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    Cineclube da Morte quer discutir tabu da mortalidade através de filmes

    IVAN FINOTTI
    DE SÃO PAULO

    08/08/2017 02h00

    Divulgação
    Cena do filme "A Partida" (Japão, 2008), dirigido por Yôjirô Takita. (Foto: Divulgação)
    Cena de "A Partida" (2008), dirigido por Yôjirô Takita, primeiro filme a ser exibido pelo Cineclube da Morte

    Se boa parte dos frequentadores de cinema buscam histórias com um final feliz, é exatamente isso a que se propõe o Cineclube da Morte, sessão mensal promovida a partir desta terça (8) no Belas Artes, em São Paulo. Neste caso, entretanto, o final feliz não é para os alegres personagens do filme, e sim para o público.

    E esse final nada mais é do que a morte. "A morte de uma maneira honrada, delicada e real. A sessão é um convite também para você olhar para a sua vida com um jeito mais comprometido", diz a médica Ana Claudia Arantes, do hospital Albert Einstein, especialista da área de cuidados paliativos -que trata de pessoas com doenças graves e incuráveis.

    Os idealizadores do projeto são ela e o "coaching" Tom Almeida, especializado em desenvolvimento humano. Eles estarão nas sessões para conversar, por cerca de uma hora, com o público após o filme.

    O primeiro a ser exibido é o japonês "A Partida", de Yojiro Takita. É uma comovente e também divertida história de um rapaz assumindo um novo emprego, o de preparar corpos em uma funerária. Os ritos da cultura japonesa são mostrados em detalhes nesta produção de 2008, que ganhou o Oscar de melhor estrangeiro no ano seguinte.

    Outros quatro filmes estão programados até dezembro, todos excelentes, com atores como Ricardo Darín, Nanni Moretti e Javier Bardem. Mas há muitos outros na fila, caso a "sessão maldita" caia no gosto do público (leia quadro nesta página com a programação).

    "A arte consegue tratar de uma forma direta a nossa realidade mortal, sem o tabu, sem os redemoinhos hospitalares", diz ela, autora de "A Morte É um Dia que Vale a Pena Viver", lançado em 2016 (Casa da Palavra, R$ 29,90, 192 págs.).

    Foi a partir desta obra que Tom Almeida se aproximou da médica. "Vivi uma experiência com meu primo, que teve câncer no fígado", conta ele. "Lemos o livro dela e isso transformou a vida dele. E a minha também."

    DOENÇA TERMINAL

    Os cuidados paliativos não tratam exatamente de doenças graves e incuráveis, mas sim de pessoas com doenças incuráveis. É uma preparação para a morte. "O trabalho consiste na retirada da dor física e depois das dores emocional, espiritual e social", diz Almeida. "E há fases onde o tratamento dá mais dano do que resultados", diz Ana Claudia.

    "Meu primo [que morreu em janeiro] ficou um ano e meio na fila de espera por um transplante", conta Almeida. "O problema é que, quando não há mais o que ser feito em termos de medicina, há tudo a ser feito para a pessoa."

    "O impacto das conversas fez com que ele fosse muito mais em paz e com que a família também aceitasse o processo melhor. As preocupações que ele tinha, as mágoas que gostaria de resolver, tudo isso foi sendo ajustado."

    "Tão importante quanto descobrir um câncer no início para começar o tratamento, é descobrir essa área da medicina chamada cuidados paliativos."

    CINECLUBE DA MORTE
    ONDE Caixa Belas Artes, sala 3 (r. da Consolação, 2.423)
    QUANTO R$ 20 (inteira)

    *

    Confira os próximos filmes que serão exibidos pelo cineclube, comentados pelos organizadores:

    "A PARTIDA", de Yojiro Takita
    Oscar de filme estrangeiro em 2009. "Traz o aspecto cultural da morte entre os japoneses, que acreditam ser importante honrar a história da pessoa e que o corpo seja fiel ao que ele foi em vida."
    QUANDO: 08/08, às 19h30

    "INVASÕES BÁRBARAS", de Denys Arcand
    Oscar de filme estrangeiro em 2004. Em seus últimos dias, homem reúne amigos, ex-amantes e o filho. "É uma bênção proporcionar um bom final de vida para o outro."
    QUANDO: 12/09, às 19h30

    "MAR ADENTRO", de Alejandro Amenábar
    Oscar de filme estrangeiro em 2005. História real de um tetraplégico que lutou pelo direito de suicídio assistido. "No pacote da negação da morte em boa parte da cultura ocidental pode também estar contido o desrespeito a escolhas do paciente, em prol da manutenção de uma vida que talvez não se deseje mais."
    QUANDO: 03/10, às 19h30

    "O QUARTO DO FILHO", de Nanni Moretti
    Palma de Ouro em Cannes 2001. Família enfrenta a morte do filho em um acidente. "Embora todos saibamos que vamos morrer, a morte de um ente querido pode ser muito dolorosa quando a 'lógica etária' é invertida, ou seja, o filho morre antes dos pais."
    QUANDO: 07/11, às 19h30

    12/12 - 'Truman', de Cesc Gay
    Ricardo Darín vive um ator cujo câncer se espalhou. "O filme nos leva a pensar nos tratamentos de oncologia atuais."
    QUANDO: 03/10, às 19h30

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