemente são boas para editar livros. A safra internacional de 2015 começou a aparecer agora em traduções brasileiras.

    Mas não é só isso. Mesmo sem efemérides, o nazismo continua na moda, tanto para o bem quanto para o mal.

    Existem jovens neonazistas em Paris, no sul dos EUA, mesmo em Juiz de Fora ou Tel Aviv. Mas é crescente o conhecimento acerca desse fenômeno espúrio na história da humanidade. Como foi possível que a Alemanha, um dos países mais refinados e cultos do velho continente, tenha descambado para tal barbárie?

    Vale a pena ler primeiro um livro editado pouco antes da nova safra, "Nazismo e Guerra" (Objetiva), de Richard Bessel. O historiador britânico foi além das aparências, da época e do pós-guerra. Seu livro abala diversos mitos.

    "A guerra nazista não era apenas o palco do genocídio, o contexto em que se poderiam executar campanhas de homicídio em massa. Em si, a guerra era a expressão do nazismo aplicado do regime. A guerra nazista era luta racial; a luta racial nazista era a guerra."

    Ou seja, sem nazismo não haveria guerra, e a derrota foi o resultado óbvio. Pois a condução da guerra pelos alemães foi irracional, privilegiava a ideologia e deixava de lado considerações práticas.

    Os ucranianos estavam fartos do regime comunista dominado pela Rússia. Teriam sido valioso aliado para os alemães. Mas a ideologia que pregava o desprezo dos eslavos foi mais forte, e a população da Ucrânia, depois de inicialmente receber os alemães com flores, logo passou a tratá-los com balas e explosivos.

    Até o final do conflito os nazistas perseguiram o que chamavam de raças inferiores, apesar de afetar o próprio esforço de guerra. Em vez de usar trens para transportar tropas, continuavam até o fim sendo usados para levar judeus a campos de extermínio.

    Foram quase 6 milhões de judeus mortos, 27 milhões de mortos russos e de outras nacionalidades da antiga União Soviética.

    Entre a miríade de interpretações, está também a tese de Lewis H. Lapham, editor emérito da revista americana "Harper's Magazine", de que o pecado original germânico foi o azar de o país não ter sido civilizado por Roma. Os romanos nunca tomaram toda a Germânia, só uma parte pequena, produtiva e útil como defesa do resto do império.

    Roma não tinha interesse em domesticar bárbaros peludos em florestas sombrias. Abriu-se remotamente o caminho que levaria ao poder o demagogo Adolf Hitler e seu partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães.

    LACUNA

    O tema do genocídio foi bem trilhado pela historiografia. E é uma surpresa constatar que faltava um livro importante, "Ravensbrück - A História do Campo de Concentração Nazista pra Mulheres" (Record), de Sarah Helm.

    Ela narra a história de um campo de concentração relativamente pequeno campo; por ali passaram cerca de 130 mil mulheres em seis anos de atividade. Morreram entre 30 mil e 90 mil –não há consenso sobre as estimativas da maior guerra da história.

    Ravensbrück explicita a ideia nazista de que a sociedade deveria extirpar pessoas "indesejáveis" –lésbicas, drogadas, comunistas etc.

    E praticamente tudo que Adolf Hitler fez estava descrito em seu livro ("Minha Luta"). Quem teve paciência de ler um livro chatíssimo antes da guerra não se espantou com o que nazistas fizeram.

    (No Brasil, editoras foram proibidas de publicar a obra porque ela fomenta a intolerância –diz a Justiça do Rio; na Alemanha, uma edição comentada entrou na lista de mais vendidas; na internet, a obra é encontrada com facilidade.)

    DROGAS

    A literatura da guerra inclui pontos polêmicos, como em "High Hitler - Como o Uso de Drogas pelo Führer e pelos Nazistas Ditou o Ritmo do Terceiro Reich" (Planeta), de Norman Ohler.

    Nazismo E Guerra
    Richard Bessel
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    O autor diz que drogas derivadas do ópio foram fundamentais para o sucesso das primeiras campanhas da guerra, notadamente as invasões da Polônia em 1939 e da França em 1940. "As drogas faziam os soldados terem menos medo, e precisarem menos de sono", afirmou ele à Folha.

    Substâncias teriam sido particularmente importantes para tripulantes de tanques, mas a relevância parece exagerada. Em combates entre tanques, parâmetros técnicos como espessura da blindagem, poder de fogo e velocidade eram bem mais importantes.

    Ainda mais crucial foi o fato de que as torres de tanques alemães tinham três tripulantes –comandante, atirador e municiador– em vez de ter só os dois primeiros como era comum nos modelos aliados do início do conflito.

    *

    NAZISMO E GUERRA (ótimo)
    AUTOR Richard Bessel
    EDITORA Objetiva
    QUANTO R$ 47,90 (256 págs.)

    RAVENSBRÜCK (ótimo)
    AUTORA Sarah Helm
    EDITORA Record
    QUANTO R$ 83,50 (924 págs.)

    HIGH HITLER (bom)
    AUTOR Norman Ohler
    EDITORA Planeta
    QUANTO R$ 33,90 (384 págs.)

    SOLDADOS - SOBRE LUTAR, MATAR E MORRER (ótimo)
    AUTOR Harald Welzer e Sönke Neitzel
    EDITORA Companhia das Letras
    QUANTO R$ 44,90 (528 págs.)

    O AMIGO ALEMÃO (muito bom)
    AUTOR Adam Makos e Larry Alexander
    EDITORA Geração Editoral
    QUANTO R$ 43,40 (408 págs.)

    A FORTALEZA DE INVERNO (muito bom)
    AUTOR Neil Bascomb
    EDITORA Objetiva
    QUANTO R$ 38,20 (464 págs.)

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